A defesa de Rui Silveira considerou esta quarta-feira “infamante” a condenação do ex-administrador do BES a uma coima de 400.000 euros por alegado incumprimento do dever de comunicação da situação da carteira de crédito do BESA ao supervisor.

Nas alegações finais do julgamento dos recursos interpostos às coimas aplicadas pelo Banco de Portugal (BdP) no âmbito dos processos BESA e Eurofin, que decorre desde 2 de junho no Tribunal da Concorrência, Regulação e Supervisão (TCRS), em Santarém, Luís Pires de Lima afirmou que a infração imputada a Rui Silveira “não existe”, pelo que não deveria ter sido condenado.

O advogado afirmou que a obrigação de comunicação ao supervisor de problemas detetados cabe em primeira instância aos órgãos de administração e só subsidiariamente aos administradores, pelo que não está instituída a obrigatoriedade de comunicação “imediata” como foi imputado a Rui Silveira, administrador que detinha os pelouros dos assuntos jurídicos e auditoria interna.

Pires de Lima afirmou que Rui Silveira tomou conhecimento das atas da assembleia-geral da filial angolana do Banco Espírito Santo, realizada em outubro de 2013 (sobre a situação da carteira de crédito), na qual não participou, e que enviou o memorando elaborado pelo presidente da mesa daquele órgão a Amílcar Morais Pires (que detinha então o pelouro do BESA), o qual declarou em tribunal não o ter recebido.

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O advogado afirmou que a acusação do BdP “distorce” os factos, não compreendendo como pode Rui Silveira ser condenado por dolo por alegadamente conhecer a verdadeira situação da carteira de crédito do BESA e ter decidido manter a Comissão Executiva do BES e o supervisor no desconhecimento dos factos, quando subscreveu o memorando que indicava a atuação que deveria ser seguida caso se confirmasse a existência de imparidades.

Recordando o contexto em que ocorreu a assembleia-geral do BESA de outubro de 2013, no âmbito da mudança de administração com a saída conturbada de Álvaro Sobrinho e a entrada de Rui Guerra, Pires de Lima afirmou que “é uma distorção” afirmar que foi aí reconhecida a existência de imparidades, quando na realidade havia falta de informação sobre os beneficiários dos créditos e a situação do imobiliário, a qual estava a ser prestada.

Pires de Lima pediu à juíza Mariana Gomes Machado que tenha em conta a sentença proferida pelo TCRS, já transitada em julgado, que absolveu a auditora KPMG, a qual explica de forma “sólida” o contexto em que decorreu esta assembleia-geral.

Nas suas alegações, Pires de Lima socorreu-se de vários documentos que foram juntos ao processo em junho último pela defesa de Ricardo Salgado para contestar a postura do BdP em todo o processo.

Em particular, referiu a existência de pareceres solicitados pelo supervisor favoráveis ao reconhecimento da garantia soberana de Angola, que cobria os créditos e juros vencidos e vincendos e os imóveis no valor de 5,7 mil milhões de dólares, os quais nunca foram juntos ao processo, apesar de pedidos ao BdP.

Segundo o advogado, Fernando Infante, diretor adjunto do Departamento de Supervisão Prudencial do BdP, “faltou à verdade” quando disse ao tribunal que a garantia soberana foi desconsiderada com base num parecer desfavorável, o qual nunca foi junto ao processo, porque, disse, “não há, não existe”.

Pires de Lima apontou ainda contradições nas declarações do ex-governador do BdP Carlos Costa, como a afirmação, no depoimento feito neste julgamento, de que soube que a garantia soberana ia ser revogada antes da decisão sobre a resolução do BES quando, nos vários depoimentos prestados na Assembleia da República, afirmou que a revogação tinha acontecido antes.

Para o advogado, Carlos Costa “tentou compor” a sua versão depois de vários responsáveis do BdP terem afirmado ao tribunal que a garantia soberana foi revogada depois da resolução do BES.

Carlos Costa merece a credibilidade que lhe quiserem dar”, afirmou.

No processo BESA/Eurofin estão em causa coimas num total de 17,3 milhões de euros aplicadas pelo Banco de Portugal (BdP).

No primeiro caso, incluem-se infrações como a não implementação de procedimentos que reforçassem ou garantissem o acompanhamento das operações realizadas com o BES Angola, não implementação de processos de análise ao risco de crédito relativamente ao crédito contratado com aquela instituição e “incumprimento dos deveres de comunicação obrigatória” ao Banco de Portugal (BdP) dos problemas associados às carteiras de crédito e de imobiliário do BESA.

No processo Eurofin, o BdP imputou a prática de atos dolosos de gestão ruinosa praticados em detrimento de depositantes, investidores e demais credores, desobediência ilegitima a determinações do supervisor e, entre outras infrações, a comercialização, de forma direta ou indireta, de dívida de entidades do ramo não financeiro do GES junto de clientes de retalho.

Para quinta-feira estão agendadas as alegações de Amílcar Morais Pires e de Ricardo Salgado.