O Conselho de Ministros francês declarou, esta quarta-feira, o estado de emergência no país — que tinha terminado a 10 de julho — e que entrará em vigor a partir da meia-noite de dia 17 de outubro, noticiou o jornal Le Figaro. Esta quarta-feira, o Presidente francês Emmanuel Macron deu uma entrevista aos canais TF1 e France 2, durante 45 minutos, para falar sobre as medidas de combate à pandemia de Covid-19.
“Estamos numa situação preocupante que justifica que não estejamos inativos nem em pânico”, disse Macron no início da entrevista. “Não perdemos o controlo”, assegurou o Presidente francês, apesar de, ao mesmo tempo, admitir que a sobrecarga nos serviços de saúde é preocupante.
O Presidente francês aproveitou a entrevista para anunciar as primeiras medidas para conter a disseminação do vírus: a região da Ilha de França (Île-de-France), onde se localiza Paris, e oito metrópoles (Grenoble, Lille, Lyon, Aix-Marseille, Rouen, Toulouse e Montpellier) vão ter um recolher obrigatório entre as 21 horas e as 6 horas durante quatro semanas. Macron espera poder alargar estas medidas por mais duas semanas, até dia 1 de dezembro. Quem não cumprir vai ser multado no valor de 135 euros e se voltar a violar as regras pagará 1.500 euros.
Mas muitas das medidas vão cair mais no campo das recomendações e da responsabilização individual e coletiva. Emmanuel Macron não prevê impedir as viagens entre regiões, nem tão pouco impedir que as pessoas vão de férias ou passar o fim de semana fora, mas pede “que se respeitem as regras nas semanas e meses que aí vêm”. Incluindo usar máscara, mesmo nos encontros em família, ou não juntar mais do que seis pessoas à mesma mesa ou num convívio próximo. “Não vamos controlar todos os comportamentos”, disse o chefe de Estado, que também não se vê a dar lições de moral aos mais jovens.
O teletrabalho será recomendado, pelo menos dois ou três dias por semana, mas não será imposto na generalidade porque há pessoas que podem sofrer com o isolamento e que não terão condições para estar a trabalhar a partir de casa.
As falhas no combate à segunda onda
Esta terça-feira, foi conhecido um relatório preliminar pedido pelo Presidente Emmanuel Macron à gestão da pandemia. A equipa de cinco especialistas liderada por Didier Pittet indicou que houve “uma manifesta falta de antecipação, preparação e gestão” no que diz respeito aos aspetos relacionados com a saúde, reportou o jornal Le Figaro. Entre as principais falhas nas decisões tomadas nos últimos meses estão a disponibilidade das máscaras, a realização de testes de rastreio, a coordenação entre os vários agentes de saúde pública e a diminuição da importância dada às medidas de prevenção.
Na entrevista aos canais TF1 e France 2, Macron admitiu que houve atrasos nos testes, das filas para os realizar, ao tempo de espera pelos resultados. Mas os testes continuam a estar no centro das prioridades — testar, alertar, proteger, refere o chefe de Estado —, daí a aposta nos testes rápidos de antigénio, que podem dar resultados em 15 ou 30 minutos.
Entre as grandes medidas falhadas está a aplicação StopCovid, admitiu Macron. “Não funcionou. Foi descarregada muito menos vezes do que entre todos os nossos vizinhos.” A desejada ferramenta de alerta não o chegou a ser, à semelhança do que está a acontecer em Portugal. Agora, o Presidente francês anuncia outra aplicação, Tous Anti-Covid, que vai ter informação sobre como o vírus circula e onde as pessoas podem fazer os testes.
“Estamos numa segunda vaga forte”, avisou o primeiro-ministro francês, Jean Castex, numa entrevista à France Info, esta segunda-feira de manhã. “Peço a todos, de forma extremamente clara, que se mobilizem para enfrentar esta segunda vaga [da pandemia de Covid-19]. Não pode haver mais relaxamento [das medidas preventivas].”
Os avisos e apelos chegam depois de uma semana em que França bateu, consecutivamente, os recordes diários de novas infeções: mais de 18 mil na quarta e quinta-feira, 20.339 na sexta e 26.896 no sábado — o valor mais alto desde o início da pandemia —, e depois de os números terem descido alguns dias, esta quarta-feira voltou a subir para 22.591.
O recorde não se fica só pelo número de novos casos em cada 24 horas, mas também na percentagem de testes positivos por cada bateria de testes realizados. Atualmente, a taxa de testes positivos está nos 12% — sempre a subir desde setembro — contra os 2,1% registados a 20 de maio. Na cidade de Paris e arredores a situação é ainda pior, com a taxa de testes positivos a chegar aos 17%, noticiou o jornal The Guardian.
Jean Castex rejeita que a causa desta segunda vaga tenha sido um desconfinamento mal conduzido em maio, diz antes que foi o comportamento dos franceses que determinou a atual situação. “Os franceses acharam que tinha acabado, consideraram demasiado rápido que o vírus tinha desaparecido.”
Para o primeiro-ministro, terá de ser o comportamento dos cidadãos a mudar a situação. Mas não só. O governo prepara-se para implementar as medidas que forem necessárias para diminuir os contágios e reduzir a pressão sobre os serviços de saúde que já tinham cerca de 30% dos camas dos cuidados intensivos ocupadas com doentes Covid-19 — um total de 1.664 doentes na quarta-feira, valor mais alto do que em maio. O número de doentes hospitalizados também continua a aumentar, com 7.976 registados no sábado.
“O confinamento geral deve ser evitado por todos os meios”, disse Jean Castex. “[Mas] nada poderá ser excluído.”
O confinamento regional ou as medidas restritivas aplicadas consoante a gravidade da situação nunca foram descartadas e podem ser implementadas pelas autoridades locais. Só na Ilha de França (Île-de-France), a região administrativa francesa com mais população — 12 milhões de habitantes — tem quase metade das camas nos cuidados intensivos ocupadas com doentes Covid-19, refere o jornal Le Figaro. Nas zonas mais afetadas, além do recolher obrigatório, pode ser determinado o encerramento de alguns estabelecimentos ou limites à circulação.
A “bolha social”, em que os franceses poderiam escolher um conjunto de pessoas com as quais pudessem conviver, foi outra das medidas em cima da mesa. Não haveria uma lista oficial, mas ficaria, sobretudo, à responsabilidade do comportamento de cada um, refere o jornal Le Figaro. As dúvidas sobre esta medida e sobre a incapacidade de controlo da mesma residem no facto de até a restrição de ajuntamentos com 10 pessoas no máximo ter falhado. Agora, as recomendações é de ainda menos pessoas, apenas seis.
A cidade de Paris já estava em alerta máximo e Marlène Schiappa, parte da equipa do Ministério do Interior, afirmou que não está excluída a possibilidade de confinamento nesta e noutras cidades. Em alerta máximo está também Marselha e quatro outras cidades e, desde esta semana, Montpellier e Toullouse, noticiou a France 24. Nas cidades em alerta máximo fecharam-se bares, cafés e ginásios, e impuseram-se restrições aos restaurantes.
O primeiro-ministro francês assegura que têm trabalhado com as autoridades locais para implementar medidas de contenção do vírus, mas acrescenta que nas áreas lideradas por partidos ecologistas não tem sido fácil. “É com os presidentes de câmara [dos partidos] ecologistas que temos as maiores dificuldades e que são os mais negacionistas”, disse, citado pelo Le Figaro.
Atualizado às 20h40 com as declarações de Emmanuel Macron