O primeiro-ministro disse no início da pandemia que a meio da batalha não se mudam generais, mas a Direção-Geral de Saúde (DGS) acaba de perder uma coronel numa das fases críticas do surto de Covid-19. A chefe da divisão de Epidemiologia e Estatística da DGS — uma das mais importantes para acompanhamento e controlo do surto — anunciou a saída deste cargo de topo. Rita Sá Machado, confirmou fonte oficial da DGS ao Observador, “vai integrar a equipa missão permanente de Portugal junto dos Organismos e Organizações Internacionais das Nações Unidas, em Genebra, em virtude da presidência portuguesa do Conselho da União Europeia”. Perante o facto de perder uma das suas chefias mais importantes durante a pandemia, a mesma fonte garante que foi “feita uma transição programada, tendo sido assegurada a continuidade de funções por um profissional qualificado”.

Rita Sá Machado já tinha escrito na terça-feira, na sua conta do Twitter, que era “um dia despedida”, de “reflexão” e “de mudar”. Agradeceu, na mesma ocasião à DGS enquanto entidade pelos “bons e maus momentos”. Dizia ainda que pode verificar a importância de uma saúde pública “isenta e forte”, deixando um desafio: “Vamos construir isso?” No entanto, a cessante chefe da divisão de Epidemiologia e Estatística não esclareceu na terça-feira para onde iria nem as razões da sua saída.

Rita Sá Machado, que era uma das epidemiologistas essenciais na preparação e nas apresentações das reuniões do Infarmed com a classe política, acabou por sair da DGS menos de uma semana depois da mais polémica destas reuniões. Tal como o Observador escreveu na última quarta-feira, Sá Machado foi uma das especialistas (a par de Baltazar Nunes) que contrariou a tese — que até então era veiculada pelo primeiro-ministro — de que o aumento de casos em Lisboa se justificava com o facto do aumento da testagem.

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Fontes conhecedoras do processo garantiram, no entanto, ao Observador, que não houve qualquer conflito entre Rita Sá Machado e a entidade liderada por Graça Freitas, mas que se tratava de uma “proposta irrecusável”. E que já estava prevista desde o primeiro trimestre do ano.

A DGS garante que já tem um substituto à altura para o lugar de Rita Sá Machado, embora não revele o nome. Em Diário da República também ainda não foi sequer publicada a exoneração da epidemiologista.

Rita Sá Machado tem 32 anos e é mestre em saúde pública pela Universidade de Londres. Tem pós-graduações em gestão na saúde e uma pós-graduação em medicina do viajante. Tem ainda o mestrado em Medicina. É também consultora da OMS desde 2015. Assumia um papel fundamental no combate à pandemia de Covid-19 em Portugal.

Basta olhar para as competências da divisão que chefiava para ver a importância que tinha no combate ao surto. À sua guarda tinha missões fundamentais durante uma pandemia:

  • Desenvolver sistemas de informação para conhecer o estado de saúde da população e seus determinantes, contemplando a recolha e compilação dos dados e a avaliação da qualidade, validação, análise, síntese, disseminação e comunicação da informação;
  • Monitorizar o estado de saúde da população e seus determinantes, produzindo informação para o planeamento da saúde;
  • Desenvolver e manter a vigilância epidemiológica de doenças abrangidas por sistemas de vigilância em saúde pública e de determinantes em saúde, garantindo a disseminação da informação e apoiando a coordenação da vigilância epidemiológica nacional;
  • Uniformizar conceitos, nomenclaturas e metodologias conducentes à codificação de doenças, traumatismos ou lesões funcionais e à definição de indicadores e índices sobre o estado de saúde e seus determinantes;
  • Definir metodologias de recolha, compilação, avaliação da qualidade e validação de dados/informação, nomeadamente garantindo a qualidade da certificação de óbitos;
  • Assegurar as funções de codificação das causas de morte no âmbito do Sistema Estatístico Nacional;
  • Orientar tecnicamente a realização de estudos epidemiológicos de âmbito nacional e internacional;
  • Validar resultados de estudos realizados por entidades ou investigadores, de modo a serem oficialmente reconhecidos com representatividade nacional.