Desde há mais de duas décadas que o processo não mudou muito. Abre-se o site do motor de pesquisa da Google, escreve-se o que se quer encontrar e, por norma, aparecem as hiperligações dos sites mais relevantes. Contudo, como anunciou a empresa esta terça-feira no Google I/O — a conferência anual da empresa para programadores –, onde são anunciadas as principais novidades de software, este processo vai mudar: brevemente, a empresa vai passar a mostrar “mais contexto” antes de um utilizador abrir uma hiperligação. O objetivo é combater a desinformação. Contudo, em Portugal, esta funcionalidade não vai aparecer já.
Como explicou na segunda-feira, Pandu Nayak, vice-presidente da Google para pesquisas, numa conversa com jornalistas na qual o Observador participou, “desde o início” que o objetivo da empresa é tentar “fazer que o motor de busca entregue os resultados relevantes das fontes mais relevantes”. Para isso, a Google tem aprimorado o algoritmo e, “nos últimos anos”, tem oferecido ferramentas para ajudar os utilizadores nas pesquisas. Agora, a empresa dá um passo em frente e, antes de um utilizador abrir algumas hiperligações, carregando nos três pontos ao pé do resultado, surgirá uma sub-janela dentro do separador do navegador de internet, ou da aplicação usada, na qual a empresa fornecerá mais “informação de contexto” para ajudar neste processo.
Prabhakar Raghavan vice-presidente sénior na Google, explicou na apresentação desta terça-feira que tudo é feito para a missão da Google para mostrar “resultados mais eficientes”. Para esta nova opção, o responsável da Google falou também do novo sistema MUM (siglas Multitask Unified Model), que permite ao algoritmo fazer conexão de palavras de forma ainda mais rápida).
Como exemplo deste avanço, explicou que o motor de pesquisa consegue responder de forma mais eficiente até a perguntas vagas. E explicou que o “MUM consegue juntar informação em várias línguas”. “Tudo isto faz parte da nossa demanda para ter informação útil”, adiantou. “É nestes momentos [como a pandemia], que as pessoas se viram para a Google”, explicou ainda Raghavan.
Na prática, a Google está a fazer no seu motor de pesquisa aquilo que o Facebook começou a fazer na sua rede social. As hiperligações para sites que possam tocar em temas mais sensíveis, passam a ter um aviso de “contexto”, que direcionará para, por exemplo, plataformas de fact-checking [artigos de revisão de notícias que possam ser ou não falsas] acreditadas pelas Google se o utilizador assim o pretender fazer antes de ir para a hiperligação. Mesmo assim, Nayak lembra que “também há situações em que informações fiáveis simplesmente não estão disponíveis”. Nesses casos, o motor de pesquisa continuará a funcionar como até agora.
O “About this result” [“Sobre este resultado”, em português, o nome da funcionalidade] vai ser lançado em todos os países de língua inglesa já este mês, como os EUA. Ou seja, mesmo que use o Google em inglês, se o computador estiver em Portugal, ainda não poderá experimentar esta nova funcionalidade, explicou Nayak. A Google explica ainda que este processo não vai ser implementado em todas as hiperligações porque, simplesmente, não é possível dar o contexto para tudo. “O index da Google [lista de websites que a empresa tem listados para as pesquisas] tem 100 milhões de gigabytes, se fosse impresso em livros e amontoado em pilhas, dava para ir à Lua e voltar 12 vezes”, justifica Nayak.
Quanto ao processo utilizado para encontrar informação de contexto para cada hiperligação, Nayak começou por dar o exemplo de uma notícia do The Guardian, de 2016, na qual foi relevado que “a Google não estava a oferecer um serviço de qualidade aos utilizadores”, como explicou o responsável. Nesse artigo, o jornal britânico expôs que se uma pessoa pesquisasse a pergunta “O Holocausto aconteceu”, apareceria no topo dos resultados “propaganda neo-nazi”. Depois, e devido à falta de uma resposta direta da Google quanto a esse problema, um dos jornalistas percebeu que, com pouca experiência em informático, podia fazer o mesmo que grupos neo-nazis fizeram e mudar que resultado aparece no topo em temas como este.
O caso tornou-se polémico e levou a Google a fazer mudanças no algoritmo para tentar não ter resultado antissemitas. O problema, contudo, é que a Google não pode, teoricamente, promover a censura, e o motor de pesquisa pode ser utilizado para se encontrar hiperligações para tudo — mesmo para sites que afirmam coisas falsas como o holocausto não ter acontecido. Assim, e para evitar problemas como este, passa a existir esta nova funcionalidade.
Um motor de pesquisa com 10 mil pessoas a validar se as hiperligações são recomendáveis e que não dá resultados diferentes dependendo da pessoa
Para garantir a maior fiabilidade dos resultados, a Google conta com cerca de 10 mil pessoas contratadas em todo o mundo que, seguindo as normas da empresa, tentam garantir a qualidade dos resultados nas pesquisas feitas pelos utilizadores. O “teste rigoroso”, como lhe chama a empresa, está todo explicado aqui e passa por tentar impedir que todas perguntas que se fazem no Google fiquem sem uma hiperligação. “Todos os dias, 15% de todas as pesquisas da Google são novas”, explica Nayaka.
O Observador tentou saber a percentagem de portugueses destes 10 mil funcionários diretos e indiretos que a empresa contrata, mas não obteve resposta até à publicação deste artigo. A empresa garantiu, contudo, que independentemente das opiniões de quem contratam, que é difícil esta ser explanada nas opções tomadas para restringir certa hiperligação porque as regras que a empresa criou para serem implementes no processo de decisão contemplam a maioria das escolhas.
E uma nota extra que Nayak referiu. Quem acha que a Google oferece um resultado diferente para cada utilizador, poderá estar errado. Como referiu o responsável, “as pessoas acreditam muito que a pesquisa é muito personalizada, mas a verdade é que não é”. De acordo com o Nayak, o algoritmo tem mais em conta os termos utilizados do que a informação que pode ter da conta Google da pessoa. “A verdade é que apenas uma fração muito pequenas dos resultados é que é personalizados”. Onde poderá haver diferença é quanto à geografia. Certos termos pesquisados em Portugal, podem dar resultados diferentes do que se fossem pesquisados em Espanha, por exemplo.
O Google I/O vai decorrer até 20 de maio. Esta terça-feira, além desta novidades, a Google está também a apresentar novas ferramentas de inteligência artificial que quer que os utilizadores utilizem para melhorar as experiências ao usar os serviços da empresa como o Google Lens, o Google Photos ou o YouTube.
*Artigo alterado às 18h22. Onde se lia “tentam garantir que não aparecem hiperligações erradas nas pesquisas feitas pelos utilizadores”, lê-se agora “tentam garantir a qualidade dos resultados nas pesquisas feitas pelos utilizadores” para clarificar o trabalho feito pelos revisores da Google.