Álvaro Barreto morreu esta segunda-feira em Lisboa. O ex-ministro tinha 84 anos. Nascido em 1936, foi ministro de seis primeiros-ministros em sete governos: Sá Carneiro, Francisco Pinto Balsemão, Mário Soares, Carlos Mota Pinto, Cavaco Silva (duas vezes) e Pedro Santana Lopes.

Enquanto ministro, teve à sua responsabilidade seis pastas: da Indústria, da Agricultura, da Integração Europeia, do Comércio e Turismo e das Atividades Económicas e do Trabalho. Licenciado em Engenharia Civil, foi ainda ministro no Governo de Pedro Santana Lopes, o último cargo que teve num Governo onde assumiu a pasta dos Assuntos Económicos.

Pedro Santana Lopes recorda-o como “um bom amigo” e uma pessoa que “prestou muito serviço a Portugal” e que, por isso, “devia ter sido primeiro-ministro”. “Além de meu ministro, era uma pessoa que respeitava muito, prestou muito serviço a Portugal. Foi governante de vários governos. Além do mais, um bom amigo e uma pessoa que eu admirava muito”, disse Pedro Santana Lopes em declarações à Rádio Observador. “Devia ter sido primeiro-ministro (…) Era uma pessoa extremamente competente”, continuou.

Santana Lopes reage à morte de Álvaro Barreto: “Devia ter sido primeiro-ministro”

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Numa nota de pesar publicada na página da Presidência da República, Marcelo Rebelo de Sousa destaca “uma vida ao serviço de Portugal”, do “desenvolvimento da economia portuguesa, em áreas como a indústria, o comércio, a agricultura e as pescas”. Segundo Marcelo, a sua participação em sete governos diferentes fez com que “desbravasse e consolidasse a modernização do país e a integração europeia”.

“A sua excelência como gestor foi reconhecida ainda jovem pelo Estado português, com a comenda da Ordem do Mérito Civil e Industrial, ainda na década de sessenta”, lê-se, com Marcelo a acrescentar ainda que Barreto “conduziu em diversos momentos as negociações sectoriais, de extraordinária exigência técnica e política, com a União Europeia, e representou Portugal sempre com o mais elevado sentido de Estado”. Marcelo termina a nota a recordar o “amigo” e a expressar o “enorme reconhecimento de Portugal”.

Pinto Balsemão lembra “cáustico sentido de humor”

Também Pinto Balsemão, numa nota escrita enviada ao Observador, descreve o ex-ministro como “inteligente, rápido, polifacetado” e “com um grande, e por vezes cáustico, sentido de humor”. Também recorda Álvaro Barreto como um “excelente desportista”.

“Conhecemo-nos pelo menos desde o Liceu Pedro Nunes, ele no 2º ano, eu no primeiro. Privámos desde aí com frequência, na vida privada (éramos vizinhos na Quinta da Marinha) e na política (no Governo de Sá Carneiro e no meu primeiro Governo e como militante do PSD)”, continua, terminando com a ideia de que “vai fazer muita falta”. “Vai fazer muita falta. À sua Mulher, aos seus três filhos e aos netos. E a todos os seus muitos amigos”, lê-se.

Em nota de pesar disponibilizada na respetiva página, o PSD faz saber que “Álvaro Barreto teve uma vida dedicada à causa política”. “A direção do Partido Social Democrata, na figura do seu Presidente, Rui Rio, relembra o seu legado e endereça à sua família as mais sentidas condolências”, lê-se.

Silva Peneda destaca “rapidez de raciocínio”, “sentido de humor” e “solidariedade”. “Não lhe conheço nenhum inimigo”

Também Silva Peneda, ex-presidente do Conselho Económico Social, que partilhou o governo com Álvaro Barreto no período cavaquista, enaltece o seu “sentido de humor” e “solidariedade” que lhe era característica. “Passei momentos difíceis na altura, como ministro do Trabalho, e o Álvaro era dos que tinha uma palavra de solidariedade permanente, de conforto. Foi um grande companheiro e tenho muitas saudades da postura que ele exibia dentro e fora do Conselho de Ministros”, afirmou em declarações à Rádio Observador.

“Marcou: conseguia aliar uma capacidade técnica invulgar e uma rapidez de raciocínio a uma intuição política”, diz ainda, destacando a “inteligência” e a capacidade de “conceber estratégias” políticas. Silva Peneda destaca sobretudo o papel “fundamental” que o ex-ministro teve na moderação do processo de integração de Portugal na União Europeia: “Conduziu o processo de forma notável”.

O ex-presidente do CES nota ainda que “dificilmente podemos identificar um caso em que Álvaro Barreto tenha criado inimigos”. “Sinceramente não conheço nenhum: teve dossiês difíceis, complexos, mas é muito difícil encontrarmos um ponto onde tenha havido conflito, não lhe conheço nenhum caso de inimizade”, afirmou.

Mais conhecido pelo seu percurso político, Álvaro Barreto foi também um gestor, tendo trabalhado no setor público e privado. Começou a sua carreira no grupo Cuf, na Profabril, empresa de engenharia, durante dez anos, e chegou à Lisnave, no final dos anos da década de 1960. O seu último cargo empresarial foi na Tejo Energia, empresa que explora a central do Pego.

A sua carreira no mundo das empresas foi marcada pela Lisnave, empresa do grupo Cuf (e mais tarde José de Mello) onde foi diretor e administrador durante quase 10 anos, apanhando o período turbulento do pós-25 de Abril. Foi ainda presidente da TAP, enquanto gestor público, mas foi na Soporcel, empresa de papel onde o Estado era o maior acionista, que ficou mais tempo, tendo sido presidente durante dez anos.

A sua ligação profissional mais longa foi contudo com a Tejo Energia, da qual foi presidente entre 1990 e 2004, até ir para o Governo de Santana Lopes e à qual voltou depois de abandonar funções públicas. Como administrador não executivo passou ainda pelas administrações da Somincor, gestora das minas de Neves Corvo, da Nutrinveste (controlada pela família de Jorge de Mello), do Grupo Sonae e do BCP, entre outros.

O ministro que aprovou a lei dos CMEC da EDP

Foi a sua ligação política e empresarial ao setor da energia que mais protagonismo que lhe deu nos últimos anos de funções públicas. Álvaro Barreto foi o ministro que aprovou o polémico decreto-lei dos contratos de manutenção do equilíbrio contratual (CMEC) com a EDP, apontados por alguns como a fonte de rendas excessivas para a empresa. A legislação já estava a ser preparada pelo Governo anterior de Durão Barroso e pelo ex-ministro Carlos Tavares, mas foi Álvaro Barreto e a sua equipa que a assinaram.

Governos de Durão Barroso e Santana ignoraram avisos do regulador sobre rendas da EDP

O antigo ministro, que o Observador ouviu sobre o tema em 2017, chegou a ser chamado à comissão de inquérito às rendas excessivas do setor da eletricidade, mas cancelou por razões de saúde.

A passagem de Álvaro Barreto pela pasta da energia teve ainda outra polémica relacionada com a atribuição de licenças para a exploração de centrais a gás natural, uma das últimas decisões que tomou enquanto ministro de Santana Lopes que foi demitido pelo então Presidente, Jorge Sampaio. A Tejo Energia, empresa da qual tinha sido administrador, foi uma das contempladas coma maior potência neste processo de atribuição.

O ministro seguinte, Manuel Pinho, já no Governo de José Sócrates, viria a anular esta atribuição, mas acabou por validar a uma licença para a central de ciclo combinado de gás natural da Tejo Energia cuja exploração é assegurada pela Endesa.