Os tribunais e o Ministério Público estão desde meados de março a funcionar em regime de férias judiciais, decidindo apenas processos urgentes. Mas à medida que vão sendo levantadas restrições e que as atividades sócio-económicas vão sendo retomadas, também os tribunais estudam o seu regresso ao ativo. O que pode acontecer ainda durante o mês de maio.

Esta quarta-feira, a ministra da Justiça reuniu-se com os representantes dos supremos tribunais e com a procuradora-geral da República para acertar agulhas. A data da retoma ainda não está fechada, estando agendado para amanhã um debate no Parlamento sobre uma proposta do Governo nesse sentido, mas parece já certo que o regresso vai ser feito em duas velocidades: presencial e por videoconferência.

Falando no final de um encontro no Ministério da Justiça com os conselheiros António Piçarra (líder do Supremo Tribunal de Justiça) e Dulce Neto (presidente do Supremo Tribunal Administrativo) e a procuradora-geral Lucília Gago, a ministra Francisca Van Dunem admitiu que a reabertura será feita em “dois modos”:

  • “há atos que têm de ser presenciais, com a presença dos desenvolvidos”. “Havendo situações onde não seja possível respeitar os dois metros de distância haverá a obrigatoriedade do uso de máscaras e viseiras a complementar.”
  • “Mas há outros que podem ser praticados à distância

Governo clarifica e avança para suspensão de prazos judiciais devido à crise do coronavírus

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De acordo com Van Dunem, apesar de os tribunais estarem a funcionar de forma “mais lenta” desde que foi decretado o estado de emergência, a 18 de março, a verdade é que, a partir de agora, vão aumentar muito o volume de trabalho. “Vamos ter agora um enorme contencioso, associado às crises que pode haver nas empresas, à situação dos trabalhadores e até a contenciosos associados ao Estado”, disse, em declarações captadas pela RTP.

A normalização da atividade dos tribunais está, por isso, a ser estudada pelo Governo, mas ainda não há data fechada.

Em comunicado divulgado no final da reunião desta quarta-feira, o Ministério da Justiça sublinha que “a retoma da normalidade possível implica o envolvimento ativo de todas as funções do Estado”, sendo que “os tribunais assumem uma dimensão central neste processo, enquanto garantes da tutela jurisdicional dos direitos dos cidadãos”. “A atividade da justiça laboral é indispensável à garantia dos direitos dos trabalhadores, potencialmente mais afetados no contexto de crises; a regulação de conflitos entre os cidadãos e o Estado pressupõe o funcionamento da jurisdição administrativa”, lê-se ainda no comunicado.

Proposta para reabertura será debatida no Parlamento esta quinta-feira

A reunião serviu para “definir as linhas de ação futuras tanto na perspetiva legislativa como na gestionária”, sendo que a retoma das atividades processuais está dependente da aprovação no Parlamento de uma proposta de lei do Governo que põe termo à suspensão dos prazos processuais, a vigorar desde 20 de março (lei 1-A/2020), “e que disciplina o modo de realização dos atos que impliquem a presença física de intervenientes processuais”. Essa proposta de lei vai ser debatida esta quinta-feira, no Parlamento, sendo que o Governo considera que é previsível que venha a entrar em vigor “ainda no decurso do mês de maio”. 

Ou seja, apesar de ainda não haver uma data fechada para a reabertura dos tribunais nos prazos ditos normais, o Governo acredita que isso poderá acontecer ainda este mês, garantindo o cumprimento das regras sanitárias para o funcionamento presencial dos tribunais.

De acordo com a proposta do Governo, em cima da mesa estão duas opções, tal como referiu a ministra da Justiça: “Nas diligências que requeiram a presença física das partes, dos seus mandatários ou de outros intervenientes processuais, a prática de quaisquer atos processuais e procedimentais realiza-se através de meios de comunicação à distância adequados, designadamente teleconferência, videochamada ou outro equivalente”; e “quando não for possível a realização das diligências que requeiram a presença física das partes, dos seus mandatários ou de outros intervenientes processuais, nos termos da alínea anterior, realiza-se presencialmente a diligência sempre que seja possível observar o limite máximo de pessoas e demais regras de segurança, higiene e sanitárias definidas pela Direção-Geral da Saúde”.

Segundo o comunicado divulgado esta quarta-feira pelo Ministério da Justiça, “foram identificadas e equacionadas, em articulação com o Conselho Superior da Magistratura, o Conselho Superior dos Tribunais Administrativos e Fiscais, a Procuradoria Geral da República e a Direção Geral da Saúde, as regras a adotar no plano sanitário para reduzir a transmissão do vírus e garantir a proteção dos corpos profissionais residentes nos tribunais bem assim como das demais profissões judiciárias e utentes que os frequentam”. Ou seja, está a ser estudado um plano de regresso, com as normas de segurança associadas.

Como informação complementar, o Ministério da Justiça dá conta de que, no período de 1 de março a 23 de abril, foram realizadas pelos tribunais 33.908 diligências, cerca de um terço das realizadas no mesmo período do ano anterior. E “de 16 de março a 27 de abril, foram praticados mais de um milhão e 500 mil atos pelos oficiais de justiça, cerca de um terço realizado em período homologo”, lê-se ainda.

Tribunais de primeira instância cancelaram 47.832 diligências devido à pandemia

O conselheiro António Piçarra já tinha avançado em entrevista ao Observador que a pandemia de covid-19 tinha levado ao cancelamento de 47.832 diligências nos tribunais de primeira instância entre 11 de março e 27 de abril. É este o número total de diligências que foram diretamente afetadas pela crise sanitária e que terão de ser recuperadas após a reabertura dos tribunais, de acordo com os dados fornecidos pelo presidente do Supremo Tribunal de Justiça.