O Sindicato dos Magistrados do Ministério Público (SMMP) reuniu-se de urgência esta terça-feira para analisar a nova diretiva da Procuradoria Geral da República (PGR), tendo no final manifestado estar frontalmente contra. O SMMP considera que a nova diretiva “não reconhece qualquer autonomia técnica e tática aos titulares dos processos” e permite “a interferência dos superiores hierárquicos”. Em comunicado, foi ainda anunciado que, face à “gravidade da situação”, a direção do sindicato vai solicitar uma audiência com o Presidente da República e com os grupos parlamentares, assim como convocar uma assembleia extraordinária de delegados sindicais.

Na origem desta tomada de posição, está a diretiva da Procuradora Geral da República, Lucília Gago, que diminui o papel dos titulares dos processos e possibilita superiores hierárquicos de influenciarem as investigações ordenando, por exemplo, a “realização de diligências” ou impedindo “que as mesmas se efetuem”. A ordem também prevê que os magistrados informem o chefe de todos os “atos processuais relevantes que tenham, ou se preveja venham a ter, especial repercussão pública”.

O Sindicato está contra e defende que são os “titulares dos processos que melhor conhecem o mesmo” e que “eventuais intervenções hierárquicas apressadas”, como aconteceu no processo de Tancos, podem “comprometer ou fragilizar as investigações”.

Em comunicado, o SMMP revela que a diretiva não é “compatível com o conceito de Ministério Público como uma Magistratura e viola frontalmente o Estatuto do Ministério Público”. Além disso, reafirma o papel da “efetiva independência e autonomia do Procuradores”, que vê como um “valor acrescentado para a independência do Sistema de Justiça e uma componente chave do Estado de Direito”, que podia estar comprometido com a nova diretiva, uma vez que “abre a porta à interferência política na investigação criminal” . 

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O sindicato lança ainda várias críticas à liderança de Lucília Gago. No seu entender, a procuradora quis substituir-se ao “legislador, subvertendo por completo o equilíbrio que se pretendeu alcançar através das normas processuais penais”. “Não podemos aceitar viver num Estado em que a Senhora PGR pensa que ‘a Lei sou eu’”, avisa o SMMP.

A liderança não se impõe pelo recurso à força, pela adoção de soluções ilegais e pelo isolamento relativamente aos pares. Pelo contrário, a liderança exerce-se pela motivação, convergência de esforços e união da instituição, o que verificamos não estar a ocorrer”, lê-se em comunicado.

O SMMP denuncia ainda “o silêncio ensurdecedor” do Ministério Público em relação a “questões relevantes que surgiram durante o estudo de emergência”

Sindicato do MP reúne-se para analisar luta contra diretiva da PGR

Em declarações à Rádio Observador, o Presidente do Sindicato dos Magistrados do Ministério Público, António Ventinhas, acusou Lucília Gago de desconsiderar o Conselho Superior do Ministério Público, bem como de passar por cima do estatuto do MP e do Código de Processo Penal.

A Senhora Procuradora Geral tem que mudar o rumo que está a seguir até agora, porque não está a conseguir mobilizar a instituição, antes pelo contrário. Está a causar fraturas muito graves dentro do Ministério Público, está a colocar em causa os próprios conceitos do Código de Processo Penal, leis da Assembleia da República, e também as próprias decisões do Conselho Superior do MP”, sublinhou.

O magistrado reiterou também que no entender do sindicato a diretiva emitida pela PGR é “ilegal” e que com este documento se corre o risco de abrir a porta à interferência política no controlo das investigações criminais.

Até agora cada magistrado tinha autonomia na decisão relativamente aos processos que investigava, mas agora [a diretiva] permite a própria emissão de ordens, designadamente não constituir arguidos; não se realizarem buscas; não se realizar a inquirição de testemunhas. Este é um cenário que levará a uma intervenção muito maior por parte das hierarquias, como é o caso da PGR que é nomeada politicamente”, esclareceu António Ventinhas.

Sobre a solicitação da audiência com o Presidente da República, o Presidente do SMMP diz que esta é para avançar uma vez que “está em causa o regular funcionamento do Ministério Público, porque o que esta diretiva faz é transformar os magistrados do MP num serviço da Senhora Procuradora Geral da República”.

Sindicato dos Magistrados do MP: “A PGR tem de mudar o rumo que está a seguir”

Já relativamente à eventual convocação de uma greve, António Ventinhas preferiu não adiantar já esse cenário, mantendo a esperança de que “impere o bom senso” nos futuros desenvolvimentos, apesar de confirmar que será convocada, para o início de janeiro, uma assembleia de delegados sindicais para analisar a questão.