Oito em cada dez mortes associadas à Covid-19 nos Estados Unidos aconteceram em pessoas acima dos 65 anos. 77% dos doentes (de entre uma amostra de quase 17 mil pessoas), que precisaram de ser hospitalizadas com complicações provocadas pelo novo coronavírus tinham excesso de peso ou eram consideradas obesas. A hipertensão é um fator de risco para o desenvolvimento de outras doenças — Covid-19 incluída.

Eis os três principais motivos por que Donald Trump, que esta sexta-feira revelou estar infetado com o SARS-Cov-2, faz parte do grupo de risco — sendo que, com o manto de invisibilidade que o presidente americano tem coberto os seu historial médico, é impossível garantir que não existam sequer outros.

Há cerca de um ano, em novembro de 2019, o presidente, agora com 74 anos, fez uma visita, que não constava da sua agenda pública, ao Centro Médico Militar Nacional Walter Reed, nos arredores de Washington. Examinado ao longo de quatro horas, por uma equipa de 11 médicos, revelou na altura o New York Times, Trump nunca chegou a explicar por que motivo procurou ajuda nem o que mostraram os exames a que foi submetido.

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A informação que continuou a valer foi a revelada meses antes, em fevereiro, pelo seu médico: o presidente está de “muito boa saúde”, garantiu na altura Sean Conley. No ano anterior, através de Ronny L. Jackson, seu antecessor no cargo, o relatório clínico tinha sido mais detalhado mas muito menos ortodoxo: “Chama-se genética. Disse ao presidente que se ele se tivesse alimentado de forma mais saudável nos últimos 25 anos, podia viver até aos 200”.

A alimentação, justamente, será um dos calcanhares de Aquiles de Donald Trump, pouco dado ao cumprimento de dietas prescritas por nutricionistas e planos de exercício físico.

De 107 kg em 2016, o presidente dos Estados Unidos passou este ano para os 110 kg. A 3 de junho foi revelado um curto relatório médico, onde constam idade, altura, peso, pressão arterial, batimentos cardíacos, oximetria de pulso e temperatura — “Após revisão dos sistemas e exame físico, não houve resultados significativos ou alterações a comunicar”, podia ler-se, no fundo da página.

Basta fazer as contas entre a altura, 1,90 metros, e os 110 kg de peso para concluir que Donald Trump é dono de um índice de massa corporal de 30,5 — o equivalente a uma obesidade de grau 1, de acordo com os parâmetros da Organização Mundial de Saúde. Ora, diz o americano Centro de Controlo e Prevenção de Doenças (CDC) — e as autoridades de saúde de todo o mundo —, o excesso de peso triplica as probabilidades de necessidade de internamento e é uma das condições que pode agravar a Covid-19.

A hipertensão será outra e os níveis medidos por Trump há quatro meses não eram os melhores: 121/79, uma tensão arterial ligeiramente elevada que, a juntar aos níveis de colesterol altos que o presidente também tem — e que têm vindo a aumentar nos últimos dois anos, apesar da medicação — pode contribuir para complicações em caso de doença por Covid-19.

Foi Ronny L. Jackson quem, em 2018, recorda agora a CNN, revelou à imprensa que o presidente tinha tido 133 no resultado da angio-TAC às coronárias a que foi submetido. O exame serve para avaliar o grau de obstrução das artérias coronárias, sendo que qualquer valor acima dos 100 revela a existência de placas de aterosclerose, o que significa que o paciente sofre de doença cardíaca. Por muito que, no caso de Trump, o problema seja moderado, será sempre um problema adicional — é sabido que os doentes cardíacos ou apenas com fatores de risco cardiovascular tendem a ser afetados de forma mais grave pelo novo coranavírus.

Apesar de ter passado meses a desvalorizar publicamente a Covid-19, o New York Times garante que Donald Trump, germofóbico assumido, ficou furioso quando, na primavera, o seu camareiro testou positivo — era uma das pessoas com contacto mais próximo com o presidente dos Estados Unidos, que lhe servia as refeições à mesa, na Casa Branca, e que ainda por cima tinha o hábito de trabalhar sem máscara.

Dessa vez, Donald Trump escapou à infeção, que até já tinha começado a tentar combater com a toma não recomendada pelas autoridades de saúde de hidroxicloroquina, o medicamento anti-malária que tantas dúvidas e controvérsia tem provocado ao longo da pandemia.

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Agora, tanto o presidente dos Estados Unidos como a sua mulher, Melania, estão infetados — mas só ele faz parte do grupo de pacientes que mais riscos correm. Como se não bastasse tudo o resto, Donald Trump também é homem — e nos Estados Unidos têm sido os elementos do sexo masculino os mais propensos a sofrer complicações graves e a morrer com Covid-19, recorda a CNN, a partir de um estudo do CDC.

As notícias não são todas más: com um ritmo cardíaco em repouso de 63 batimentos por minuto, Donald Trump goza, aparentemente, de uma excelente saúde cardiovascular — diz a Sky News que a norma entre adultos anda entre os 60 e os 100 batimentos por minuto, sendo que quanto mais reduzido foi este ritmo, melhor —, o que pode ajudar a reduzir os riscos de doença grave provocada pelo novo coronavírus.

Outra coisa que poderá fazer muita diferença e que o presidente dos Estados Unidos também tem garantido, ao contrário de muitos dos mais de 212 mil americanos que já morreram com Covid-19, é o acesso aos melhores cuidados de saúde.