À mesma hora em que o AC Milan tentava defender (sem sucesso) a invencibilidade na Serie A frente à Juventus, num duelo entre internacionais A e Sub-21 portugueses em San Siro com Rafael Leão e Diogo Dalot de um lado e Cristiano Ronaldo do outro outro, Marcelo Rebelo de Sousa, presidente da República e candidato a novo mandato, e André Ventura, líder do Chega e também ele candidato, tinham um dos debates mais aguardados na antecâmara da campanha até às eleições de dia 24. O início até foi relativamente pacífico até Ventura, que antes tinha feito a distinção entre as posturas de Marcelo e outras candidatas como Ana Gomes ou Marisa Matias, puxar de uma fotografia do presidente da República, em fevereiro de 2019, numa visita relâmpago ao Bairro da Jamaica.
“Gostava de mostrar ao candidato Marcelo Rebelo de Sousa esta fotografia, que mostra tudo o que a minha direita não é. Juntou-se com bandidos, um deles é um bandido verdadeiramente, que tinham atacado uma esquadra policial e quando o presidente Marcelo Rebelo de Sousa foi visitar o Bairro da Jamaica foi visitar os bandidos, não foi visitar as polícias. Eu represento a direita que nunca vai deixar as polícias e as forças de segurança. Só tirou a fotografia à bandidagem. Não tenho medo de ser politicamente incorreto, de chamar os nomes que têm de ser chamados e o que tem de ser dito”, apontou André Ventura sobre uma visita que, na altura, levou Marcelo Rebelo de Sousa a explicar que teve como objetivo “combater um clima de guerra racial num bairro tão português como os outros”: “Quando estou na rua em contacto com portugueses, não peço cadastro criminal nem fiscal”, destacou.
“Não lhe admito”. O dia em que Marcelo desceu à terra para atacar a “direita” de Ventura
“A minha direita é uma direita social, que não distingue os portugueses entre os bons e os bandidos, e que com os bandidos não nos damos, e que não vamos a bairros de bandidos. Isso é o contrário da inclusão, isso é o contrário do que deve ser um candidato presidencial. O separar logo bons e maus, ainda ninguém foi condenado, e fui lá mostrar que o presidente da República não tem medo de ir a qualquer dos bairros, como vai a ciganos, a africanos, de europeus, aos mais variados, e vai sem discriminar. Não disse nada sobre o que se tinha passado, a Jamaica não é um caso de polícia, é um caso social, de injustiça social e o presidente da República não se pode divorciar disso (…) Eu sei o que é que chefes de Estado de países com pessoas naturais de lá, cabo-verdianos, angolanos, ciganos, o que é que me disseram e o que se pensou sobre Portugal. E fui eu que lhes disse que não, que não discriminamos, nós incluímos, nós integramos”, respondeu o atual presidente da República.
As selfies de Marcelo na “visita-relâmpago” ao bairro da Jamaica
Esse acabou por ser um dos pontos mais quentes do debate entre ambos na SIC e que continuou a merecer comentários nas horas seguintes, incluindo quem hoje vive fora do país e não acompanhou o diálogo em direto. Mas nem isso fez com que Rafael Leão, que antes de chegar ao AC Milan jogou nos franceses do Lille em 2018/19 após ter feito toda a formação no Sporting, condenasse aquilo que considera ser a injustiça das palavras de André Ventura. “Por ser um bairro social não quer dizer que toda gente seja um bandido, antes de ser bandido são pessoas, são humanos independentemente da cor!!”, escreveu o jovem avançado na sua conta oficial no Twitter, acompanhado do vídeo onde o líder do Chega aponta o dedo à “bandidagem” do bairro onde cresceu.
Por ser um bairro social não quer dizer que toda gente seja um bandido , antes de ser bandido são pessoas , são humanos independentemente da cor !! https://t.co/hizVxV4M47
— Rafael Leão (@RafaeLeao7) January 6, 2021
Já antes, em maio, Ricardo Quaresma, internacional português que teve uma longa carreira no estrangeiro antes de regressar aos 36 anos a Portugal para representar o V. Guimarães, tinha feito duras críticas a André Ventura pelos comentários relativos à comunidade cigana, sendo depois muito elogiado por várias forças com assento na Assembleia da República e pelo próprio primeiro-ministro, António Costa.
“Triste de quem tenta ser alguém na vida atirando os homens uns contra os outros. Quando um homem se ajoelha na frente de Deus devia olhar para Deus com o mesmo amor com que Deus olha para nós, sem distinção de raça ou cor. Triste de quem se ajoelha só para ficar bem na fotografia, para enganar os outros e parecer um homem de bem aos olhos do povo. A Seleção Nacional de futebol é de todas as cores, pretos, brancos e até ciganos. Em todos bate no coração a vontade de dar a glória ao país e no momento de levantar os braços e celebrar um golo acredito que nenhum português celebre menos porque o jogador é preto, branco ou cigano. Eu sou cigano. Cigano como todos os outros ciganos e sou português como todos os outros portugueses e não sou nem mais nem menos por isso”, começou por destacar o antigo jogador de Sporting, Barcelona, FC Porto, Chelsea ou Inter.
Quaresma ataca “vozes de burros” de Ventura, “como homem e cigano”
“O populismo racista do André Ventura apenas serve para virar homens contra homens em nome de uma ambição pelo poder que a história já provou ser um caminho de perdição para a humanidade. Olhos abertos amigos, o populismo diz sempre que é simples marcar golo mas na verdade marcar um golo exige muita tática e técnica. Olhos abertos amigos, o racismo apenas serve para criar guerras entre os homens em que apenas quem as provoca é que ganha algo com isso. Olhos abertos amigos, a nossa vida é demasiado preciosa para ouvirmos vozes de burros…isto se queremos chegar ao céu”, acrescentou Quaresma na mesma publicação no Facebook.
Figuras públicas e associações repudiam afirmações de André Ventura sobre ciganos