O Parlamento português tem resistido a tomar medidas mais restritivas para prevenir o coronavírus. Na sexta-feira, já com o resto do país com medidas extraordinárias, um plenário juntou mais de 300 pessoas no hemiciclo, dos quais 230 deputados, vindo de várias zonas do país e todos a apenas alguns centímetros uns dos outros. Havia igualmente jornalistas demasiado próximos na bancada de imprensa e até assistência nas galerias, embora mais reduzida que o habitual. Ao mesmo tempo, alguns dos departamentos onde trabalham os funcionários da Assembleia da República, continuaram a realizar as ações de formação previamente calendarizadas, que juntaram dezenas de pessoas na mesma sala, mesmo depois das indicações da secretaria-geral da AR para que se cancelassem todos eventos como conferências e afins.

Passou o fim-de-semana, as medidas apertaram e, para esta segunda-feira, o presidente da Assembleia da República marcou uma conferência de imprensa para o início da tarde. A convocatória apontava para que seja uma conferência de imprensa nos moldes normais: presencial, o que é pouco recomendado, e, segundo o email, na sala de imprensa (que é relativamente pequena). Mas, ao contrário do que indicava o email enviado aos jornalistas, vai, afinal, existir algum cuidado para reduzir o risco.

O Observador apurou junto da assessoria do Presidente da Assembleia da República e do gabinete de comunicação do Parlamento, que a conferência será nos Passos Perdidos e não na sala habitualmente destinada a conferências de imprensa devido à maior amplitude do espaço. O gabinete de comunicação do Parlamento conseguiu também, entretanto, que a conferência de imprensa fosse trasmitida via ARTV, o que permite que vários jornalistas não tenham de se dirigir ao local.

Há agora a expectativa de que esta segunda-feira o Parlamento adote, finalmente, medidas para restringir a atividade dos deputados. Além da conferência de Ferro às 13h00, a conferência de líderes vai reunir de forma extraordinária pela segunda vez em quatro dias às 19h00. Motivo: Discutir “medidas excecionais” a tomar face ao coronavírus que vão afetar “agendamentos previstos”.

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Segundo o Observador apurou, algumas reuniões das comissões parlamentares previstas para esta terça-feira foram sendo canceladas pelos próprios presidentes das comissões, uma vez que os deputados se têm manifestado contra a realização das reuniões de forma presencial. A comissão de Educação e a comissão de Cultura, que tinham reuniões previstas para amanhã, 17 de março, já foram adiadas, confirmaram ao Observador deputados destas comissões.

Além disso, o plenário de quarta-feira, a realizar-se, deverá contar apenas com um quinto dos deputados presentes no plenário, conforme também tinha sido aconselhado aos grupos parlamentares no seguimento da última reunião da conferência de líderes.

Funcionários estavam descontentes, mais de metade vai ser enviada para casa

Na última semana, havia funcionários do Parlamento revoltados porque consideravam que deviam estar recatados em casa com as famílias e que em muitos casos podiam já estar em teletrabalho. Havia ainda casos, segundo queixas ouvidas pelo Observador, de funcionários que se queixavam de lhes ter sido vedado utilizarem material de proteção (como por exemplo, luvas), para não serem captados pelas câmaras e ajudarem criar alarme social.

Esta segunda-feira foi finalmente distribuído um despacho, citado pela Lusa, do secretário-geral do parlamento, Albino Azevedo Soares, que determina que “estão dispensados de se apresentar ao serviço” os funcionários inseridos nos grupos de risco identificados pela Direção-Geral da Saúde, bem como os que trabalham na Biblioteca, Arquivo Histórico Parlamentar e na Divisão Museológica e de Cidadania. Já “nas restantes unidades orgânicas da Assembleia da República, os respetivos dirigentes devem propor a dispensa de serviço dos funcionários parlamentares até, pelo menos, metade do número total nelas colocados que se encontre em exercício de funções”.

O secretário-geral da AR diz ainda que os dirigentes do parlamento — a quem o despacho não se aplica — “devem garantir a rotatividade e promover escalas para que as necessidades do serviço continuem a ser asseguradas”. O mesmo documento estabelece que “o trabalho à distância pode ser assegurado, com recurso a meios tecnológicos de informação e comunicação, pode ser assegurado pelos funcionários parlamentares que tenham sido indicados pelos respetivos dirigentes e cujas funções o permitam, sendo-lhes atribuído para tal um computador portátil” durante esta segunda-feira. Aos restantes, que já tenham portáteis na sua posse, será atribuída uma senha de acesso para ligação remota a partir de casa.

Teimosia ou bom-senso para evitar alarmismo?

O presidente do Parlamento tem tido uma interpretação da situação de aplicar medidas menos restritivas. Na terça-feira, dia 10, a segunda figura da nação explicava o seu ponto: “O presidente da AR fez alusão ao Plano de Contingência da Assembleia da República para o COVID-19, que foi por si aprovado, e solicitou a distribuição
de um documento preparado pelos Serviços com o ponto da situação das várias medidas adotadas neste âmbito. Defendeu que a AR tem que cumprir o que está no Plano de Contingência, não devendo estar na primeira linha ou na vanguarda da criação de maior alarme social“.

Nessa mesma reunião, apesar da pressão dos líderes das várias bancadas, Ferro Rodrigues recusava-se a tomar medidas mais drásticas. “O presidente da Assembleia da República recordou não haver na Conferência de Líderes especialistas em epidemiologia e recusou tomar quaisquer outras medidas sem um parecer técnico“, lê-se na súmula da reunião de 10 de março. Comprometia-se, no entanto, a interromper as sessões de Parlamento dos Jovens a contactar a Direção-Geral de Saúde para saber se se justificava tomar outro tipo de medidas. A Conferência de Líderes seguinte ficou marcada, no entanto, apenas para 25 de março.

Mas três dias depois — com deputados a pedirem a suspensão dos trabalhos e a ativação da comissão permanente (que funciona quando o Parlamento está fechada) — foi marcada uma conferência de líderes. As medidas ficaram mais restritivas, mas, ainda assim, aquém do que muitos pediam. Nessa reunião, o Parlamento já decidiu cortar o plenário de quinta-feira (19 de março), mas manteve, até agora, o plenário de quarta-feira (18 de março) e até o de sexta-feira (20 de março). Foi também decidido manter o funcionamento das comissões parlamentares, mas em salas mais amplas para que os deputados possam manter uma maior distância entre si.

Parlamento continua em funcionamento. Plenário de quinta-feira é suspenso, quarta há nova avaliação

Esta segunda-feira haverá nova conferência de líderes que tem como ponto único as “medidas excecionais a tomar na Assembleia da República face à pandemia do COVID-19 e às recomendações oficiais, com consequências nos agendamentos previstos”.