Faltam menos de 15 dias para o Governo entregar na Assembleia da República o Orçamento do Estado para 2020 e ainda não há qualquer medida acordada com um dos parceiros, o Bloco de Esquerda, numa das áreas prioritárias para o Orçamento do Estado, a Saúde. É uma “fase excessivamente preliminar”, disse Catarina Martins na conferência de imprensa onde identificou 15 medidas de “emergência para salvar o Serviço Nacional de Saúde” e colocou dois ministros do mesmo Governo em pratos diferentes da “compreensão” com o que é necessário para o SNS.
E o que é necessário, segundo o Bloco, são 800 milhões de euros desbloqueados já neste Orçamento do Estado, e os ministros em planos diferentes são a da Saúde e o das Finanças. Em Marta Temido, Catarina Martins vê “enorme compreensão para a necessidade de implementação destas medidas”, já em Mário Centeno há “compreensão errada sobre os problemas de gestão do SNS. Na parte do Ministério das Finanças tem existido pouca compreensão que o SNS precisa de respostas concretas”.
A começar pelo que é orçamentado a menos e que em 2018 ascendeu aos 800 milhões de euros, os mesmos que o BE quer agora ver entrar à cabeça no próximo Orçamento (acabando já com a suborçamentação nesta área) para aplicar medidas onde inclui a abertura de concurso para a formação de médicos especialistas e a abertura de vagas preferenciais para formação em zonas carenciadas. Ou ainda contratar médicos com formação geral para “uma primeira resposta” nas “zonas mais carenciadas”, acabar com as taxas moderadoras nos cuidados de saúde primários em 2020, reforçar meios complementares de diagnósticos nos hospitais e nos cuidados de saúde primários, renovar equipamentos, e alargar horário de funcionamento dos centros de saúde.
Esta última medida está também no Programa do Governo que prevê “alargar o número de consultas externas, tendo em vista a melhoria do acesso e da satisfação dos utentes, por exemplo alargando a atividades programadas aos sábados”, como resposta à necessidade de diminuir os tempos de espera no SNS. O BE quer alargar o funcionamento do horário nos centros de saúde em “zonas de maior pressão e em função de necessidades devidamente explicitadas, contratualizando o aumento do seu horário de funcionamento em dias úteis e aos sábados”.
Além destas medidas, o Executivo socialista também colocou no seu programa o objetivo de “eliminar, faseadamente, o pagamento de taxas moderadoras nos cuidados de saúde primários e em todas as prestações de cuidados, cuja origem seja uma referenciação do SNS”. Neste ponto, a ambição do Bloco é que elas possam desaparecer já no próximo Orçamento. A lista do BE é longa e há um valor em mente:
- Acabar com a suborçamentação em 2020;
- Aumentar o peso do SNS no PIB. Objetivo para a legislatura: atingir transferência de 6% do PIB (mais de 12 mil milhões de euros) do OE para o SNS;
- Planificar investimento plurianual;
- Levantamento das necessidade de profissionais até 31 de dezembro deste ano;
- Revogar despacho que limita aos valores de 2019 as contratações para 2020;
- Abrir concursos extraordinários para formar especialistas;
- Criar incentivos para a dedicação exclusiva dos profissionais do SNS;
- Alargar horários de centros de saúde;
- Contratar médicos de formação geral para primeira resposta em zonas carenciadas;
- Alargar resposta para saúde mental;
- Acabar com taxas moderadoras no cuidados de saúde primários;
- Plano Plurianual de Investimentos;
- Retirar SNS das limitações da lei dos compromissos;
- Reforçar meios complementares de diagnóstico;
- Renovar equipamentos.
E quanto custa?
Quanto a verba para responder às medidas “prioritárias” elencadas pelo BE, as contas de Catarina Martins fazem-se com recurso a “algo tão simples como colocar logo no Orçamento do Estado” os 800 milhões de euros que faltaram ao SNS no ano passado e que o Estado teve de investir além do que estava orçamentado. O que acontece, segundo o deputado do BE Moisés Ferreira, é que o “SNS acaba por gastar mais e tem um pior serviço”, já que “os 200 milhões de euros gastos em horas extraordinárias dava para reforçar em 8 mil trabalhadores” o SNS. “Em vez dos 100 milhões de euros gastos com a contratação de tarefeiros, utilizar essa verba para promover o regime de exclusividade com incentivos disponibilizados”.
Catarina Martins acredita que a transferência deste valor seria “um passo muito significativo para se conseguir avançar com boa parte destas medidas“. E define como ambição do partido para a legislatura “ter um equivalente a 6% do PIB” de investimento da saúde” que é “o que a OCDE considera um investimento normal”, argumenta.
A “proposta é feita com seriedade”, garante a líder do Bloco de Esquerda que não adianta sobre se alguma das medidas é mais prioritária do que outra na busca de um acordo para o seu partido viabilizar o Orçamento do Estado do Governo socialista. É o primeiro sem um acordo escrito (tal como aquele que existia na era da “geringonça”) e basta que o BE se abstenha para que a proposta do Governo passe.
Mas o partido que negociou os últimos quatro orçamentos com o PS também avisa que “não fica tudo esgotado” com este plano, no que toca a medidas necessárias para o SNS. A líder do Bloco considera que “há capacidade para alocar estas medidas agora” e avisa que “é preciso parar de apagar fogos no SNS” para pôr fim ao “problema quotidiano de gestão”.