Um “grito de desespero” foi como o presidente da Associação Portuguesa de Serviços Técnicos para Eventos (APSTE) classificou a manifestação que a associação realizou esta quarta-feira, em Lisboa.
Um grito de desespero face às últimas medidas decretadas pelo Governo que consistem na “obrigatoriedade dos testes [de despiste do coronavírus] só para eventos e espetáculos” já que se trata de uma “medida injusta e ingrata”, lamentou o dirigente da APSTE, Pedro Magalhães.
Iniciado cerca das 16h20, junto ao Marquês de Pombal, o protesto, para o qual os participantes foram munidos de flightcases, as caixas que usam no seu trabalho, reuniu representantes de 170 empresas do setor. Os participantes envergavam ‘t-shirts’ pretas onde se lia “Abandonados” e “Demasiado teimosos para desistir”.
“Chamar a atenção dos nossos governantes para a situação gravíssima que todo o nosso setor se encontra” foi, segundo Pedro Magalhães, o objetivo do protesto silencioso durante o qual percorreram a Avenida da Liberdade, terminando na Praça dos Restauradores.
Para o presidente da APSTE, a obrigatoriedade de realização de testes é mais “uma medida penalizadora” para o setor que tem sido o “mais prejudicado” pela pandemia. “Não estamos contra os testes, estamos de acordo“, disse, sublinhando que esta medida deve, porém, ser aplicada “de uma forma universal para todos os setores”.
Questionado sobre as perdas registadas no setor devido à pandemia, Pedro Magalhães disse não haver ainda números concretos, estimando, todavia, que as perdas registadas ao nível das empresas que têm os equipamentos sejam “muito superiores” a 100 milhões de euros.
Pedro Magalhães lamentou ainda que tenha sido feito “um grande investimento” para a realização de eventos-piloto numa tentativa de “salvarem o verão” e poderem trabalhar. “Agora, no início do verão, temos conhecimento que o processo de tratamento dos dados está atrasado e nem sequer se conhece uma data para a apresentação destas conclusões. O que podemos dizer em relação a isto?”, questionou.
Realizado em passo de marcha, durante o protesto os participantes fizeram ainda ouvir-se murros compassados nas ‘flightcases’ que os acompanhavam.Entre os vários artistas, técnicos e outros trabalhadores do setor da Cultura pontuava Tim, vocalista dos Xutos e Pontapés, que disse à agência Lusa estar no protesto porque esta “também é a [sua] luta”.
“É a nossa luta, de todo o pessoal que trabalha comigo na estrada”, acrescentou Tim, sublinhando que a sua presença visa mostrar que, tal como os seus camaradas, está “descontente e preocupado com a situação” que tem causado “prejuízos enormes e incomensuráveis” no setor da Cultura.
Álvaro Covões, responsável da promotora Everything is New e dirigente da Associação de Promotores de Espetáculos, Festivais e Eventos (APEFE), também marcou presença no protesto, tendo sido um dos manifestantes a encabeçar a fila do protesto. Para Covões, é necessário encontrar formas que permitam que as pessoas do setor que estão sem trabalhar voltem a laborar. E se o Governo diz que um setor não pode trabalhar, tem de estar parado, “então tem de o apoiar”.
“São 17 meses em que a maioria dos profissionais e das empresas do setor não tiveram um único dia de trabalho e mesmo aqueles poucos que conseguiram trabalhar têm que ser solidários com os que não conseguiram trabalhar”, frisou, sublinhando que mais de 80% dos presentes no protesto estão “sem trabalhar há 17 meses“.
“Nós não estamos de mão estendida, nós queremos trabalhar; mas quando um Governo de um país diz a um setor que não pode trabalhar tem que apoiar esse setor”, sublinhou, frisando que os apoios são insuficientes.Álvaro Covões sublinhou ainda que os profissionais do setor, sobretudo os de eventos ao ar livre, viram “matar-lhes o verão“. Uma situação que considera inexplicável já que ao longo de um ano o setor da cultura foi considerado exemplar.
“Este ano estamos a fazer o balanço para 2021, mas atendendo a que estivemos confinados, o país inteiro esteve, confinado nos três primeiros meses do ano e considerando que o verão não aconteceu (porque a nossa regra para espetáculos é exatamente a mesma que estava em vigor em 1 de julho de 2020), portanto, para nós, não houve desconfinamento”, disse.
Por seu turno, Luís Montez, da promotora Música no Coração, que também marcou presença no protesto, considera não haver justificação para se manterem as atuais medidas no setor: “Numa altura em que os grupos de risco já estão vacinados, em que há testes fiáveis e a maior parte da população está vacinada não faz sentido manterem-se medidas tão restritivas que estão a afogar o setor”.
De acordo com o mais recente relatório semanal da vacinação Covid-19, divulgado pela Direção-Geral da Saúde (DGS), mais de metade da população portuguesa (53%) já foi vacinada com pelo menos uma dose, o que equivale a mais de 5,3 milhões de pessoas. Segundo o documento, 5.335.683 pessoas já receberam pelo menos uma dose e 3.295.132 têm a vacinação completa, o que representa 32% da população.
No verão do ano passado, que já decorreu sem os habituais festivais, a Associação Portuguesa dos Festivais de Música estimou uma perda de cerca de 1,6 mil milhões de euros, de impacto do setor na economia, contra os dois mil milhões originados em 2019.
A associação também lamentou que a DGS, com a qual tem tido reuniões regulares desde janeiro, não tenha ainda divulgados conclusões dos eventos-piloto realizados em abril e maio em Braga, Coimbra e Lisboa.
Este mês, a Inspeção-Geral das Atividades Culturais esclareceu que é “obrigatória” a realização de testes à Covid-19 nos eventos culturais, quando o número de espectadores for superior a mil, em espetáculos ao ar livre, e a 500, em espaços fechados.