O Tribunal Geral de Justiça da União Europeia rejeitou a queixa apresentada pela magistrada Ana Carla Almeida no caso da nomeação de José Guerra para a Procuradoria Europeia. O tribunal europeu considerou que o “recurso é julgado inadmissível” e Ana Carla Almeida foi condenada a pagar as despesas judiciais, segundo um despacho do Tribunal de Justiça da UE divulgado esta terça-feira.
Com a queixa apresentada, a magistrada pretendia anular a deliberação do Conselho da União Europeia que, por indicação da ministra da Justiça, Francisca van Dunem, nomeou o procurador José Guerra para a Procuradoria Europeia.
Em comunicado enviado ao Observador, a procuradora Ana Carla Almeida diz que respeita a decisão mas está “profundo desacordo” com a mesma e vai “recorrer de imediato” para a segunda instância.
A magistrada do Departamento Central de Investigação e Ação Penal (DCIAP) diz que o tribunal considerou “extemporâneo o meu pedido de anulação da nomeação do Procurador Europeu português, por ter sido apresentado fora de prazo” — decisão da qual discorda em absoluto. E alerta que o “Tribunal Geral não julga o fundo da questão. Isto é, a intervenção do Governo português na escolha do procurador de nacionalidade portuguesa, que a meu ver fere gravemente a independência e a reputação da recém-criada Procuradoria Europeia e opta por decidir por via de uma questão prévia”, lê-se no comunicado.
Caso do procurador. Ana Carla Almeida avança com queixa judicial para anular nomeação de José Guerra
Ana Carla Almeida foi a magistrada portuguesa selecionada por um comité de peritos independentes do Conselho da União Europeia para a Procuradoria Europeia, no entanto, o Executivo português decidiu que o nomeado deveria ser José Guerra, decisão que acabou por ir em frente, uma vez que a decisão do comité de peritos não era vinculativa.
Para justificar a decisão, Francisca Van Dunem baseou-se num concurso nacional gerido pelo Conselho Superior do Ministério Público, no qual José Guerra tinha ficado em primeiro lugar (e Ana Carla Almeida em terceiro), um concurso cujos resultado, no entanto, não foi seguido pelos peritos europeus.
Governo deu informações falsas à UE sobre nome escolhido para procurador europeu
O caso gerou polémica devido ao que o Governo chamou de “lapsos” no curriculum de José Guerra: a atribuição da categoria hierárquica de procurador-geral adjunto que Guerra não detém e uma liderança na investigação ao caso UGT, relacionada com fraude de fundos europeus nos de 1990, que não foi chefiada por José Guerra.
Caso a queixa de Ana Carla Almeida contra o Conselho da União Europeia fosse bem sucedida, teria de haver nova deliberação sobre o procurador que representará Portugal na Procuradoria Europeia. A decisão do Tribunal Geral de Justiça da União Europeia foi, no entanto, em sentido contrário.
Comunicado da procuradora Ana Carla Almeida
“Respeito a decisão do Tribunal Geral, mas estou em profundo desacordo com ela, pelo que irei recorrer de imediato.
A decisão do Tribunal Geral da União Europeia de considerar extemporâneo o meu pedido de anulação da nomeação do Procurador Europeu português, por ter sido apresentado fora de prazo, sendo uma das decisões possíveis, constitui, no meu entender e no dos meus advogados, uma decisão juridicamente desajustada.
Desde logo, o Tribunal Geral não julga o fundo da questão, isto é, a intervenção do governo português na escolha do Procurador de nacionalidade portuguesa, que a meu ver fere gravemente a independência e a reputação da recém-criada Procuradoria Europeia e opta por decidir por via de uma questão prévia.
O Tribunal Geral, nesta instância, limitou-se a declarar a ação extemporânea, por ter sido entregue após o prazo ordinário estabelecido. Ora a ação não podia nunca ter sido apresentada mais cedo, já que só depois do final desse prazo tive conhecimento da carta do governo português a pressionar o Conselho para escolher o Procurador nomeado, carta despropositada, com erros graves e relevantes para a decisão que foi tomada.
O Tribunal Geral, surpreendentemente, desconsiderou inteiramente esse facto, de conhecimento superveniente e decisivo para a minha decisão de interpor recurso. Fê-lo, como referi, sem sequer avaliar da relevância da carta em causa para a ação apresentada.
Não alcanço uma razão mais forte para a admissão do recurso.
Desta forma, foi posta em causa a proteção jurisdicional efetiva dos meus direitos, em si mesma um direito fundamental garantido pelos tratados europeus, pela Carta dos Direitos Fundamentais da UE e pelos princípios gerais do direito. Irei por isso recorrer para o Tribunal de Justiça, que é o Tribunal Supremo e Constitucional da União Europeia, do qual espero, confiante, a análise do fundo da questão, isto é, da ilegitimidade do procedimento do Governo português, que não pode ter deixado de ferir de ilegalidade a decisão do Conselho da União Europeia.
Respeito a decisão do Tribunal Geral, nesta instância, mas pelas razões referidas não a acatarei, por estar com ela em profundo desacordo.
Ana Carla Almeida”