A ministra da Saúde, Marta Temido, disse este domingo que, embora haja “um caminho a ser feito”, Portugal não deve entusiasmar-se “excessivamente” com os números da Covid-19 no país. Numa entrevista à RTP, a governante revelou ainda que as autoridades de saúde estão a equacionar mudar o contexto em que o uso de máscaras é recomendado — um tema que tem marcado a discussão em Portugal e sobre o qual têm sido emitidas recomendações diferentes por diversos países.
“É evidente que estamos num contexto agressivo, de pandemia, com muitas mortes, muita gente afetada, não só pela doença, mas também pelos efeitos económicos e sociais. Mas é evidente que é um cenário encorajador, que nos deve dar ânimo para continuarmos a ser disciplinados, para chegarmos ao fim deste período com o mínimo de dano possível”, salientou a ministra da Saúde.
Marta Temido destacou que a luta contra a pandemia “exige que consigamos um equilíbrio muito difícil, mas muito importante”, entre a “nossa capacidade de ter medidas de contenção” e “a capacidade de continuarmos, de acordo com a racionalidade possível, de manter a sociedade a funcionar”. E advertiu: “Neste momento não é possível afastar cenário” nenhum. “Temos um vírus novo, uma dinâmica do conhecimento sobre o vírus, que não nos permite ter uma segurança que costumamos ter.”
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“Não tenhamos dúvidas: há um caminho a ser feito, os números mostram isso. A questão é se podemos entusiasmar-nos excessivamente com os números de hoje, e não devemos. Até à descoberta de uma vacina, aquilo que enfrentamos é um cenário de dificuldade”, admitiu a ministra, reconhecendo que há uma luz ao fundo do túnel — mas que ainda é cedo para a ver.
“Uso mais amplo de máscaras”
A ministra da Saúde foi questionada sobre a eficácia da utilização de máscaras para prevenir o contágio pelo coronavírus, um tema que tem merecido uma ampla discussão pública em Portugal devido às recomendações em sentidos diferentes que têm sido emitidas sobre o assunto.
“Devemos seguir aquilo que é a melhor recomendação do momento. Nesta altura, para pessoas sem sintomas não é recomendável o uso da máscara. Temos de perceber o que se deve decidir com base na ciência. Neste momento, a DGS deu um parecer que vai no sentido de haver um uso mais amplo das máscaras”, explicou Marta Temido.
“Estou a dizer com toda a transparência. Nós sabemos que a propagação passa sobretudo por gotículas de saliva e essas gotículas ou atingem outro ou atingem uma superfície e contagiam quem toca. A máscara, se devidamente utilizada e acompanhada por outras medidas, pode ter um efeito protetor. Sobretudo para permitir que algumas coisas que neste momento não temos estado a fazer em termos de contacto social, em termos de utilização de certos serviços”, acrescentou a ministra.
Instada a clarificar o que poderá significar o parecer da DGS em termos de recomendações práticas, Marta Temido sublinhou que aquilo que o Governo está “a equacionar é uma alteração possível — possível — do contexto em que uma necessidade de uma maior circulação social possa ser adequadamente mais protegida de máscara“.
A ministra destacou que as decisões devem ser tomadas consoante a evolução do conhecimento científico. “O que sabemos é que o que tomávamos por certo evolui, tudo acontece de forma dinâmica. O que decidimos hoje é com base na maior evidência que os técnicos nos dão mas temos de ter a adaptabilidade suficiente”, afirmou a governante.
“Mais de 100 mil testes desde 1 de março”
Marta Temido foi também questionada sobre a capacidade do país para realizar testes à Covid-19 e lembrou que Portugal tem vindo a alargar a rede laboratorial com capacidade para fazer estes testes.
“Nós começámos a nossa capacidade de testes no INSA como laboratório de referência nacional. Depois alargámos para conjunto de hospitais de referência, três. Neste momento temos 26 hospitais do SNS com capacidade e estamos a alargar com formação”, explicou Marta Temido, acrescentando que foram realizados “mais de 100 mil testes desde 1 de março“.
“Dia 1 de abril foi o dia com mais testes, mais de 9 mil testes num só dia. Temos feito todas as compras possíveis de acordo com as disponibilidades do mercado. Ontem tivemos uma entrega de 80 mil zaragatoas e estamos a aumentar as encomendas. Tivemos compras mais irregulares. Agora teremos abastecimentos mais regulares, com cadência mais definida”, revelou Marta Temido.
“Sei que as pessoas ainda estão a demorar a fazer os testes, sei disso”, admitiu a ministra. “Tudo tem de ser acelerado. Realizámos uma reunião na sexta-feira para ajudar a definir prazos máximos para os testes. Às vezes há imponderáveis que causam constrangimentos. Mas deixe-me referir que o facto de estar à espera não invalida que a pessoa deva deixar de ter cuidados, porque hoje pode ser negativo e amanhã positivo. Gostaria que ficássemos num prazo de três dias entre a necessidade de fazer o teste e a chegada do resultado, o meu compromisso é trabalhar para isso.”
Confiança em Graça Freitas? “Evidentemente que sim”
Questionada sobre se continua a manter a confiança na diretora-geral da Saúde, Graça Freitas, Marta Temido respondeu que “evidentemente que sim”. “Se não tivermos a capacidade de ser humildes, ouvir, aprender, evoluir e fazer o melhor em cada momento não estamos a servir os portugueses“, acrescentou. “Gostávamos de esmagar a curva mas imagino que seja muito difícil. Tenho ouvido muito os técnicos e tentamos fazer o melhor possível para seguir a melhor orientação e caminho.”
A ministra da Saúde revelou ainda que já aprovou as minutas para os contratos que serão assinados com entidades do setor privado em caso de necessidade de reforço do SNS. Serão contratos destinados a apoiar em dois tipos de resposta. Por um lado, para acolher doentes com Covid-19, nomeadamente doentes “em estado grave que precisem de cuidados críticos e ventiladores”; por outro lado, para receber doentes com outras patologias de modo a libertar espaço nos hospitais do SNS.
Sobre o momento em que as escolas poderão reabrir, Marta Temido disse que ainda era cedo para tomar uma decisão. É preciso “reunir a melhor evidência da saúde publica, tentar ajudar à melhor decisão para a comunidade escolar”, disse a ministra. “Não ignoramos que as escolas têm um papel fundamental de agregador social, no funcionamento de um coletivo. Temos de tomar uma decisão ponderada e não podemos hipotecar o futuro.”