A produção de abacate uma área superior a 100 hectares no concelho de Lagos viola as regras do ordenamento do território e o regime jurídico de avaliação de impacte ambiental, segundo denuncia da organização ambientalista ZERO.

O estudo de impacte ambiental do projeto da empresa Frutineves esteve em consulta pública até esta terça-feira. No entanto, e como o próprio documento reconhece, quando o estudo foi elaborado a “plantação dos abacateiros e o sistema de rega já se encontravam concluídos. Estas intervenções decorreram entre junho de 2018 e agosto de 2019”, destacando contudo que todos os sobreiros dispersos na área de intervenção do projeto foram mantidos. A exploração que inicialmente tinha citrinos deverá garantir a primeira colheita de abacates este ano,

Segundo a ZERO, as intervenções envolveram a remoção de coberto vegetal, despedrega e intervenções em linha de água e modelação de terrenos numa área que evolve 128 hectares que deveria ter sido previamente submetida a uma autorização ambiental. “O facto de a plantação exceder os 100 hectares e ter lugar em terrenos agrícolas não utilizados há mais de cinco anos torna esta avaliação como uma condição prévia à intensificação agrícola”.

Em comunicado, a associação ambientalista refere que no “âmbito da afetação de áreas de Reserva Ecológica Nacional o projeto insere-se parcialmente em áreas classificadas como áreas máximas de infiltração e áreas de risco de cheia”. A referida exploração, localizada nas freguesias da Luz e Bensafrim e Barão de São João (concelho de Lagos) está localizada em espaços agrícola de conservação e agroflorestal não são compatíveis com a instalação desta plantação. A Zero refere igualmente que foi alterado o leito e destruídas galerias ribeirinhas de várias linhas de água na ribeira de Espiche, o que representa uma infração à Lei da Água.

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Associação ambientalista “não percebe” porque autoridades não impediram trabalhos

No estudo de impacte ambiental apresentado é referido que em agosto de 2019 a empresa foi notificada pela CCDR (Comissão de Coordenação do Desenvolvimento Regioal) do Algarve da acusação no processo de contraordenação instaurado na sequência de uma ação de fiscalização nas áreas inseridas em REN em que decorriam trabalhos de preparação do terreno para a plantação dos abacateiros. No entanto, a Zero denuncia a passividade das autoridades.

Para além de se desconhecer o resultado deste processo, “não se percebe como é que as entidades públicas responsáveis pela fiscalização em matéria de uso e ocupação do solo, nomeadamente a CCDR Algarve, Direção Regional de Agricultura e Pescas e também Câmara Municipal de Lagos, não impediram o decorrer dos trabalhos ilegais ao ponto de permitirem, ao promotor do projeto, a instalação de estruturas de produção sem uma salvaguarda dos bens públicos e ambientais que só a posterior estão a ser analisados, ou seja, quando a ação preventiva já não é possível”.

Segurança alimentar ou pressão sobre recursos de água em zona de alto risco de seca?

A associação questiona o argumento usado pelo estudo de que a produção de abacates contribui para a segurança alimentar. O documento em discussão pública sublinha “que o projeto contribui para a segurança alimentar no nosso território, aspeto de grande importância em especial a longo prazo num contexto de agravamento dos efeitos das alterações climáticas na região e no País.”

O abacate é um dos produtos estrela da alimentação dita saudável, também muito usado em dietas vegetarianas.  Inicialmente importado, o cultivo intensivo do abacate tem vindo a crescer em Portugal, sobretudo com o recurso a rega. No entanto, muitas destas produções situam-se em regiões onde o risco de seca tem vindo a subir, como o caso do Algarve. “Não se pode compreender que se opte pela expansão da monocultura intensiva do abacate numa altura onde é manifesta a crescente escassez de água esta região”. Segundo a Zero, a exploração em causa capta água para rega a partir de dois furos, mas a pressão sobre os aquíferos da região pode aumentar.

Considerando inaceitável que as ilegalidades cometidas se limitem à aplicação de uma coimas (neste caso se segundo o jornal Público foi de 12 mil euros), a Zero defende que a declaração de impacte ambiental deve ser desfavorável e que a aplicação de uma contraordenação muito grave deve ser acompanhada pela sanção acessória que obrigue a repor a situação anterior à infração e à minimização dos seus efeitos.