A história já vai longa: primeiro, um estudo na revista médica The Lancet concluiu que uso de hidroxicloroquina podia aumentar o risco de morte, o que levou a Organização Mundial de Saúde a suspender temporariamente os ensaios clínicos com o medicamento — atividade que foi, entretanto, retomada. Não muito tempo depois, a mesma revista distanciou-se do já polémico estudo, reconhecendo num aviso formal que “questões importantes” estavam a ser alvo de uma auditoria. Agora é notícia que o estudo foi retratado.
OMS retoma ensaios clínicos com hidroxicloroquina. Estudo sobre riscos posto em causa
O principal autor, o professor Mandeep Mehra, do Brigham and Women’s Hospital em Boston, Massachusetts, pediu à publicação que o artigo fosse retratado uma vez que já não podia garantir a precisão dos dados. Richard Horton, editor da revista médica, disse ao The Guardian que “este é um exemplo chocante de má conduta na área da investigação no meio de uma emergência de saúde global”.
A retratação do estudo acontece depois deste jornal britânico ter encontrado uma série de inconsistências nos dados usados. A Surgisphere é uma pequena empresa norte-americana que o jornal The Guardian descreve como tendo uma mão cheia de funcionários, entre os quais “um escritor de ficção e um modelo de conteúdos para adultos”. Foi esta empresa que forneceu os dados para o artigo publicado na revista The Lancet — e outros estudos noutras revistas —, mas o jornal britânico contactou alguns hospitais que alegadamente terão contribuído para essa base de dados e nenhum deles diz sequer conhecer a empresa.
Revista The Lancet distancia-se do criticado estudo sobre a hidroxicloroquina
O CEO (presidente executivo) da empresa em questão, Sapan Desai, chegou a afirmar que ia cooperar com a auditoria independente, mas acabou por se recusar a dar aos investigadores acesso a todos os dados solicitados com a justificação de que tal “violaria os contratos dos clientes e os requisitos de confidencialidade”.