Criação de canais de denúncia de suspeitas de corrupção ou irregularidades por parte dos juízes, alargamento da possibilidade de suspensão de magistrados judiciais envolvidos em investigações criminais ou disciplinares, investigação preventiva pelo conselhos superiores de eventuais sinais exteriores de riqueza dos magistrados judiciais e proibição de regresso à magistratura dos juízes que exerçam cargos políticos.
Estas são as principais propostas da Associação Sindical de Juízes Portugueses para um reforço da transparência e integridade da magistratura judicial e uma resposta às consequências negativas da Operação Lex para a imagem dos tribunais. A direção da ASJP liderada pelo desembargador Manuel Ramos Soares já propôs aos conselhos superiores da Magistratura e do Tribunais Administrativos e Fiscais que estas ideias sejam discutidas em plenário daqueles dois órgãos de gestão e disciplinar mas ainda não obteve resposta.
Canais de denúncia e investigação preventiva de sinais exteriores de riqueza
Todas as propostas da direção liderada pelo desembargador Manuel Ramos Soares estão sustentadas em diretivas da União Europeia ou em recomendações do Grupo de Estados Contra a Corrupção (GRECO) do Conselho da Europa. É o caso da criação de um canal de denúncia para os cidadãos reportarem suspeitas de “atos corruptivos suscetíveis de responsabilidade disciplinar”.
A ASJP defende que seja garantida a “proteção de identidade” dos cidadãos que denunciem as suas suspeitas de forma a combater o receio de represálias e que os resultados das denúncias, independentemente do arquivamento ou acusação disciplinar, sejam publicitados.
A direção da ASJP propõe igualmente que os “sinais exteriores de riqueza” dos juízes que representem uma incongruência com os seus rendimentos possam ser investigados pelos conselhos superiores através de “mecanismos preventivos de auditoria oficiosa” assente nas declarações de rendimentos, património e interesses apresentadas pelos juízes”. Tudo com o objetivo de serem verificadas “eventuais incongruências patrimoniais.”
Na mesma linha, a associação sindical defende que seja imposto no Código de Conduta o “dever ético dos juízes reportarem aos órgãos próprios os contactos ou atos de terceiros percecionados como tentativas ilegítimas de influência no exercício da função jurisdicional.” Caso não o façam, essa omissão pode agravar eventuais responsabilidades disciplinares.
Alargamento dos prazos de suspensão e proibição de juízes ‘políticos’ regressarem à magistratura
A direção liderada por Manuel Ramos Soares propõe igualmente o alargamento do prazo da suspensão preventiva de juízes arguidos em processos disciplinares “por infracção muito grave relacionada com actos corruptivos” e desde que a “a continuidade no exercício de funções seja incompatível com a manutenção da confiança no sistema de administração da justiça.” Mais uma alusão à Operação Lex em que, recorde-se, o desembargador Rui Rangel regressou ao Tribunal da Relação de Lisboa quando terminou a sua suspensão preventiva sem que o Conselho Superior da Magistratura não pudesse fazer. Mais tarde, o órgão de gestão e disciplinar dos juízes expulsou Rangel antes do Ministério Público deduzir acusação contra si e a sua mulher.
A proposta da ASJP abrange a possibilidade de antecipação de tal suspensão para o “momento da notificação da acusação do Ministério Público” e enquanto estiver pendente o “processo crime em que sejam visados magistrados” em exercício de funções ou em comissão de serviços como titulares de cargos políticos e altos cargos públicos. Os visados por essa medida têm sempre a hipótese de impugnar judicialmente tal suspensão, apesar de tal impugnação não ter efeito suspensivo.
O reforço do escrutínio internos dos juízes, que é a base das propostas da ASJP, é também percetível na defesa de que os “padrões éticos de comportamento estabelecidos no Código de Conduta” sejam tidos em conta nas inspeções que os conselhos superiores realizarem aos magistrados, de forma a que seja possível a “verificação das condições de integridade pessoal para o exercício do cargo dos juízes de direito e desembargadores.
Por último, a associação sindical propõe que seja proibido o regresso a funções judiciais dos magistrados que exerçam cargos políticos no Poder Executivo ou no Poder Local e regressa a uma proposta há muito debatida na judicatura portuguesa: restringir as autorizações para comissões de serviço em órgãos não judiciais.
Tendo em conta que os conselhos superiores têm de autorizar a tomada de posse de juízes em qualquer órgão público e privado, a ideia da ASJP passa por ‘apertar a malha’ nas comissões de serviço e impedir a nomeação de magistrados judiciais para cargos que “impliquem o estabelecimento de relações de confiança ou dependência de interesses de natureza política, económica, empresarial, desportiva ou outra, incompatíveis com a percepção pública de independência e imparcialidade da justiça.”