A NOS anunciou a renúncia de três administradores não executivos que foram indicados pela acionista Isabel dos Santos. Um deles era o presidente, o advogado Jorge Brito Pereira. Mário Leite da Silva e Paula Oliveira eram administradores não executivos. Os pedidos de renúncia foram apresentados ao conselho fiscal da operadora que é controlada através de uma empresa conjunta detida pela angolana e pela Sonae.

A operadora já tinha dado a saber que o comité de ética ia chamar estes três gestores na sequência das suspeitas que recaem sobre os negócios de Isabel dos Santos. Esta terça-feira a angolana foi constituída arguida pela justiça de Angola, tal como Mário Leite da Silva e Paula Oliveira, por causa de um alegado desvio de fundos da petrolífera estatal.

Esta é a segunda empresa em Portugal com investimentos de Isabel dos Santos em que o chamado Luanda Leaks teve impacto. Logo na segunda-feira, o EuroBic anunciou o corte de relações comerciais com Isabel dos Santos que um dia depois revelou ter colocado à venda a sua participação de 42,5% no capital do banco. Os administradores indicados pela empresária angolana, filha do ex-presidente José Eduardo dos Santos, também renunciaram aos cargos e os direitos de voto atribuídos a Isabel dos Santos não vão ser exercidos.

Esta quarta-feira foi a vez da NOS anunciar ao mercado a saída da administração de três gestores indicados por Isabel dos Santos. Os responsáveis da NOS que agora renunciaram deixam, assim, de poder votar nas reuniões da administração da operadora e o presidente não executivo tem voto de qualidade.

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No entanto, Isabel dos Santos não perdeu o direito de voto em reuniões da empresa que é a maior acionista da operadora portuguesa. O controlo da NOS é exercido por uma sociedade, a ZOPT, que é detida em partes iguais pelos dois acionistas. Neste sociedade, que detém 52% da operadora, o acordo parassocial estabelece que cada um dos acionistas tem o direto de indicar metade dos membros do conselho de administração. E atualmente este órgão é composto por Isabel dos Santos, Mário Leite Silva, Ângelo Paupério e Cláudia Azevedo, estes dois pela Sonae.  Isto significa que a parceria com a Sonae não está, para já, desfeita. Se tivesse sido desfeita, a NOS teria de avisar os mercados disso mesmo.

Em caso de impasse não resolvido até 15 dias, Sonae pode pedir fim da parceria

O acordo parassocial da ZOPT determina ainda que no caso se verificar uma situação de impasse, as duas partes têm de procurar uma solução concertada, tendo até cinco dias para nomear um representante para esse efeito. Depois de indicados os representantes, e se não conseguirem resolver o impasse em 15 dias, “qualquer uma das partes terá o direito de requerer a dissolução da ZOPT”. Ou seja, com o fim da parceria, os dois acionistas da NOS iriam assumir diretamente as participações na operadora, o que daria 26% a cada um, e que poderia implicar o fim do controlo acionista da NOS.

Também esta quarta-feira, a presidente Comissão de Mercado de Valores Mobiliários (CMVM) revelou que a entidade que supervisiona as empresas cotadas já estava a pedir informação à NOS e à Galp Energia. Gabriela Figueiredo Dias adiantou que estavam a ser adotadas medidas concretas em resposta às dúvidas e suspeitas levantadas no domingo e reforçadas já esta terça-feira com a constituição de arguidos pela justiça angolana. Neste caso as funções da CMVM vão no sentido de assegurar que as empresas em causa informem o mercado sobre factos relevantes relacionados com o tema.

Luanda Leaks. “CMVM iniciou já ações de supervisão concretas”, diz presidente

A Galp Energia até agora ainda fez qualquer comunicado sobre a acionista angolana. Isabel dos Santos não participa diretamente no capital da Galp, empresa para a qual não indicou administradores, e nem sequer no capital da Amorim Energia que detém 33,34% da petrolífera. A angolana é acionista da Esperaza, empresa constituída com a Sonangol, que detém 45% da Amorim Energia.

Isabel dos Santos é ainda a principal acionista da Efacec, empresa industrial portuguesa, que não é cotada na bolsa.

