Esta perspetiva sobre a evolução da História Contemporânea de Portugal preconizada por Ferro Rodrigues consta de um artigo por si escrito, intitulado “Implantação da República: de súbditos a cidadãos”, publicado esta segunda-feira no ‘site’ oficial do PS.
O primeiro-ministro e secretário-geral do PS, António Costa, também divulgou esta segunda-feira uma mensagem alusiva à data, mas preferindo recordar uma encíclica papal – a Fratelli Tutti – que apela à força da fé ou das convicções para atingir “uma nova humanidade”.
Ao celebrar a República escutemos a nova e inspiradora encíclica Fratelli Tutti : «sonhemos com uma única humanidade (…) cada qual com a riqueza da sua fé ou das suas convicções, cada qual com a própria voz, mas todos irmãos».#5deoutubro
— António Costa (@antoniocostapm) October 5, 2020
No seu artigo, Ferro Rodrigues – que foi secretário-geral do PS entre 2002 e 2004 – argumenta que “se Portugal é hoje um Estado de direito democrático, baseado na soberania popular, no pluralismo de expressão e organização política democráticas, no respeito e na garantia de efetivação dos direitos e liberdades fundamentais e na separação e interdependência de poderes, deve-o às sementes lançadas na revolução de 1910”.
No dia em que se assinalam 110 anos da implantação da República em Portugal, Ferro Rodrigues considera o 5 de Outubro de 1910 uma “data indelével da História de Portugal, a partir da qual cada português deixou de ser um mero súbdito e se assumiu como cidadão do seu país, tomando nas suas mãos o destino da coisa pública”.
“A instituição de um regime republicano é, antes de mais, o ato de emancipação de um povo. A República não se compreende sem liberdade, sem democracia e sem respeito pelos direitos humanos”, advoga o antigo ministro dos governos liderados por António Guterres entre 1995 e 2002.
Ferro Rodrigues defende depois que “a ordem constitucional republicana, conforme consagrada na Constituição de 1911, é tributária da Declaração Universal dos Direitos Homem e do Cidadão de 1789 e, também, da Revolução Liberal de 1820, que este ano celebra o seu bicentenário”.
“É certo que a realização da República ficou e longe dos ideais mais progressistas proclamados à época. Como em todas as revoluções, as circunstâncias, as contradições e a própria inexperiência dos protagonistas conduziram a opções que não foram as ambicionadas, mas foram as possíveis”, considera.
Ferro Rodrigues reconhece que a revolução de outubro de 1910 “teve uma história conturbada, decorrendo sob o espetro da ameaça permanente, em que a participação na Grande Guerra [1914-1918], que nunca foi popular, veio acentuar as divergências existentes no seio do regime, constituindo um dos fatores que levaram, a prazo, ao seu fim”.
“Não se pode, contudo, negar o propósito de edificação de uma sociedade mais conforme com o interesse comum e a tentativa de cumprir desígnios indissociáveis do republicanismo, ainda que alguns só tenham tido a sua concretização décadas mais tarde”, refere.
Ferro Rodrigues destaca também como acontecimento “de primordial importância a aprovação da Lei da Separação do Estado das Igrejas, essencial para a materialização do ensino obrigatório, gratuito e laico, mas que encontrou reflexos em áreas tão distintas como a do registo civil obrigatório e a da própria morte, ao atribuir caráter secular aos cemitérios, permitindo o seu acesso a todos os cultos religiosos”.
No mesmo artigo, o antigo líder socialista frisa, ainda, que a “revolução de Abril de 1974, que pôs fim ao interregno da ditadura e devolveu a liberdade, veio aprofundar os ideais republicanos expressos em 1910”.
“Essa é, também, uma das conquistas de Abril”, acrescenta o presidente da Assembleia da República.