Um acordo secreto, até agora nunca confirmado, validou a colaboração formal entre o Estado Novo e os regimes segregacionistas da África do Sul e Rodésia, em 1970, segundo o historiador Vicente de Paiva Brandão.

“Alcora” é o nome da aliança militar secreta entre Portugal, África do Sul e Rodésia (atual Zimbabué), para combater os movimentos independentistas na África Austral.

“O enfraquecimento dos movimentos de libertação que combatiam as forças portuguesas em Angola e Moçambique interessava manifestamente à África do Sul“, afirmou o historiador, recordando que Pretória enfrentava também resistência semelhante na Namíbia.

“Lisboa e Pretória organizaram-se à época para evitar que África fosse um espaço disputado pelas duas superpotências, que tinham discursos anticoloniais, desde que o resultado das lutas os favorecesse”, explicou o professor-auxiliar da Universidade de Cabo Verde e que se dedicou a estudar estes acordos.

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Portugal e África do Sul olhavam para a guerra colonial como uma forma de manter “valores civilizacionais e pró-ocidentais no continente africano”, salientou.

Com a independência do Congo Belga, atual República Democrática do Congo, são criados campos de treino para os guerrilheiros que combatiam os regimes do apartheid e salazarista.

Os sul-africanos olhavam Angola e Moçambique como “vanguarda de defesa do seu próprio país e do regime”, pelo que promoveram “partilha de informações e apoio militar”, que resultou mesmo na cedência de equipamento.

Isto é tudo muito camuflado e há sempre a tentativa que nunca seja conhecido do grande público. Portugal não queria estar associado a um Estado onde vigorava o apartheid e ao mesmo tempo a África do Sul não pretendia estar associado a um Estado considerado colonialista”.

Paiva Brandão descobriu este acordo após uma “investigação em Oxford a partir das conexões rodesianas, nomeadamente a partir do momento em que há uma rutura de relações entre Ian Smith (primeiro-ministro) e a Grã-Bretanha”.

O acordo foi celebrado em 14 de outubro de 1970, mas a designação oficial foi de “exercício”, para camuflar o alcance diplomático do documento.

O objetivo do acordo era “investigar os processos e meios de conseguir um esforço coordenado tripartido entre Portugal, a República da África do Sul e a Rodésia, tendo em vista fazer face à ameaça mútua contra os seus territórios na África Austral”, lê-se no livro, publicado pela Casa das Letras.

Após 1975, Pretória “ressentiu-se imenso dos processos de independência” de Angola e Moçambique, que passaram a ser palcos de formação de quadros que iriam depois desestabilizar os regimes segregacionistas, na década de 1970 e 1980, culminando na ascensão de Robert Mugabe na Rodésia, independência da Namíbia e democratização da África do Sul.