O Governo britânico anunciou esta quinta-feira que Portugal, incluindo os arquipélagos dos Açores e da Madeira, foi retirado da lista verde do Reino Unido, confirmando assim a notícia avançada pela Sky News e pela BBC. Em resposta, o Ministério dos Negócios Estrangeiros lamentou uma ”decisão cuja lógica não se alcança”.

“Tomamos nota da decisão britânica de retirar Portugal da ‘lista verde’ de viagens, uma decisão cuja lógica não se alcança”, lê-se numa nota publicada pelo Ministério chefiado por Augusto Santos Silva, que garante que Portugal está empenhado no combate à pandemia. “Portugal continua a realizar o seu plano de desconfinamento, prudente e gradual, com regras claras para a segurança dos que aqui residem ou nos visitam”, garante o Ministério dos Negócios Estrangeiros.

O Governo da Madeira, porém, já disse esperar que o Reino Unido separe a região do restante território nacional, mantendo-a na “lista verde” de viagens internacionais, embora o executivo britânico tenha anunciado que a medida se aplica a todo o país. “Estamos com a esperança de que haja o mesmo cuidado que existiu no passado, no que diz respeito à separação entre a Região Autónoma da Madeira e a realidade de Portugal continental”, disse o ministro regional do Turismo e Cultura, Eduardo Jesus, num registo áudio enviado aos órgãos de comunicação social.

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Eduardo Jesus sublinha que a situação pandémica na região é distinta do resto do país, com registo de 150 casos ativos de infeção por SARS-CoV-2, num total de 9.486 confirmados desde março de 2020 e 72 mortos associados à doença.

“Estamos com uma situação perfeitamente contida e com uma tendência muito positiva e esperemos que isso seja tido em conta para que a Região Autónoma da Madeira não seja injustamente considerada como parte da tendência nacional”, declarou.

Variante Delta determinou decisão

A decisão das autoridades britânicas foi confirmada pelo ministro dos Transportes britânico, Grant Shapps, que considerou que retirar Portugal da lista é uma medida de “segurança” para impedir que o Reino Unido tenha de recuar daqui a algumas semanas. Shapps sublinhou que foi uma “decisão difícil”, mas necessária tendo em conta que “o número de casos quase duplicou desta a última avaliação”.

O facto de Portugal estar na lista verde fazia com que os turistas pudessem regressar ao Reino Unido sem terem de ficar em quarentena — o que deixará de acontecer.

Num comunicado citado pela Lusa, o Governo britânico refere que, de acordo com a base de dados europeia GISAID, foram identificados em Portugal 68 casos da variante B1.617.2, identificada pela primeira vez na Índia, denominada pela Organização Mundial de Saúde por variante Delta, “com uma mutação adicional potencialmente prejudicial”. A direção geral de Saúde de Inglaterra (Public Health England) está a investigar esta variante e mutação para perceber melhor se ela pode ser mais transmissível e mais resistente às vacinas.

Os países na “lista amarela” estão sujeitos a restrições mais apertadas, nomeadamente uma quarentena de 10 dias na chegada ao Reino Unido e dois testes PCR, no segundo e oitavo dia, como já acontece com a maioria dos países europeus, como Espanha, França e Grécia. Já a “lista verde” isenta de quarentena os viajantes que cheguem a território britânico, enquanto a “lista vermelha” exige quarentena de 10 dias num hotel designado, além de dois testes PCR.

Na atualização das listas de viagens internacionais publicada, o Ministério dos Transportes britânico adicionou à “lista vermelha” o Afeganistão, Bahrein, Costa Rica, Egito, Sri Lanka, Sudão e Trinidad e Tobago. O Executivo britânico reitera também o apelo aos britânicos para que não viajem para destinos da “lista amarela” de forma a proteger a saúde pública porque a “prevalência de variantes preocupantes e às taxas gerais de coronavírus são maiores”.

O sistema de semáforo é baseado em quatro critérios: as taxas de vacinação, o número de casos, a prevalência de “variantes preocupantes” e a qualidade dos dados de testagem. Após o anúncio de que Portugal sairia da “lista verde” do Reino Unido, as ações das companhias aéreas britânicas caíram.

Decisão “profundamente injusta”, lamenta turismo algarvio

A decisão do Governo britânico foi recebida com preocupação pelo turismo português. Em declarações à Rádio Observador, Elidérico Viegas, Associação de Hotéis e Empreendimentos Turísticos do Algarve, lamentou o que considera uma decisão “profundamente injusta” e “lesiva dos interesses do país”, com graves consequências para o setor.

Elidérico Viegas. “Decisão profundamente injusta e lesiva dos interesses do país”

“Isto vem pôr em por causa as boas perspetivas que tínhamos para este verão, sobretudo por parte da procura do mercado britânico”, lamentou Elidérico Viegas, revelando que o “número de marcações estava bastante acima do que estávamos à espera”, o que fazia antever que “o verão deste ano fosse melhor que o verão de 2020”.

Elidérico Viegas acredita que a decisão ainda possa ser revertida em breve, e mantém confiança de que o verão ainda possa correr bem. No entanto, teme as consequências da decisão do governo britânico.

No mesmo sentido, em declarações à Rádio Observador, o presidente do Turismo do Algarve, João Fernandes, não vê razões que justifiquem esta decisão do executivo britânico.

Portugal fora da lista verde do Reino Unido? “Não há razões para isso”

“Não há razões para a alteração da avaliação de risco em relação a Portugal, até porque Portugal tem avançado no processo de vacinação e tem até acelerado este processo”, afirmou João Fernandes, sublinhando que, no Algarve, “o mercado britânico estava a ter uma procura muito significativa”, uma tendência que deverá mudar nos próximos tempos.

