Para decidir se o caso do furto e recuperação das armas do paiol nacional de Tancos segue ou não para julgamento, o juiz de instrução Carlos Alexandre quer ouvir presencialmente todos os 23 arguidos acusados no processo no Tribunal Central de Instrução Criminal — mesmo aqueles que não pediram esta fase facultativa do processo ou aqueles que arrolaram testemunhas mas que não se disponibilizaram a falar.
Mas esta quarta-feira, naquele que foi o primeiro dia que marcou para ouvir três dos oito arguidos que não pediram sequer a abertura de instrução, a sessão foi muito rápida. Valter Abreu e Jaime Oliveira preferiram remeter-se ao silêncio e nada dizer. Para a tarde estava prevista a audição de José Gonçalves, mas a seu pedido a inquirição foi adiada para dia 13 de janeiro. Esta semana, na sessão da manhã de quinta-feira estão marcados os arguidos Roberto Pinto da Costa, Mário Carvalho, José Carlos Costa, Nuno Reboleira e Luís Sequeira para a tarde.
Alexandre determinou ainda em dezembro, quando começou oficialmente a fase de instrução do processo em que suspeitos do furto de armas, elementos da Polícia Judiciária Militar, entre eles o ex-diretor, e militares da GNR enfrentam acusações de crimes como associação criminosa, tráfico e mediação de armas, terrorismo, falsificação de documento, denegação de justiça e prevaricação que queria ouvir todos presencialmente.
No despacho assinado pelo juiz do Tribunal Central de Instrução Criminal, o magistrado deixa claro que, por agora, não admite qualquer diligência “por carta precatória, carta rogatória ou videoconferência e, bem assim, depoimentos por escrito”, preferindo que os arguidos e testemunhas assim arroladas compareçam no Tribunal na Rua Gomes Freire, Lisboa. Mesmo para o primeiro-ministro António Costa, arrolado pelo ex-ministro da Defesa Azeredo Lopes — também arguido no processo, o juiz de instrução insiste que deponha presencialmente.
Carlos Alexandre insiste que depoimento presencial de Costa é indispensável
Neste caso coube ao Conselho de Estado decidir, como manda a lei, de que forma o governante prestaria declarações, optando pela forma escrita. Mas num despacho assinado a um dia de começar a ouvir arguidos e testemunhas do processo, Carlos Alexandre voltou à carga lembrando que a resposta do Conselho de Estado parece não ir de encontro à vontade que expressou anteriormente de ouvir todos presencialmente. É que, do seu ponto de vista, será mais fácil numa conversa presencial formular “questões, subhipóteses, explicações, intróitos” e até dá a oportunidade de “outros cidadãos acusados em co-autoria” também o fazerem.
O magistrado fundamenta a sua opinião em várias leis e chega mesmo a citar o “nosso mestre”, referindo-se ao professor Marcelo Rebelo de Sousa, agora Presidente da República. “Sabemos que o Excelentíssimo Senhor Primeiro Ministro não é uma testemunha qualquer”, refere a certa altura o magistrado, mas lembra que seu testemunho até foi pedido por um arguido, que era o seu ministro da Defesa, e que o próprio Conselho de Estado o considerou importante, e por isso acedeu. Carlos Alexandre diz mesmo não querer “ser atrevido”, mas lembra que também há generais que vão deslocar-se ao tribunal para testemunhar. Por isso pede a António Costa que se pronuncie sobre esta sua posição de querer ouvi-lo presencialmente.
Tancos. António Costa pediu para depor por escrito. Conselho de Estado aceitou
Carlos Alexandre lembra que nos processos em que os arguidos não querem contestar a acusação deduzida pelo Ministério Público, a lei determina que o magistrado deve “facultar aos arguidos não requerentes a faculdade de prestarem declarações nesta fase processual, convocando-os assim para interrogatório”.