Mário Leite da Silva, o braço direito de Isabel dos Santos em Portugal

Mário Leite da Silva, um dos braços direitos de Isabel dos Santos

Ao todo, Isabel dos Santos terá desviado da Sonangol 115 milhões de euros que tinham na sua base um contrato de prestação de serviços — há dúvidas sobre se foram efetivamente prestados — com a Matter Business Solutions, e que é constituída por várias pessoas próximas de Isabel dos Santos: não só Paula Oliveira, mas também Mário Leite da Silva, braço direito da empresária angolana em Portugal. Os dois aparecem como diretores da empresa.

Num perfil recentemente publicado pelo Observador, pode ler-se que Leite da Silva começou, em 2006, a colaborar com Isabel dos Santos, que o “roubou” ao empresário Américo Amorim. Foi membro do conselho de administração da Fidequity, a empresa com sede na Avenida da Liberdade que gere vária participações de Isabel dos Santos.

Competente, duro e autoritário. O braço direito que está com Isabel dos Santos “para o bem e para o mal”

Surge ainda como administrador de empresas-chapéu de Isabel dos Santos, como a Galp e a Efacec ou a Wise Intelligence, ligada à consultoria e gestão de projetos. Tal como Isabel dos Santos e o seu marido, Sindika Dokolo, foi alvo do arresto preventivo de participações em empresas e contas bancárias decidido em dezembro.

Natural do Porto, é casado (com uma ex-consultora da PwC, onde também trabalhou) e tem dois filhos. É professor na Porto Business School, e descrito por um aluno como um “professor of practice”, ou seja, mais virado para o mundo empresarial. É filiado no PSD desde, pelo menos, os 20 anos.

Mário Leite da Silva é ainda presidente do conselho de administração do Banco de Fomento Angola (BFA), mas, segundo a Lusa, deverá deixar em breve o cargo, dado que o mandato está a chegar ao fim. Não vai a Angola há mais de um ano.

Paula Oliveira e os acordos da offshore no Dubai

Paula Oliveira, amiga pessoal de Isabel dos Santos e empresária

Paula Oliveira, amiga próxima de Isabel dos Santos (que chegou a estar no casamento da portuguesa), esteve ligada à criação da Matter Business Solutions. Segundo o Expresso, apesar de nunca ter assumido no currículo fazer parte da empresa, a sua assinatura aparece a representar a companhia offshore em dois acordos de pagamentos da Sonangol.

Um deles, segundo o jornal, é um contrato celebrado entre a Sonangol UK e a empresa do Dubai, fechado cinco dias antes de Isabel dos Santos ter sido afastada da petrolífera pelo Presidente João Lourenço a 15 de novembro de 2017. O contrato terá legitimado a transferência de cerca de 57,8 milhões de dólares para a Matter Business. É ainda administradora não-executiva da NOS.

Numa entrevista no ano passado ao site Executiva, disse que “é na imperfeição que reside a criatividade”. Segundo a publicação, Paula Oliveira “dedicou os últimos 10 ao empreendedorismo estratégico e a apoiar o desenvolvimento de novos negócios em diversas indústrias em mercados emergentes e mercados maduros”. É sócia na SDO Consulting, especializada em recursos humanos.

É licenciada em Gestão de Recursos Humanos e Psicologia do Trabalho e tem uma pós-graduação em Gestão pela Universidade Católica Portuguesa. “O que me move são os desafios, ultrapassar obstáculos e ganhar. Tal e qual como empreender; criar um projeto é igualmente um caminho longo, complexo e profundo – desde identificar a necessidade no mercado até a realização da ideia existem imensas variáveis e imponderáveis a interpretar e gerir”.

Já faço consultoria há muitos anos e hoje posso ter o “luxo” de escolher os projetos que realmente me realizam enquanto pessoa e profissional.

Questionada sobre por que razão as mulheres ainda ocupam menos de 30% dos cargos de liderança, Paula Oliveira defendeu: “Porque são as mulheres que procriam. Porque as mulheres começaram a estudar muito mais tarde do que os homens, porque em Portugal os cargos de liderança não são ocupados por pessoas com menos de 45/50 anos! Porque quando as pessoas de 30/35 anos conseguirem ocupar cargos de liderança nas grandes empresas portuguesas, essa percentagem vai subir muito rapidamente. Nas gerações de 30 para baixo as quotas começam a ser muito diferentes. Estamos em desigualdade de número e não de género. Não gosto desta lei.” Paula Oliveira é casada e tem três filhos.