Marcelo Rebelo de Sousa foi recebido esta segunda-feira pelo chefe de Estado brasileiro, Jair Bolsonaro, em Brasília para um encontro de trabalho seguido de almoço, que o Presidente português esperava servir para “construir melhores pontes” entre Portugal e o Brasil. À saída do encontro, Marcelo salientou a necessidade e urgência de fechar acordo entre a União Europeia e a Mercosul, onde Portugal foi “grande defensor” durante a Presidência da Comissão Europeia tendo trabalhado “intensamente para dar passos sucessivos e preparatórios do acordo global”.

O acordo do Mercosul com a União Europeia é uma prioridade para os dois países e o Presidente da República fez questão de salientar que Portugal fez avanços durante o período da presidência europeia, e que o Brasil “tem uma posição liderante do lado da Mercosul”. Apesar de o país ter deixado a presidência da UE, Marcelo diz ter “presente que há outras presidências pelo meio e cada uma tem uma palavra a dizer” no tema, mas afirma que estão “esperançados” que mais dossiers e “obstáculos económicos pesados” sejam resolvidos.

A UE e o Mercosul assinaram o acordo comercial em 2019, após 20 anos de negociações, mas este ainda não entrou em vigor, e a sua ratificação está paralisada porque alguns países como França, Bélgica, Holanda e Áustria, além do Parlamento Europeu, pedem o reforço das políticas ambientais, principalmente por parte do Brasil. Políticas essas que o Chefe de Estado português abordou dizendo ter registado a crescente “preocupação brasileira com a narrativa ambiental”.

O ministro dos Negócios Estrangeiros, Augusto Santos Silva, também presente no encontro, acabou por completar as declarações do Presidente português em relação ao Mercosul dizendo que “compete agora à União Europeia apresentar o primeiro esboço de texto para progredir a negociação”. Santos Silva fez saber que enquanto Portugal presidiu à Comissão Europeia “fez um avanço muito importante” ao reconhecer que é necessário um instrumento adicional ao acordo no que toca “a matéria ambiental sobre a desflorestação e matérias conexas” de ambas as partes. Portugal chegou a contactar os países da Mercosul que “unanimemente” se mostraram disponíveis para começar a negociar “imediatamente” o instrumento adicional.

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Muitos apertos de mão e máscaras em falta à chegada

A receção começou com o içar das bandeiras dois dois países, seguida dos hinos, e ficou marcada pelo contraste das duas comitivas no uso de máscaras e por cumprimentos desaconselhados em período de pandemia: apertos de mão.

O encontro entre os dois chefes de Estado começou ao final da manhã, meio da tarde em Lisboa, no palácio da Alvorada, residência oficial do chefe de Estado Brasileiro. Marcelo Rebelo de Sousa foi recebido pela guarda de honra por volta das 12h30 de Brasília (mais quatro horas em Lisboa), por Jair Bolsonaro e por uma comitiva de membros do governo, incluindo o vice-presidente, Hamilton Mourão, e o ministro das Relações Exteriores, Carlos França. Pelo lado português, participaram, além de Marcelo Rebelo de Sousa, o ministro dos Negócios Estrangeiros, Santos Silva, o embaixador de Portugal em Brasília, Luís Faro Ramos, e a Ministra da Cultura, Graça Fonseca.

Com “delicadeza política” e um “álibi formal”, Marcelo reúne-se com Lula e Bolsonaro para garantir futuro das relações com o Brasil

Na receção, transmitida em direto através dos canais de comunicação oficiais do governo brasileiro, a ausência de máscaras era contrastante — Marcelo Rebelo de Sousa e a comitiva portuguesa faziam uso das suas, enquanto que Jair Bolsonaro e quem o acompanhava dispensaram a proteção facial. Questionado na conferência de imprensa sobre essa dispensa por parte dos membros brasileiros, Marcelo afirmou não ter de “formular juízos sobre as outras organizações” e muito menos “juízos relativamente à postura dos anfitriões que nos receberam no Palácio da Alvorada”.

