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Afinal, há coincidências. Marcelo passou ao lado de Ana Gomes (mas não parou)

Este artigo tem mais de 3 anos

Ana Gomes foi a Santarém horas antes de Ventura. Falou de touros com aficionados e foi à PSP - porque este não pode ser só tema da "extrema-direita". Em Lisboa, Marcelo passou de carro. Mas não parou.

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DIOGO VENTURA/OBSERVADOR

DIOGO VENTURA/OBSERVADOR

Depois de, esta tarde, ter tido autorização das autoridades de saúde para deixar a sua casa, em Cascais, Marcelo Rebelo de Sousa pegou no carro e fez-se à estrada. Só não contava que, ali, no cruzamento da Ferreira Borges com as Amoreiras, a sua adversária na corrida a Belém estivesse a protagonizar uma ação de campanha a colar um cartaz com o seu rosto no muro à beira da estrada. Dizem que não há coincidências, mas afinal, há. Marcelo passou de carro, sozinho, e Ana Gomes nem viu. Olhou, mas não parou nem acenou, seguiu viagem. Minutos depois, nova coincidência: agora era Rui Tavares, fundador do Livre e apoiante de Ana Gomes, quem passava de carro depois de ter ido buscar o filho à escola. Quatro piscas ligados e dá-se o cumprimento possível.

“Olha, o Rui!!”. Ana Gomes aproxima-se do carro para cumprimentar o ex-eurodeputado e ambos não escondem os sorrisos pela coincidência. Minutos antes, Ana Gomes tinha avançado aos jornalistas que esta quinta-feira iria contar não só com Rui Tavares como também com o apoio de Manuel Alegre no ciclo de conferências online que vai ter diariamente às 18 horas na sua página de Facebook. Um ciclo de conferências que, de resto, arrancou hoje com a mandatária da candidatura Isabel Soares, filha de Mário Soares e Maria Barroso, a explicar porque é que foi “intuitivo” apoiar Ana Gomes e a deixar uma crítica ao PS por se ter demitido de avançar com uma candidatura a Belém: “Não entendo”.

Street art” para os jovens que faz lembrar os tempos do MRPP

“É um estilo jovem, é street art”, comenta Ana Gomes com os jornalistas enquanto um grupo de pessoas termina a tarefa de colar o painel colorido, em tamanho grande, com o seu rosto e o slogan “Portugal é connosco”. O objetivo é esse mesmo: chamar a atenção dos jovens, e das jovens, que por ali passam, em vez de gastar dinheiro com os habituais “outdoors” que, no seu entender não funcionam e servem apenas para agigantar os orçamentos de campanha.

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Ana Gomes estava ao lado, não pegou na “vassoura” que faz a colagem dos painéis no muro, mas o momento trouxe-lhe memórias. “Faz-me lembrar os tempos do MRPP em que colei muito cartaz na parede, e tinha muita prática. Não só fazíamos a cola como há mesmo uma técnica para colar o cartaz, e tenho muita prática disto”, disse ao Observador, recordando os anos 70 em que esteve envolvida nos comités de luta anti-colonial ligados ao MRPP. O painel, da autoria do artista José Albergaria, lá ficou. Marcelo e Rui Tavares já o viram. Agora fica para os demais que por lá passarem.

DIOGO VENTURA/OBSERVADOR

“Há quem me chame candidata cigana”. Ana Gomes antecipa-se a Ventura em Santarém

Antes, Ana Gomes tinha estado em Santarém. Foi um encontro fortuito numa passadeira, no centro de Santarém, enquanto aguardavam pelo sinal verde. “Estou a reconhecê-la”. A abordagem foi de uma mulher da etnia cigana, e Ana Gomes apresentou-se: “Há quem me chame candidata cigana”. Riram-se. A referência era à alcunha que André Ventura lhe chegou a pôr e, por pouco, o diálogo não tinha acontecido justamente quando um carro com bandeiras, altifalantes e fotografias do candidato apoiado pelo Chega parava para as deixar passar na passadeira. Os astros não se alinharam, mas quase. André Ventura vai estar esta tarde em Santarém, quando Ana Gomes já estará de volta a Lisboa, e um carro da estrutura local de apoio ao candidato já ia abrindo caminho.

