O ministro das Finanças admite um défice de 6% a 7% para 2020 e aponta para um aumento das necessidades de financiamento do Estado em 13 mil milhões de euros, face ao que estava previsto no início do ano. Esse é o valor que será preciso ir buscar aos mercados internacionais.
Em entrevista à Atena 1, a dias de entregar a proposta de Orçamento Suplementar para este ano, Mário Centeno recusou a adoção de medidas de austeridade, mas também afastou uma descida de impostos. “Austeridade significa em recessão cortar despesa e aumentar impostos. Não vamos fazer isso”. Garantiu também que não haverá cortes nas pensões. No entanto, também assinalou que não haverá uma diminuição das taxas de impostos.”Não vamos colocar o Estado numa situação débil”.
O ministro fala numa adaptação ao sistema às necessidades das empresas, com isenções e adiamentos de entregas de imposto. “Não estamos em condições de erodir a base tributária do Estado, se não o Estado não consegue responder. E deixou vários avisos à navegação:
“Um Estado debilitado não está presente, é gerador de instabilidade. Não podemos por em causa a capacidade do Estado estar presente”.
“As responsabilidades que o Estado assume fá-lo em nome de todos, e quando faz, se não o dizer bem, as consequências são para todos”
Horas depois de ter sido revelada a previsão do Governo para uma recessão de 6,9% do PIB este ano — ainda assim menos acentuada do que a prevista pelo FMI e Comissão Europeia— o ministro das Finanças destacou a dimensão da queda na criação de riqueza entre a segunda metade de março e a primeira quinzena de abril.
“Nos últimos dias de março e nos primeiros de abril o PIB [Produto Interno Bruto], a nossa produção, terá caído face ao mesmo período do ano passado números próximos dos 25%. Isto não aconteceu na nossa memória recente nunca em Portugal”. O ministro das Finanças confessa que foi um “choque brutal”.
“As pessoas mais próximas diziam-me que se via na minha cara de forma expressiva qual era o sentimento do ministro das Finanças.”
Centeno afirmou contudo que este efeito foi temporário, porque “já estamos a recuperar” e as empresas estão a reagir muito bem e cita a adesão reduzida das empresas à possibilidade de adiar o pagamento de obrigações fiscais.
Sobre aumentos salariais no Estado para o próximo ano, o ministro deixou o alerta: “Temos de ser muito racionais com o dinheiro do Estado neste contexto e comparar com o que se passa no resto da economia”.
“Nunca falei” com Costa Silva, mas plano de recuperação “não vai criar uma economia nova”
O ministro das Finanças foi ainda questionado sobre a relação com o consultor que o primeiro-ministro foi buscar para preparar o plano de recuperação económica para dez anos, António Costa Silva. Centeno começou por adiantar que a função desse plano ainda não estará bem entendida, e frisando que o foco agora deve estar no plano de estabilização, conhecido esta quinta-feira.
Perante a insistência sobre as conversas com o presidente da Partex, foi categórico. “Nunca falei com ele na minha vida”. E quando novamente questionado sobre como pode o conselheiro preparar o plano sem falar com o ministro das Finanças, responde: “Só estou a dizer o que posso dizer”, acrescentando: ”Não estou muito preocupado com isso”.
Apesar de o programa de recuperação ser um instrumento “muito importante, porque permite colmatar as brechas no investimento e nos rendimentos provocadas por esta crise”, Centeno também desvalorizou o alcance deste instrumento: “Não vamos criar uma economia nova, nem um homem novo. Isso não existe. O que existe é o esforço dos portugueses” e um plano do Governo que tem um novo quadro institucional a nível europeu cuja resposta Centeno elogiou.
Vê esta crise como uma injustiça? Mário Centeno contrapõe: “Este desafio do ponto de vista político, intelectual e profissional tem sido muito desafiante ao ponto de colocar soluções que nunca imaginámos e isso é muito interessante”. Mas “preferiria não ter de responder a este desafio, claro que sim”, porque Portugal estava a ser um exemplo: com excedente orçamental e a dívida a cair”.
À pergunta incontornável sobre a sua continuidade do Governo, Mário Centeno deixou a resposta em aberto. Mas quando questionado sobre se iria preparar o Orçamento do Estado para 2021, afirmou: “Não posso garantir, como ninguém o pode garantir”. A única garantia que dá e a de que estará a trabalhar este fim de semana no Orçamento Suplementar a apresentar na próxima semana. “Esse é o foco”. Mesmo sem por fim ao tabu, Centeno deixa um recado para o seu sucessor, porque ninguém acaba como ministro.
“É necessário manter um rigor orçamental que esteve Governo deve continuar a promover para que a estabilidade financeira do pais não possa ser posta em causa”.