“Eu penso que a delegação portuguesa esteve como tem estado sempre em todos os encontros e nas cerimónias oficiais como aconteceu na reinauguração do museu”, acrescentou dizendo que a delegação portuguesa fez o que era “expectável”.

Entre os dois líderes houve apertos de mão firmes depois de Marcelo assinar o livro de boas-vindas ao Palácio, tendo Bolsonaro acompanhado o Presidente português dentro da Alvorada com uma mão nas suas costas e de sorriso na cara. Marcelo cumprimentou com um aperto de mão a fileira com todos os membros da comitiva brasileira (ou com abanões).

O encontro com Bolsonaro atraiu a atenção da imprensa brasileira, mas os jornalistas não foram autorizados a entrar, tendo sido mantidos a alguns quilómetros de distância do Palácio da Alvorada, num espaço conhecido localmente como “o cercadinho da imprensa”.

No encontro entre os dois chefes de Estado estiveram, em cima da mesa, as relações de cooperação entre os dois países, nomeadamente a nível económico, bem como a participação de Portugal nas comemorações dos 200 anos da independência do Brasil, que se assinalam em 2022.

Ainda à saída do encontro, o Presidente português foi questionado sobre uma eventual visita de Bolsonaro a Portugal. “Não falamos de viagens próximas. Portugal apresentou o seu calendário eleitoral e registou o calendário eleitoral brasileiro, mas não falamos de nenhum tipo de programação desse teor para o futuro”, disse. Marcelo Rebelo de Sousa convidou, em 2019, Jair Bolsonaro para visitar Portugal durante um encontro no âmbito da sua tomada de posse como novo Presidente do Brasil, uma viagem que nunca se concretizou.

Apesar de Bolsonaro não ter prestado declarações, o Ministério das Relações Exteriores do Brasil deixou uma nota sobre o encontro no site do governo brasileiro. “Os Presidentes Bolsonaro e Rebelo de Sousa reafirmaram na ocasião a convergência entre Brasil e Portugal nos campos cultural, económico, comercial e multilateral e reiteraram o compromisso mútuo de promover a recuperação econômica no contexto pós-pandemia”, pode ler-se.

Em declarações aos jornalistas no domingo, antecipando o encontro com Bolsonaro, Marcelo Rebelo de Sousa assegurou que, da sua parte, tudo fará para “construir melhores pontes” com o Brasil, dando continuidade ao reforço da cooperação histórica entre “dois países irmãos”.

O último dia de visita ao Brasil

O Presidente português iniciou na passada sexta-feira, 30, uma visita de quatro dias ao Brasil, tendo tido encontros com os antigos presidentes Lula da Silva, Fernando Henrique Cardoso e Michel Temer, culminando esta segunda-feira no encontro com  atual chefe de Estado brasileiro, Jair Bolsonaro.

No final do encontro com o homólogo, Marcelo Rebelo de Sousa afirmou várias vezes que “em termos bilaterais há muito a concretizar”, e o bicentenário da independência do Brasil e a língua portuguesa foram temas em cima da mesa do encontro.

Sobre a língua portuguesa e sua presença no mundo — coincidindo com a reinauguração do museu — Marcelo destacou o “papel de protagonista cimeiro” do Brasil, sobretudo pela sua dimensão e pela camada jovem que representa. “Este museu foi um marco fundamental, é mesmo, comparado com o que há de outras línguas, virado para o futuro, o mais avançado tecnologicamente, aquele que é mais promissor”, confessou.

Nessa cerimónia de reinauguração do Museu da Língua Portuguesa em São Paulo, Marcelo Rebelo de Sousa tinha dito que “dança quem está na roda” quando questionado pelos jornalistas sobre a ausência do homólogo brasileiro.

O Presidente da República português falava durante a conferência de imprensa conjunta com várias personalidades, incluindo o Presidente de Cabo Verde, Jorge Carlos Fonseca, e o Governador do Estado de São Paulo, João Dória, e onde a ausência mais notada foi a de Jair Bolsonaro. O presidente brasileiro optou por se juntar nesse dia a uma concentração de motociclistas no município Presidente Prudente, que fica no Estado de São Paulo.