A taxa de ocupação de comboios e autocarros está reduzida a um terço da capacidade, por força das medidas de distanciamento em resposta ao surto de Covid-19. Mas ainda que não existisse essa restrição legal, o que não falta nos dias de hoje é espaço. Nos autocarros e nos comboios. Esta situação é mais visível no transporte de longo curso onde a queda da procura por parte dos passageiros anda na casa dos 90%.

Essa é a percentagem avançada por fonte oficial da CP em relação à venda de passagens para os comboios Alfa Pendular e Intercidades.

“A procura no segmento de Longo Curso tem registado quebras, comboios Alfa Pendular e Intercidades, da ordem dos 90%. A venda de lugares para os comboios Alfa Pendular e Intercidades, comboios com reserva, está limitada a um terço da sua capacidade, no seguimento da orientação definida para a limitação de lotação dos transportes públicos, no âmbito do estado de emergência.”

Do lado dos autocarros que fazem percursos mais longos, o cenário não é muito diferente. Luís Cabaço Martins, presidente da ANTROP (Associação Nacional do Transporte de Passageiros) adianta ao Observador que a oferta na Rede Expressos está reduzida a 10% em relação ao serviço normal.

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Já nas ligações urbanas e regionais ferroviárias, a CP a aponta para quebras superiores a 70%, se bem que alguns comboios registem “níveis de procura mais elevados, localizados nas linhas de Sintra e Azambuja, em horas de ponta”. A situação não é apontada para a Linha de Cascais, um serviço onde uma parte importante da procura tradicional são turistas.

No caso dos operadores privados que fazem o transporte nas áreas metropolitanas de Lisboa e do Porto, a oferta ronda os 40% do normal, adianta Cabaço Martins, para cumprir os mínimos do serviço público. Isto porque os operadores privados, tal como as empresas públicas, continuam a receber a indemnização do Estado a que teriam direito pela venda de passes, apesar desta operação estar praticamente suspensa por falta de procura e de algumas  empresas públicas não estarem sequer a cobrar bilhetes.

A compensação foi atribuída pelo Governo para assegurar que a oferta de transporte público se mantém em níveis mínimos. Fora das duas maiores cidades, esse limite mínimo está reduzido para cerca de 20% da oferta normal. No entanto, para a rede Expressos de longo curso, esse apoio não está disponível.

Para além das restrições impostas às deslocações durante o estado de emergência e a limitação de apenas um terço da capacidade, as pessoas estão com medo de andar de autocarro ou de comboio por causa da proximidade física umas das outras, mas também do contacto com as superfícies, apesar de as empresas terem reforçado muito as ações de limpeza a desinfeção. E esta situação pode demorar tempo a ser ultrapassada.

No entanto, e se no caso dos passes sociais a continuação da compensação paga pelo Estado abrange operadores públicos e privados, a abordagem das empresas aos impactos económicos divergem. Para o setor privado, o principal mecanismo de apoio que tem sido usado é o recurso ao lay-off simplificado.

São várias as operadoras que recorreram a este mecanismo, entre os quais a Arriva, dona dos Transportes Sul do Tejo, e empresas do grupo Barraqueiro.

Segundo indica Cabaço Martins, as empresas têm procurado optar pela redução do horário de trabalho, em vez da suspensão, para distribuir de forma mais equitativa os cortes nos salários dos trabalhadores. No entanto, avisa que há componentes do salário pago regularmente aos motoristas, como o valor pago a título de horário suplementar (esta é uma profissão onde é comum exceder, ainda que por uma hora ou duas horas, o período diário de trabalho) que não estão a ser aceites pela Segurança Social para o cálculo dos dois terços de vencimento a que o trabalhador em lay-off total terá direito a receber.

As empresas do setor empregam cerca de 15 mil trabalhadores e provavelmente mais de metade estará já com o contrato de trabalho suspenso, total ou parcialmente.

Já a CP afasta o recurso a medidas de lay-off e diz que está a trabalhar com o Governo para “tomar as necessárias medidas para garantir o pagamento de todos os  compromissos, nomeadamente, salários dos trabalhadores e pagamentos a fornecedores, apesar do impacto financeiro que a atual situação de pandemia provoca nas contas da empresa”. Mas não adianta quais.

Mas se a situação é difícil nas empresas de transporte regular de passageiros, é dramática no segmento comercial e turístico do transporte rodoviário. Para além dos serviços de grupos e agências de viagens estarem paralisados, também pararam os autocarros alugados por autarquias, escolas e outras instituições. E se algumas empresas do setor prestam os dois serviços, já os operadores que estão apenas no segundo segmento terão muita dificuldade em aguentar. Mesmo que recorram agora ao lay-off e outros apoios do Estado, como linhas de crédito, o regresso do negócio ao que era vai demorar muito mais tempo, ou até pode nem acontecer. O cenário de insolvência poderá ser inevitável para algumas empresas, admite Cabaço Martins.