Primeiro em castelhano, depois em português. “Não poderia o Presidente da República portuguesa deixar de fazer algumas reflexões em português”, gracejou Marcelo Rebelo de Sousa, em Espanha, antes de, num tom mais duro, apontar o dedo ao falhanço global na gestão da pandemia. “A comunidade internacional falhou. Falhou ao descobrir a pandemia tarde de mais. Falhou ao mudar de posição sobre a pandemia várias vezes. Falhou quando grandes poderes do mundo decidiram atuar sós, sem colaboração, com egoísmo, com isolacionismo, dando mau exemplo àquilo que devia ser o multilateralismo perante um problema comum.”
O chefe de Estado falava na Galiza, na II Edição do Fórum “La Toja” — Vínculo Atlântico 2020, onde a pandemia é, este ano, um dos temas centrais em debate. Com esta deslocação à ilha de la Toja, antecedida por um encontro a sós com o monarca espanhol, são já três os encontros entre Marcelo e o rei Filipe VI.
No espaço das 13 semanas que mediaram a primeira e a terceira visita oficial, o Presidente português não visitou qualquer outro país. Depois do encontro com o rei, Marcelo e Filipe VI chegaram ao fórum no mesmo carro.
O último encontro entre ambos foi a 21 de Julho, a convite do rei, em Madrid. Antes disso, a 1 de Julho, Marcelo esteve em Badajoz, na companhia do primeiro-ministro António Costa, nas cerimónias de reabertura da fronteira entre Portugal e Espanha
Marcelo e Felipe VI encontram-se na quinta-feira na Galiza antes do Fórum La Toja
Durante a sua intervenção, o chefe de Estado português destacou ainda as mudanças geopolíticas que aconteceram durante a pandemia de Covid-19: “Vivemos um período de transição, já vivemos o bipolarismo, o monopolarismo, perfeito ou condicionado, vivemos hoje uma mescla, um misto de multilateralismo sem ferramentas, bipolarismo a nascer, e protecionismo e unipolarismo desejado por muito.”
Marcelo considerou que o mundo vive um multilateralismo imperfeito, já que apesar de haver um crescimento de pólos, ele não é acompanhado nas instituições internacionais.
“Vivemos uma crise de multilateralismo quando era tão importante que ele existisse. A pandemia mostrou o fracasso deste multilateralismo imperfeito”, frisou o Presidente português.
O Fórum La Toja pretende ser “um evento de referência no debate intelectual e académico”, em defesa dos “valores da democracia liberal”, e na primeira edição, no ano passado, contou também com a presença do monarca espanhol. O encontra procura também ter “uma representação equilibrada dos diferentes países que compõem o espaço atlântico” e na edição deste ano, de 1 a 3 de Outubro, contará com participações de dois antigos governantes portugueses. Carlos Moedas e Bruno Maçães irão fazer intervenções sobre a digitalização e o futuro pós-covid.