O líder do segundo partido timorense, CNRT, Xanana Gusmão, acusou esta terça-feira o Presidente da República por não tomar decisões sobre o impasse político, considerando que está a ser “um boneco” a mando do seu partido, a Fretilin.

“Está em curso um esforço que o senhor [Francisco Guterres] Lu-Olo está a fazer de tornar o sistema em Timor-Leste presidencialista. Ele manda”, afirmou esta terça-feira Xanana Gusmão, em conferência de imprensa da nova coligação de maioria parlamentar em Timor-Leste, liderada pelo Congresso Nacional da Reconstrução Timorense (CNRT).

Mas porque nós nos conhecemos, não é ele que manda, ele obedece. Este é o grande problema. O presidencialismo onde o Presidente ali é um boneco (…) que obedece às ordens do seu partido”, disse, referindo-se à Frente Revolucionária do Timor-Leste Independente (Fretilin).

Xanana Gusmão deixou esta terça-feira as mais duras críticas de sempre ao chefe do Estado, criticando o facto de continuar sem deliberar sobre o pedido de demissão do primeiro-ministro Taur Matan Ruak, apresentado há mais de um mês e por estar há duas semanas sem responder à apresentação de uma nova coligação de maioria parlamentar.

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O líder histórico timorense afirmou que apesar da constituição impedir que o chefe de Estado tenha cargos políticos, Francisco Guterres Lu-Olo continua a ser presidente da Fretilin, cargo que nunca abandonou.

A nova coligação exige que o chefe de Estado aceite o pedido de demissão do atual chefe do governo, Taur Matan Ruak, e abra a porta à formação do próximo executivo. Xanana Gusmão questionou igualmente a legitimidade do atual governo que “é demissionário, não tem maioria” e por isso “não pode tomar iniciativas como as que mandou ao parlamento para alteração de leis estruturantes”.X

O líder do CNRT — que lidera uma aliança de seis partidos que representam juntos 34 das 65 cadeiras do parlamento — referiu-se em particular à proposta de alteração à lei de orçamento e gestão financeira, atualmente a ser debatida no parlamento.

Toma iniciativas sem competência para isso. Os parlamentares, os deputados da coligação estão todos aqui e vão todos reprovar isso porque é inconstitucional, não é legal”, afirmou.

Questionado pela Lusa sobre se os deputados da maioria vão ou não aprovar uma eventual declaração de estado de emergência — solicitada pelo governo ao Presidente da República e que carece de aprovação parlamentar — Xanana Gusmão não deu certezas. “Tem de ter autorização do parlamento. Vamos ver, vamos ver”, afirmou.

Na conferência de imprensa o porta-voz da coligação, António da Conceição, leu uma declaração que garante que a aliança dos seis partidos está “sólida” e a atuar “em harmonia no parlamento nacional”. O texto exige ao chefe de Estado que atue com “independência, a bem da unidade do Estado e do regular funcionamento das instituições” resolvendo o impasse político para que se possa responder adequadamente às crises que assolam o país, incluindo o risco da Covid-19.

A aliança considera que é preciso “uma liderança forte” para ultrapassar os atuais problemas e critica a plataforma de entendimento anunciada no sábado pela Fretilin e pelo Partido Libertação Popular (PLP), do atual primeiro-ministro Taur Matan Ruak.

Mari Alkatiri, secretário-geral da Fretilin disse à Lusa que a plataforma tinha o apoio de outros deputados, sugerindo que membros das forças da coligação liderada por Xanana Gusmão a poderiam apoiar. Em resposta a nova aliança de maioria parlamentar recorda a lei dos partidos políticos relembrando que qualquer deputado que violar as diretrizes do partido perderá o seu mandato.

Recorde-se que o atual governo nasceu de uma coligação formada pelo CNRT, KHUNTO e PLP, estando agora o PLP isolado sem o apoio das restantes duas forças políticas, uma rotura que se materializou no chumbo, com os votos contra e abstenções dos deputados de Xanana Gusmão, do Orçamento Geral do Estado (OGE) para 2020.

Timor-Leste vive com duodécimos restritos desde 1 de janeiro, está sem fundos suficientes na conta do tesouro e enfrenta a crise da Covid-19 e o impacto de cheias que causaram 20 milhões de dólares (18,44 milhões de euros) de danos e afetaram dezenas de milhares de pessoas.