O debate em torno do aquecimento global e das alterações climáticas passa sempre pelo tema da mobilidade elétrica. Muitos duvidam que os carros elétricos sejam ecológicos quando consideram a produção dos veículos, das baterias e o consumo de energia para as carregar.

Mas contra factos não há argumentos e a verdade é que, em média, os automóveis elétricos em circulação na União Europeia emitem quase três vezes menos dióxido de carbono (CO2) do que os carros a gasolina e gasóleo, equivalentes.  É o que diz o último estudo publicado pela Federação Europeia de Transportes e Ambiente, de que a associação Zero faz parte, visando aumentar a transparência e dissipar alguns mitos.

De acordo com o relatório, os automóveis elétricos emitem menos 66% de CO2 comparativamente aos carros a gasóleo, e menos 68% no que diz respeito às versões a gasolina. Estes valores são obtidos tendo em consideração as emissões geradas na produção e distribuição de eletricidade em Portugal, as que resultam da produção de baterias num país europeu, com eletricidade proveniente de fontes renováveis e as emissões de um automóvel médio (segmento C) num ciclo de utilização de 225 mil quilómetros.

Além disso, estima-se que os avanços tecnológicos das novas gerações de automóveis elétricos vão produzir emissões quatro a cinco vezes inferiores, à medida que a estrutura energética da Europa se for convertendo para renováveis.

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Mas, se precisa de mais argumentos, saiba que os carros elétricos compensam a “pegada de carbono”, que resulta da produção da bateria, ao fim do primeiro ano de utilização e ainda economizam mais de 30 toneladas de dióxido de carbono ao longo do ciclo de vida, comparando com um modelo equivalente a combustão. Portanto, a vantagem ambiental de conduzir um automóvel elétrico, além da económica, é incontestável.

“É fundamental olhar para o dióxido de carbono, enquanto gás com efeito de estufa, pelo seu impacto nas alterações climáticas e, também, para os óxidos de azoto (NOx) que têm consequências diretas na saúde,” sublinha Francisco Ferreira. O Presidente da ZERO – Associação Sistema Terrestre Sustentável explica que “o maior problema é o dióxido de azoto cujo limite de concentração é, sistematicamente, ultrapassado em Lisboa e no Porto”.

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Medir o CO2

A principal estação de monitorização do ar atmosférico na Terra, onde as concentrações crescentes de dióxido de carbono atmosférico são globalmente determinadas é o Observatório de Mauna Loa, no Havai. Estabelecida em 1957, esta estação faz avaliações de CO2 desde 1969 e integra uma rede com mais três estações, na ilha de Samoa, no Pacífico Sul, no Alasca e na Antártida, próximo do Pólo Sul. Em Portugal, também é feita a medição do CO2 atmosférico na estação localizada na Serreta, na ilha Terceira.

Importa esclarecer que o dióxido de carbono (CO2) não é um poluente do ar, sendo aliás essencial ao ciclo do carbono que sustenta a vida no planeta. Além disso, a monitorização do dióxido de carbono na atmosfera é um procedimento difícil e exigente, seja pela escolha do local de amostragem, seja pelo processo de recolha da amostra, que pode facilmente ser contaminada por outros gases ou, até, pelo próprio operador.

Portanto, não é medida a concentração de CO2 num país, ou cidade, em particular. Muitas organizações e investigadores “recorrem a imagens de satélite que captam as concentrações de óxidos de azoto (NOx) para depois dizer que as emissões de dióxido de carbono estão a cair”, explica o ambientalista. Através de imagens de satélite não se consegue monitorizar o dióxido de carbono, mas é possível medir as concentrações dos óxidos de azoto (NOx). Como ambos os gases estão ligados a processos de combustão, afirma o dirigente da ZERO, “se as concentrações de NOx são menores vistas do satélite, então é possível deduzir que o CO2 também é inferior”.

Depois da redução inédita e sem precedentes nas emissões de gases com efeito de estufa durante o confinamento, em grande parte devida à queda nos consumos de combustíveis, à paragem das centrais a carvão e à descida no consumo de eletricidade, verifica-se já uma tendência de regresso à normalidade preocupante que vivíamos antes da pandemia.

Olhando para os últimos dados disponíveis, referentes à emissão de dióxido de azoto (NO2), durante o mês de maio, na Avenida da Liberdade, em Lisboa, no período do estado de alerta foram medidos valores médios de 22 ug/m3. Na primeira fase de desconfinamento, o valor desceu para 20 ug/m3, e na segunda fase, de 18 a 29 de maio, a concentração de NO2 atingia já 38 ug/m3. No Porto, a estação instalada na Praça Francisco Sá Carneiro registou 45 ug/m3 de NO2 no início do confinamento, 49 ug/m3 na primeira fase de desconfinamento e 55 ug/m3 na fase final. Veja os dados de todas as estações, em pormenor, na tabela seguinte:

Metas para o futuro

As emissões de Gases com Efeito de Estufa (GEE) dos diversos setores de atividade são registadas no Inventário Nacional de Emissões Atmosféricas, sob a forma de estimativas que estabelecem uma relação entre níveis de atividade como, por exemplo, o combustível fóssil usado para produzir eletricidade e os níveis de emissões.

Portugal aderiu a vários acordos internacionais que exigem a divulgação das emissões de gases e poluentes atmosféricos, para definir quais são os limites a estabelecer e verificar o cumprimento. A medição das emissões é obrigatória à escala nacional, sendo da responsabilidade da Agência Portuguesa do Ambiente reunir a informação e enviar os relatórios, anualmente, para a Agência Europeia do Ambiente, que, por sua vez, os faz chegar à Convenção das Nações Unidas para as Alterações Climáticas.

Francisco Ferreira explica que “a quantidade e complexidade dos dados a processar e analisar é tão grande que os relatórios podem ser divulgados com quase um ano e quatro meses de atraso em relação ao período a que se referem”.

Quanto a metas, Portugal mantém o compromisso assumido no Roteiro para a Neutralidade Carbónica 2050, que identifica os principais vetores de descarbonização em todos os setores da economia. O documento aponta políticas públicas e estratégias de redução de emissões para alcançar o objetivo até ao final de 2050, em diferentes cenários de desenvolvimento socioeconómico.

O roteiro estabelece o objetivo de redução de emissões entre 85% e 90% até 2050, em relação a 2005, que foi um ano de “pico”. A compensação das restantes emissões será feita através do uso dos solos e florestas, seguindo uma trajetória de redução de emissões, entre 45% e 55%, até 2030, e entre 65% e 75% até 2040.

Segundo a Agência Portuguesa do Ambiente, o roteiro foi feito em articulação com os trabalhos de preparação do Plano Nacional de Energia e Clima (PNEC 2030), que será o principal instrumento de política energética e climática para a década 2021-2030. A propósito do PNEC 2030, o ambientalista da ZERO salienta que “um dos objetivos mais ambiciosos do plano é ter 47% de energia final proveniente de fontes renováveis em 2030”.

Quanto maior for o investimento em renováveis, menores serão as emissões geradas pelos automóveis elétricos ao longo do seu ciclo de vida, no processo de carregamento das baterias. Esse é um dos desafios da sustentabilidade que deve levar ao alargamento de medidas como o Fundo Ambiental, a que se devem juntar novas medidas de estímulo da mobilidade elétrica.

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