O pintor Nikias Skapinakis, que marcou mais de seis décadas da arte portuguesa contemporânea e fez o “Retrato dos Críticos”, morreu esta quarta-feira, em Lisboa, aos 89 anos, anunciou a Galeria Fernando Santos, que representa o artista.

De ascendência grega, Skapinakis nasceu em Lisboa, em 1931, frequentou o curso de Arquitetura, que abandonaria para se dedicar totalmente à pintura, que assumiu como “vocação, ofício e reflexão”, como escreveu a historiadora de arte Raquel Henriques da Silva. Além da pintura a óleo, como atividade dominante, dedicou-se à litografia, serigrafia e ilustração de livros.

Entre outras obras, ilustrou Quando os Lobos Uivam, de Aquilino Ribeiro (Livraria Bertrand, 1958), e Andamento Holandês, de Vitorino Nemésio (Imprensa Nacional, 1983). É autor de um dos painéis concebidos para o café “A Brasileira do Chiado” (1971), em Lisboa. Para a estação de Arroios, do metro de Lisboa, que se mantém em obras de ampliação, concebeu em 2005 o painel “Cortina Mirabolante”, que se junta aos originais de Maria Keil.

Em 2012, o Museu Coleção Berardo apresentou a exposição antológica “Presente e Passado, 2012-1950”, dedicada ao artista, no Centro Cultural de Belém, em Lisboa. No ano seguinte, foi-lhe atribuído pela Sociedade Portuguesa de Autores o Prémio de Artes Visuais. Em 2014, apresentou na Casa Fernando Pessoa, em Lisboa, a série de guaches Lago de Cobre e a série de desenhos Estudos de Intenção Transcendente. Ilustrou ainda a revista Colóquio Letras dedicada a Almada Negreiros.

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Em 2017, apresentou no Museu Arpad Szenes-Vieira da Silva, igualmente em Lisboa, a série desenvolvida a partir de 2014, “Paisagens Ocultas – Apologia da Pintura Pura”. Anteriormente, em 1985, o Centro de Arte Moderna da Fundação Calouste Gulbenkian, também em Lisboa, mostrou uma exposição antológica da sua pintura, completada com uma retrospetiva da obra gráfica e guaches na Sociedade Nacional de Belas Artes.

No passado mês de julho, a Galeria Fernando Santos, no Porto, inaugurou uma exposição de obras inéditas de Nikias Skapinakis, sobre o tema da paisagem, com o lançamento do livro Nikias Skapinakis — paisagens [landscapes], de Bernardo Pinto de Almeida, numa edição conjunta com a Documenta.

Marcelo destaca “história em imagens” de um oposicionista do regime

O Presidente da República, Marcelo Rebelo de Sousa, considerou o trabalho do pintor Nikias Skapinakis uma “história em imagens do Portugal contemporâneo”, elaborada por um “oposicionista do regime”, “cosmopolita e livre”.

De acordo com uma nota publicada na página da Presidência da República, Marcelo Rebelo de Sousa afirma que Nikias Skapinakis foi “um autor emblemático da nossa pintura e artes visuais”. O chefe de Estado referiu que o pintor “foi amigo de escritores, oposicionista ao regime, homem culto e elegante, cosmopolita e livre”.

“Podemos fazer, através de muitos dos seus trabalhos, uma história em imagens do Portugal contemporâneo”, sublinha o Presidente da República, acrescentando que “foi um amigo próximo”, com quem teve o “gosto e a honra de partilhar ideias ao longo de muitos anos”.

“Das capas de livros de Aquilino e Nemésio aos painéis da Brasileira do Chiado, do encontro entre três mulheres voluntariosas (Natália Correia, Fernanda Botelho e Maria João Pires) à arte pública no metropolitano de Lisboa e a uma homenagem à bandeira nacional, Nikias retratou com maestria o seu e o nosso tempo. Mas também pintou o seu imaginário: naturezas mortas, séries mitológicas, quartos inventados, jogos com a publicidade, exultações cromáticas ou eróticas e algumas melancolias”, adianta a nota no site da Presidência.

Ferro Rodrigues recorda Skapinakis como um “dos nomes maiores da pintura” nacional no século XX

O presidente da Assembleia da República, Eduardo Ferro Rodrigues, expressou condolências à família do pintor Nikias Skapinakis, um “antifascista desde a juventude” e “um dos nomes maiores da pintura portuguesa” no século XX.

“No momento do seu desaparecimento [de Nikias Skapinakis], endereço à sua família e amigos, em meu nome e no da Assembleia da República, as mais sentidas condolências”, explicita o presidente do parlamento através de uma nota enviada à agência Lusa, acrescentando que “foi com tristeza” que recebeu a notícia da morte do pintor.

Graça Fonseca lembra “mestre da cor e da forma”, “da poesia visual e das linhas do corpo”

A ministra da Cultura lembrou Nikias Skapinakis como “um mestre da cor e da forma, da geometria e das metáforas, da poesia visual e das linhas do corpo, matéria fundamental que trabalhava em obras”. Estas, importantes pela sua simbologia, história e narrativa, “estão representadas nas grandes coleções de arte contemporânea nacionais, tanto públicas quanto privadas, com destaque para a Coleção de Arte Contemporânea do Estado”.

“O seu olhar pictórico sobre a cidade e as pessoas — e os artistas e intelectuais dentro delas — é exemplo de como, através da arte, podemos aprender a história dos nossos tempos. Nas pinturas de Nikias Skapinakis, nos rostos e figuras que representam, anónimos ou não, está um pedaço de Portugal”, afirmou Graça Fonseca em comunicado.

CML lamenta morte de “um dos artistas mais inventivos e marcantes” da segunda metade do século XX

Em comunicado, a Câmara Municipal de Lisboa (CML), cidade de onde o artista era originário, lamentou “profundamente o falecimento de Nikias Skapinakis, um dos artistas mais inventivos e marcantes no contexto da Arte Contemporânea Portuguesa a partir da segunda metade do século XX”.

“Detentor de uma abordagem única e reconhecível na pintura, com forte síntese formal e contraste cromático no tratamento dos corpos e dos objetos, abeirando-se por vezes da abstração, Nikias Skapinakis exprimia de um modo singular a humanidade que o fascinava, fosse nas representações mitológicas, nas paisagens e sobretudo nos vários retratos de intelectuais, artistas e críticos com os quais conviveu, mas também nas ilustrações que realizou para uma série de livros, onde plasmou a sua interpretação pessoal e íntima do narrado”, referiu a CML.

Recordando a luta de Skapinakis contra o Estado Novo, a autaquia recordou que o seu nome foi “incluído no memorial às vítimas da ditadura, instalado durante 2019 na Estação de Metro da Baixa-Chiado”.

Artigo atualizado às 11h58 de 27/8/2020 com o comunicado da Câmara Municipal de Lisboa