Ana Gomes tinha acabado de sair do comando distrital da PSP de Santarém quando trocou breves palavras com a senhora que a abordou. Era moradora do bairro do Girão, reformada, mas a família estava a ser prejudicada pela suspensão do trabalho nas feiras devido à pandemia. Sinal verde levantado, é hora de atravessar. “A questão da segurança e da defesa é muito importante para ser deixada para a direita”, diria a candidata aos jornalistas nas declarações após a reunião. É que, disse Ana Gomes, foi o facto de a “esquerda ter desvalorizado as condições das forças de segurança que levou à infiltração de movimentos de extrema-direita nessas mesmas forças de segurança”, atirou. Referia-se não só a Portugal como também ao exemplo do que ocorreu nos EUA, com a invasão ao Capitólio, que teve a cooperação de infiltrados pró-Trump na segurança.

DIOGO VENTURA/OBSERVADOR

“Temos de ter as forças de segurança bem remuneradas, com boas condições, bem treinadas, para estarem motivadas na sua missão”, disse ainda, lembrando que os índices de criminalidade diminuíram com a pandemia mas tem aumentado outro tipo de criminalidade, o crime digital, que implica uma adequação da formação e do treino dos agentes. “É um assunto da maior importância”, disse, recusando seguir as pisadas da “esquerda” e deixar o flanco aberto para a “direita securitária”.

Mas a visita a Santarém serviu para mais do que falar sobre a valorização das forças de segurança. Logo às 10h, Ana Gomes esteve reunida com o presidente da comunidade intermunicipal da Lezíria do Tejo, o também autarca de Almeirim, Pedro Ribeiro, e procurou saber mais sobre os problemas da região e o combate às alterações climáticas que afetam em grande medida o Ribatejo — mais quente até do que a Amareleja no pico do verão.

DIOGO VENTURA/OBSERVADOR

Ana Gomes conduz o próprio carro e, em pleno Ribatejo, questiona autarcas sobre touradas

Chegou a conduzir o seu próprio carro. Ao lado, no lugar do pendura, levava Carlos Vargas, coordenador e assessor da campanha, e o fotógrafo oficial da campanha. Estacionou e pôs mãos à obra. O espaço à volta é irreconhecível para quem está habituado a visitas à famosa feira da agricultura noutros tempos pré-pandemia. Agora está vazio, com portões fechados, mas a sede da Comunidade Intermunicipal está de portas abertas para reunir com a candidata.

[Ouça aqui a reportagem da Rádio Observador]

Ana Gomes “em lides difíceis” na visita a Santarém

Ana Gomes pega num caderno e numa caneta e vai registando os pontos-chave da reunião. Perguntas não lhe faltam. Sobre a interligação da CIM do Ribatejo com a Área Metropolitana de Lisboa (que é “excelente” segundo o autarca socialista Pedro Ribeiro), sobre a aplicação dos fundos europeus que vão ficar em grande medida nas mãos dos autarcas, sobre o episódio da “chacina” de animais na herdade da Torre Bela na Azambuja, onde a autarquia e o governo pouco ou nada puderam intervir, sobre o desafio das alterações climáticas e da transição para uma economia verde e, sobretudo, sobre a tauromaquia.

A pergunta da candidata ainda nem tinha sido formulada e já o autarca de Almeirim e presidente da CIM respondia: “Os 11 presidentes de câmara da região são a favor da tauromaquia”. Sim, mas. Ana Gomes insistiria: “Claro que é preciso preservar a tradição mas há algum pensamento sobre algumas formas de inovação para conciliar isso com a mudança de algumas coisas mais ‘chocantes’?”. A resposta, uma vez mais, saiu seca: “Não”.

Ana Gomes reuniu-se com Pedro Ribeiro, presidente da comunidade intermunicipal da Lezíria do Tejo

DIOGO VENTURA/OBSERVADOR

Seria preciso a intervenção de Francisco Madelino, presidente da Assembleia Intermunicipal da Comunidade e presidente do Inatel, e de Rui Barreiro, ex-presidente da câmara de Santarém e ex-secretário de Estado das florestas do segundo governo socialista de José Sócrates, para enquadrar melhor a resposta. “Esta região foi pioneira em acabar com o touro de morte, mas não há aqui feira que não tenha uma largada. O que não há é tortura do bicho”, diria Francisco Madelino. Pedro Ribeiro lá explicaria melhor o que quis dizer com a primeira resposta direta: “Podia haver evoluções nos espetáculos tauromáquicos mas o extremar de posições faz com que seja tudo ou nada”.

O problema é o “extremar de posições”. E é também contra esse “extremismo” que Ana Gomes tem dito que quer lutar. O dia de campanha prosseguiu com uma reunião com a administração do hospital distrital de Santarém, e continuará em Lisboa. À tarde, troca, e é André Ventura quem pisa terreno fértil em Santarém.

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