Eis um processo que é suposto ter um julgamento rápido e exemplar mas que ainda nem sequer começou e já tem percalços processuais. Para já, o julgamento do ex-líder do Banco Espírito Santo (BES) pode vir a ser adiado de 7 para 14 de junho devido à ausência da contestação da defesa aos factos da acusação do Ministério Público (MP) na Operação Marquês que o juiz Ivo Rosa decidiu seguir praticamente na íntegra.

Está em causa o caso do saco azul do Grupo Espírito Santo (GES) que levou o juiz Ivo Rosa a pronunciar Ricardo Salgado para julgamento por três crimes de abuso confiança por alegadamente ter-se apropriado de cerca de 10 milhões de euros. Este é um dos quatro processos que o magistrado do Tribunal Central de Instrução Criminal decidiu separar dos autos da Operação Marquês e enviar para julgamento.

O Observador tentou contactar a defesa de Ricardo Salgado mas tal não foi possível até ao momento.

Marquês. Ricardo Salgado e Armando Vara já têm julgamento marcado para junho

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O pequeno imbróglio

O possível adiamento nasce de um facto: a defesa de Ricardo Salgado ainda não apresentou a contestação aos factos imputados pelo juiz Ivo Rosa. Porquê? Por uma questão estratégica, a defesa a cargo de Francisco Proença de Carvalho e de Adriano Squilacce está a tentar protelar o início do julgamento desde que Ricardo Salgado foi pronunciado nos autos da Operação Marquês.

Num primeiro momento, a defesa arguiu incompetência territorial do Tribunal Judicial da Comarca de Lisboa para julgar o caso, argumentando que nenhum crime tinha sido praticado em Lisboa e que o arguido tem morada em Cascais — a comarca que, no entender da defesa, deveria julgar o caso. O Ministério Público aderiu à posição da defesa. Mas o juiz Francisco Henriques, que irá liderar o coletivo que julgará Ricardo Salgado, não concordou com esses argumentos e indeferiu a pretensão da defesa e do MP num despacho de 28 de maio, defendendo que o Tribunal Judicial da Comarca de Lisboa tem competência territorial para tratar deste caso.

Como Ricardo Salgado sai (quase) limpo do processo

A dupla Proença de Carvalho/Squilacce voltou ao ataque a 31 de maio arguindo a nulidade da pronúncia de Ivo Rosa — tal como já tinha feito nos autos da Operação Marquês — por alegada ausência de contraditório aquando da decisão de separar os processos. Em resposta, e além de rejeitar as nulidade invocadas pela defesa, o juiz Francisco Henriques definiu o dia 4 de junho como prazo-limite para a defesa apresentar a contestação e a lista das suas testemunhas.

Pormenor importante: o tribunal já tinha definido o dia 7 de junho para a primeira sessão de julgamento. Se assim é, qual é o problema? O problema é que a lei permite uma extensão do prazo original definido pelo juiz Francisco Henriques até ao dia 9 de junho. Para tal, basta pagar uma multa e a extensão do prazo é automaticamente acionada.

É, por isso, bastante provável que a defesa do ex-líder do BES utilize essa extensão do prazo e só apresente a sua contestação e a lista de testemunhas no dia 9 de junho. O que inviabilizá o início do julgamento a 7 de junho e fará com que a sessão que já estava marcada para dia 14 de julho passe a ser a primeira sessão — quando deveria ser a terceira.

Os 189 crimes da Operação Marquês passaram a 17. Quem vai afinal julgamento e por quais?

É provável que o juiz Francisco Henriques tome uma decisão sobre o adiamento da primeira sessão do julgamento na próxima sexta-feira (dia 4 de junho), dia que o próprio magistrado definiu como prazo-limite para a defesa apresentar a sua contestação.

Acrescentada posição do Ministério Público sobre o requerimento de incompetência territorial do Tribunal Judicial da Comarca de Lisboa apresentado pela defesa de Ricardo Salgado à 1h17m do dia 3 de junho.