Só no dia 13 de janeiro (segunda-feira) começa, então, a ser ouvido um dos arguidos que requereu a abertura de instrução. O primeiro será Bruno Ataíde, militar da GNR de Loulé, às 9h30. No dia seguinte, terça-feira (14) será a vez de Luís Vieira, ex-diretor da Polícia Judiciária Militar (PJM), e de Taciano Correia, coronel da GNR, explicarem como decorreu a investigação ao furto de armas de Tancos. Estes dois arguidos foram acusados de terem sido cúmplices com as alegadas negociações que terão ocorrido com João Paulino, o alegado líder dos assaltantes ao paiol de Tancos, para a entrega do armamento furtado. Tudo nas costas da Polícia Judiciária civil que liderava a investigação ao caso.
Quarta-feira, dia 15 de janeiro, será a vez de Carlos Alexandre fazer perguntas às testemunhas arroladas pelo arguido Fernando Santos, do grupo de João Paulino. Com a audição do arguido marcada para o dia seguinte, dia 16. Quatro dias depois, a 20 de janeiro, serão ouvidas as testemunhas e o arguido Hugo Santos. E a 22 de janeiro, pelas 09h30, arranca o testemunho de João Paulino, que não pediu para ser ouvido.
Esta fase instrutória prossegue uma semana depois, a 27 de janeiro, com as testemunhas arroladas pelo ex-ministro da Defesa Nacional, Azeredo Lopes — acusado de ter sabido da investigação ilegal da PJM à revelia do Ministério Público e de nada ter feito. Esperam-se os testemunhos do almirante Silva Ribeiro, chefe de Estado Maior General das Forças Armadas, e do seu antecessor Pina Monteiro, assim como do embaixador de Portugal da NATO, Almeida Sampaio. Um dia depois, a 28 de janeiro, as restantes testemunhas do ex-ministro: Maria João Mendes e Nuno Pinheiro Torres de manhã. À tarde, João Pedro Martins, Pedro Braga de Carvalho e tenente-general Martins Pereira, à data chefe de gabinete de Azeredo Lopes. O consultor técnico Ismael Augusto, por seu turno, tem visita marcada para o dia 29.
Já em fevereiro, no dia 3, será a vez de Azeredo Lopes apresentar a sua defesa ao juiz Carlos Alexandre, para no dia seguinte se passar para as cinco testemunhas invocadas pelo arguido António Laranginha (membro do grupo de João Paulino). Também ele será ouvido nessa tarde. Para 5 de fevereiro está marcado o arguido Caetano Lima Santos, que no seu requerimento de abertura de instrução não pediu produção de prova nem para ser ouvido.
Nessa semana, a 6 de fevereiro, será a vez das quatro testemunhas arroladas pelo arguido João Pais da parte da manhã. Ele está marcado para a parte da tarde. A 10 de fevereiro será a vez Vasco Brazão, à data porta-voz da Polícia Judiciária Militar que já admitiu ter feito uma investigação paralela ao furto de Tancos.
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O juiz Carlos Alexandre marcou também as três testemunhas arroladas pelo arguido Pedro Marques para 11 de fevereiro, com ele a ser ouvido também essa tarde. No dia seguinte será a vez do arguido Filipe Sousa falar, que pediu que Paulo Lemos e os seus co-arguidos Valter Abreu e João Paulino fossem também ouvidos como testemunhas. O juiz decidiu que estes falariam, se assim o entendessem, nos dias já previstos para falarem. Valter Abreu será já esta quarta-feira.
A 13 de fevereiro será ouvido Gabriel Matos. Cinco dias depois a instrução retoma com os testemunhos do coronel Estalagem, da Polícia Judiciária Militar, e do tenente-coronel Machado, da GNR.
Entretanto, neste despacho mais recente assinado por Carlos Alexandre, são também arrolados como testemunhas do arguido, que é coronel de infantaria. Amândio Marques o Diretor Nacional da Polícia Judiciária, Luís Neves, e os procuradores Vítor Magalhães e João Melo (que agora é Diretor Nacional Adjunto da PJ), que serão notificados para comparecer a 19 de fevereiro.