“Obviamente que são esperadas quebras significativas neste mercado, que é o principal mercado externo para o Algarve”, lamentou o presidente do Turismo do Algarve.

Para João Fernandes “é uma decisão que o Governo britânico tomou por uma questão de política interna e não por uma questão de risco”. O responsável frisou que a justificação dada pelas autoridades do Reino Unido “não utiliza Portugal como referência” para as infeções de Covid-19 e até Malta, “que tem uma incidência de nove casos por 100.000 habitantes, ficou de fora” da “lista verde”.

“Estamos já a assistir a uma concentração de voos de repatriamento e a um cancelamento de voos para o período posterior e das reservas também em hotéis. Esperemos que esta medida seja revista o mais rápido possível, porque ela é de todo injusta”, considerou.

João Fernandes disse ainda que o Algarve teve “100.000 movimentos de passageiros de origem britânica durante as duas últimas semanas” e que, segundo dados fornecidos pela Administração Regional de Saúde entre os passageiros britânicos, “houve apenas a registar — e todos eles são testados — seis casos”.

Para o presidente do Turismo do Algarve, a região tem de “olhar para frente e continuar a apostar noutros mercados que estão a ter boa procura pelo Algarve, como os mercados alemão, francês, espanhol irlandês, holandês”, que estão a “reconhecer Portugal como um destino seguro e o melhor destino de praia do mundo, de acordo com o último reconhecimento dos World Travel Awards”.

O representante considera que Portugal pode regressar à “lista verde” na próxima reavaliação do Governo britânico, dentro de cerca de três semanas.

Companhias aéreas também criticam decisão

Além dos operadores turísticos, também os dirigentes de companhias aéreas criticaram o Governo britânico por retirar Portugal da “lista verde”, receando que o setor do turismo continue sujeito a restrições da pandemia Covid-19. “Este último anúncio é mais um retrocesso para o nosso setor”, lamentou o diretor da operadora TUI UK, Andrew Flintham, avisando que “vai causar danos incalculáveis à confiança dos clientes”.

O presidente-executivo da transportadora easyJet, Johan Lundgren, considerou “chocante” a decisão de adicionar Portugal à lista amarela e “uma grande desilusão para aqueles que estão atualmente em Portugal e para aqueles que reservaram um encontro com os seus entes queridos, ou uma merecida pausa neste verão”.

Com taxas [de infeção] portuguesas semelhantes às do Reino Unido, simplesmente não se justifica pela ciência”, acrescentou.

Na sua opinião, “esta abordagem excessivamente cautelosa está a falhar em colher os dividendos do programa de vacinação bem-sucedido do Reino Unido”.

Partidos da oposição apontam dedo ao Governo

O presidente do CDS-PP criticou a decisão “descabida, ingrata e devastadora” do Reino Unido de retirar Portugal da lista verde, um “par de patins” ao Governo português depois de abrir o país para os adeptos ingleses “se divertirem”. Em comunicado enviado à agência Lusa, o líder do CDS-PP, Francisco Rodrigues dos Santos sublinhou que “Portugal serviu para os adeptos ingleses se divertirem na semana passada, mas já não serve para a ‘lista verde’ ingles”.

“O Governo português abriu-lhes as portas a qualquer custo, sem condições e sem planeamento e agora recebe em troca um ‘par de patins’ do Governo inglês”, criticou, considerando a decisão “descabida, é ingrata e devastadora” para o turismo nacional.

Já a Iniciativa Liberal (IL) acusou o ministro dos Negócios Estrangeiros de “falhanço em toda a linha” por ser incapaz de “assegurar uma gestão diplomática eficaz” e prejudicar o turismo, a economia, o emprego e a imagem do país. O ministro Augusto Santos Silva, diz a IL, falhou porque não conseguiu assegurar um gestão diplomática eficaz num momento em que os indicadores de saúde pública melhoraram muito e permitem até que o Governo português tenha decidido, na quarta-feira, aliviar restrições que tinham sido impostas devido à pandemia de Covid-19.

Por seu turno, o Chega considerou uma “decisão trágica” para as regiões turísticas portuguesas o anúncio do Governo britânico de retirar Portugal da “lista verde” de viagens internacionais.André Ventura disse que a a decisão é trágica para o Algarve, “onde muitos dos turistas britânicos já tinham feito reservas e agora estão a cancelar”, mas também trágica “para todo o território nacional, habituado a receber turismo de cidadãos britânicos”. E é ainda, acrescenta, “uma tragédia na confiança que a comunidade internacional deposita em Portugal”.

Autarcas portugueses descontentes com a medida

Mal foi conhecida a decisão do governo britânico, começaram as reacções de descontentamento dos autarcas do Algarve, que é o destino preferencial dos turistas britânicos.

O presidente da Câmara Municipal de Albufeira, José Carlos Rolo, disse à rádio Observador que o número de casos de Covid-19 no Algarve não justifica esta medida e admite que não estava à espera deste recuo do governo britânico. O autarca prevê, por isso, um início de verão mais difícil para os empresários da restauração e hotelaria.

No mesmo sentido, o presidente da Câmara de Olhão, António Pina, confessa também à Rádio Observador que foi surpreendido por esta decisão, até por causa dos avanços no processo de vacinação no país. O presidente desta autarquia prevê dificuldades financeiras para os setores do turismo e hotelaria.

Tal como no continente, a passagem de britânicos pelas regiões autonómas obriga a uma quarentena e à realização de dois testes a partir de terça feira. O secretário de estado do Turismo na Madeira, Eduardo Jesus, critica esta medida e diz que não vê qualquer sentido na alteração. O responsável adianta também que o governo regional da Madeira já mostrou esse descontentamento junto do executivo britânico.

Vários casos de Covid19 de adeptos ingleses reportados por companhias aéreas