Os festivais de música e espetáculos “de natureza análoga”, marcados até 30 de setembro, só serão permitidos com lugares marcados e regras de distanciamento, e o reembolso de bilhetes só em 2022, segundo a proposta de lei esta sexta-feira revelada.
De acordo com o documento, que deu esta sexta-feira entrada no Parlamento e que será discutido no próximo dia 14, é aberta uma exceção à proibição anunciada na quinta-feira pelo Governo sobre o calendário de festivais de música de verão e outros eventos semelhantes.
“Até 30 de setembro, os espetáculos só podem ter lugar em recinto coberto ou ao ar livre, com lugar marcado e no respeito pela lotação especificamente definida pela Direção-Geral da Saúde em função das regras de distanciamento físico que sejam adequadas face à evolução da pandemia da doença COVID-19”, lê-se na proposta.
A proposta é aplicável ao reagendamento ou cancelamento de espetáculos não realizados entre os dias 28 de fevereiro de 2020 e 30 de setembro de 2020. Quem comprou bilhete para eventos dentro daquele período, só poderá pedir o reembolso a partir de 1 de janeiro de 2022.
Até lá, pode pedir a troca do bilhete por um vale “de igual valor ao preço pago”, válido até 31 de dezembro de 2021, e esse vale pode ser utilizado na “aquisição de bilhetes de ingresso para o mesmo espetáculo a realizar em nova data ou para outros eventos realizados pelo mesmo promotor”.
“Caso o vale não seja utilizado até ao dia 31 de dezembro de 2021, o portador tem direito ao reembolso do valor do mesmo, a solicitar no prazo de 14 dias úteis”, lê-se no documento.
“Não há alterações”, segundo Álvaro Covões
No entender de Álvaro Covões, da produtora Everything is New, a proposta “não é substancialmente diferente” da decisão comunicada após o Conselho de Ministros na quinta. “O documento de ontem [quinta-feira] dizia que estão proibidos festivais até 30 de setembro, ou seja, aglomerações. Pelo que percebo da proposta de lei, a proibição continua a vigorar, não há alterações.”
O responsável pelo festival NOS Alive, e vice-presidente da Associação de Promotores de Espetáculos, Festivais e Eventos (APEFE), sublinhou ao Observador que “sem se conhecer a proposta em concreto estamos no terreno da especulação e das suposições”. “Penso que as associações do setor ainda terão de ser ouvidas. Certamente daremos o nosso contributo. Depois a proposta é alterada ou não e só depois é que é aprovada e passa a vigorar.” Álvaro Covões desconhece qualquer data para audição da APEFE. A proposta de lei diz explicitamente que a Assembleia da República deve ouvir a APEFE e também a APORFEST (Associação Portuguesa dos Festivais da Música) e o Conselho Nacional de Consumo.
Questionado sobre se o NOS Alive — marcado para 8, 9, 10 e 11 de julho no Passeio Marítimo de Algés — poderia acontecer com lugares marcados e distanciamento obrigatório entre pessoas, o mesmo responsável foi direto:
“Claro que não. Lugares marcados pressupõe lugares sentados. Mas, como já disse, estamos no campo das especulações, porque não conhecemos a proposta de lei. Queríamos fazer os festivais desde que houvesse condições de segurança para todos, mas não vamos contrariar as autoridades de saúde. Se o Governo toma estas decisões, é porque as autoridades de saúde não querem ajuntamento e nós temos de respeitar e cumprir.”
O festival de Paredes de Coura está a “fazer o luto”
Por seu lado, João Carvalho, diretor do festival Vodafone Paredes de Coura, confessou ter sido apanhado de surpresa com o documento que deu entrada no Parlamento. No entanto, mantém a decisão de não realizar este ano a 28ª edição, como tinha sido comunicado na quinta-feira.
“Para fazer um festival desta dimensão não me parece possível, não sei as condições da proposta, vou esperar para ver, mas garantidamente que não. Coura, este ano, não há hipótese, assunto resolvido. Estamos a fazer o luto”, afirmou.
João Carvalho confessa que esta poderá ser uma oportunidade para outras empresas, por estarmos numa altura em que as pessoas estão “ávidas de música”, mas, quanto ao seu festival, é “esperar por tempos melhores”.
Karla Campos, diretora do festival EDP Cool Jazz, é da opinião de que “não há diferença substancial” entre a proposta de lei de sexta-feira e o anúncio do Governo na quinta-feira. “Estar a fazer festivais, ou outros eventos, com a exigência de dois metros de distância reduz a lotação e interfere desde logo na viabilidade económica do evento, portanto, é igual a uma inibição total”, referiu.
O EDP Cool Jazz 2020 já está dado como perdido, com adiamento para 2021. “O meu festival é com cadeira e as 30 ou 40 primeiras filas já estavam vendidas. É impossível dar distanciamento. Não há espaço suficiente no Hipódromo Manuel Possolo [Cascais]. Além disso, quando negociamos a vinda dos artistas, os cachets têm em conta a lotação. Não podemos agora alterar tudo isso”, explicou Karla Campos.
Contactada pelo Observador, a Música no Coração, promotora responsável por festivais como o Super Bock Super Rock ou MEO Sudoeste, espera pela aprovação ou não da proposta para fazer comentários.