Não, comprar um equipamento recondicionado não é o mesmo que comprar um computador ou telefone usado, ainda que também o seja. Confuso? Não precisa de o ser porque, na prática, o que a portuguesa Digiplanet faz é dar uma segunda vida a estes equipamentos, recuperando-os, melhorando-os e disponibilizando-os novamente no mercado a preços mais baixos.
A empresa, que nasceu em 2019 como resposta a um mercado cada vez mais dado ao desperdício eletrónico, viu a procura crescer exponencialmente empurrada pela pandemia, e Portugal tornou-se apenas mais um mercado no meio dos dez países europeus que compõem o portefólio dos clientes. Itália, Espanha, França, Alemanha ou Áustria são outros dos grandes mercados atuais desta empresa que conta com pouco mais de uma dúzia de pessoas.
Mas, para perceber exatamente o negócio, é preciso compreender o que este envolve, e tudo começa num laboratório em Carnaxide.
“Compramos computadores pelo mundo fora, tipicamente usados por grandes empresas que depois os deitariam fora – porque existem contratos tipo leasing para esses equipamentos –, trazemos os computadores para Portugal e fazemos o processo. Isto é feito em duas fases: a primeira em que o computador é recondicionado, a outra em que o computador é adaptado às necessidades do cliente final”, diz Guilherme Portela Santos, cofundador da Digiplanet.
O empresário, que passou pela área da banca, pelas telecomunicações ou pelo grupo Leya, na parte educativa e de publishing, pegou no negócio em 2019 juntamente com o sócio, Manuel Reis, como parte de um projeto dentro do grupo Digiconta (empresa mãe da Digiplanet, fundada em 1976), que antes dos equipamentos recondicionados trabalhava maioritariamente num formato direcionado para empresas (b2b).
“Ficámos com a perceção, eu e o meu sócio, de que o mundo está com uma brutalidade de lixo eletrónico e que as pessoas compram cada vez mais online. É aí que surge a oportunidade de formatar a nossa capacidade tecnológica para pegar em computadores que já tinham uma primeira vida, vindos de grandes empresas, e prepará-los para ficarem melhores. Embarcar num futuro de reutilização ao mesmo tempo que ajudamos as pessoas a ter equipamentos melhores e mais baratos”, acrescenta.
No caso dos computadores, tudo começa com uma inspeção, seguindo-se uma limpeza profunda ao equipamento. Depois, verifica-se se é necessário mudar componentes e, de seguida, são feitas as atualizações necessárias, a instalação do sistema operativo e passa para o período de testes. De realçar que, no entanto, não é possível a customização dos equipamentos, ou seja, tudo o que é incluído no processo de recondicionamento chega de outros equipamentos, não sendo possível um tipo de personalização mais profunda.
Contudo, caso o produto seja enviado para outro país, “pormenores como a disposição do teclado são tidos em conta”, esclarece Guilherme Portela Santos. Tudo isto acontece em dois dias, mediante a disponibilidade do stock.
Por último, o equipamento é posto à venda no site da Digiplanet, sendo o prazo de entrega entre as 24 e as 48 horas para qualquer país da Europa. “Ao estarmos aqui, em Portugal, conseguimos servir a Europa toda em 24 ou 48 horas. O nosso crescimento é só limitado pela nossa capacidade de comprar equipamento”. O cliente tem depois um prazo de 14 dias para devolver o equipamento caso não esteja satisfeito.
“Trabalhamos com a Apple, uma série de marcas, mas o importante é trabalhar com marcas de linha profissional. A maior parte das marcas tem linhas profissionais e pessoais e, quando vamos a um retalhista, a maior parte do que está disponível é pessoal. Nas linhas profissionais, o chassis do computador é mais robusto, os computadores são melhores. Esse é o principal requisito. Temos uma preocupação em assegurar que trabalhamos com linhas profissionais e marcas topo de gama e os nossos produtos têm dois anos de garantia”, explica Guilherme Portela Santos.
A receita para este sucesso passa, segundo Guilherme, pela procura que a pandemia de Covid-19 veio trazer ao mercado da eletrónica, o que para muitos negócios representou a queda ou fecho, acabou por ser um ingrediente importante nesta receita.
“A pandemia trouxe uma enorme necessidade de ter computadores. Nesses casos faz muito mais sentido ir atrás de um computador recondicionado que, por ser mais barato e tipicamente melhor do que encontramos na prateleira, acabou por ter uma procura elevada”, explica.
O empresário refere que ao longo de 2020 a Digiplanet chegou a expedir mais de uma centena de computadores por dia, com escolas e instituições a representar a principal fatia do bolo. “Isso também foi interessante, foi um stress test para a nossa equipa”, acrescenta o cofundador.
O negócio, contudo, e para além de fazer chegar ao consumidor produtos de qualidade, serve também o propósito ambiental e esse foi um dos catalisadores de toda a operação. “Abastecermo-nos na economia circular é uma forma muito importante de poder certificar uma empresa do ponto de vista ambiental”, refere.
“Temos aqui um caso que entendemos que é muito importante, tanto para ajudar as pessoas num momento económico em que precisam de poupar dinheiro e trabalhar a partir de casa como também para ajudar o planeta”, diz.
Guilherme acredita que a questão ambiental deve continuar a ser uma das preocupações do mercado, não só das empresas mas dos consumidores. Para o líder da Digiplanet, há mudanças que se estão a verificar, e metas que espera ver no futuro. “As pessoas têm uma tendência em comprar equipamentos de última geração mas, a verdade é que mais e mais estamos preocupados em pagar algum preço para reciclar. Comprar carros elétricos é um exemplo disso, a preocupação com o ambiente é maior. Cada vez há mais pessoas a reutilizar e com preocupações nesta direção. Cada vez há mais compra de recondicionados”, sublinha.
Para já, a posição geográfica da empresa vai manter-se em Portugal, nas atuais dimensões, mas o plano passa por uma expansão e maior fatia de mercado. A Digiplanet tem, segundo Guilherme, um crescimento previsto de 100% para 2021, mantendo-se na casa dos milhões de euros.
*Tive uma ideia! é uma rubrica do Observador destinada a novos negócios com ADN português.