Depois do vandalismo na estátua do Padre António Vieira, em Lisboa, a rádio Observador foi ouvir o historiador João Pedro Marques, especialista em escravatura, que diz que o que se está a fazer em Portugal “é uma imitação do que existe lá fora”, nesta matéria. E que isso decorre de questões “constantemente agitadas” pela “camada universitária ligada à extrema esquerda”.
Para o historiador, esse “não é um ato isolado”, mas sim inserido “numa campanha que tem três anos, muito focada na figura do Padre António Vieira e muito especificamente nesta estátua, que é uma imitação do que se faz lá fora”. Não considera que existam “partes do nosso passado que estejam mal resolvidas”, até porque “a escravatura já foi condenada no século XVIII e XIX, já se lutou contra ela, já se pôs fim ao tráfico de escravos e escravidão”. “Claro que surgiram outras formas de escravidão humanas, mas parte importante do ocidente criminalizou e lutou contra a escravatura”, afirma.
Estátua de Padre António Vieira vandalizada: “A história da escravatura já foi condenada”
Quanto às manifestações deste género, João Pedro Marques considera que isso se insere numa “tendência” que surgiu sobretudo depois de a “ONU ter decretado esta como a década dos afrodescendentes e desencadeou medidas e iniciativas que algumas pessoas em Portugal procuraram agitar à nossa escala”. Dá como exemplo a proposta que chegou a correr pela devolução de património histórico às ex-colónias, mas considera que isso é uma “mera cópia do que se faz lá fora”. “Não estou a ver o que há para devolver, não somos os franceses ou ingleses, que pilharam grande parte dos monumentos” das suas colónias.
O historiador analisa que surgiu entretanto “uma camada associada a uma visão radical de esquerda que quer refazer e reproduzir e representar outra vez todo esse drama”, mas que a “questão está resolvida”.
“Descoloniza”. Estátua de Padre António Vieira, em Lisboa, foi vandalizada
Sobre o racismo, em concreto, João Pedro Marques diz que “houve uma fase que foi muito marcada pelo racismo, no final do século XIX e primeiro terço do século XX, que era uma realidade dramática e injusta, mas isso está ultrapassado num país como o nosso”. “No nosso país não vejo essas manifestações de racismo que a extrema esquerda permanentemente aponta”, diz em comparação com o que se tem passado nos Estados Unidos que nos últimos dias tem assistido a manifestações antiracistas, sobretudo depois da morte de George Floyd, morto por um polícia.
Já em Portugal, o historiador diz que a questão está levada ao extremo. “Qualquer incidente, qualquer violência ou discussão, injustiça que se faça uma pessoa de raça negra é imediatamente apresentado como exemplo de racismo. As pessoas desentendem-se e são injustas, independentemente na cor da pele. Não se estriba aí uma posição estrutural de racismo, não é assim que se vê”, diz.
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