Até esta terça-feira, FC Porto e Liverpool tinham cruzado os próprios caminhos em oito ocasiões. Os ingleses ganharam a eliminatória da Taça UEFA em 2000/01, ganharam na fase de grupos da Liga dos Campeões em 2007/08, ganharam nos quartos de final da Champions em 2017/18 e ganharam nas meias-finais da mesma competição em 2018/19. Até esta terça-feira e contra o Liverpool, o FC Porto não conhecia qualquer outra emoção que não a desilusão.

Mas esta terça-feira era um dia especial. Em dia de aniversário, o FC Porto teria de recordar os 128 anos de história centenária e esquecer os oito dias de mágoa no passado recente. E ainda que, para o alcançar, tivesse de ultrapassar uma das melhores equipas do mundo, nada retirava a responsabilidade que a equipa de Sérgio Conceição sentia. “A responsabilidade é sempre máxima. Se fizermos essa pergunta aos adeptos ou aos dirigentes eles não pensam da mesma forma, temos sempre a pressão de ganhar. Estamos cientes da dificuldade e do equilíbrio deste grupo mas estamos num grande clube e todos os momentos são importantes para decidir um jogo. Olhar para o jogo de forma desinibida é o quê? Há vários fatores que podem dizer que a equipa está nervosa. Temos pressão. No ano passado ganhámos 1-0 ao Chelsea e houve gente que ficou amuada. Mas é assim, faz parte da cultura do clube esta vivência de Liga dos Campeões nos últimos 40 anos, com um presidente que ganhou tudo o que havia para ganhar. E depois cabe-me a mim dar a melhor resposta possível. Esta nova geração viu o FC Porto ser muito competitivo e ganhar muitos títulos mas antes do presidente não se ganhava nada. Somos bem — ou mal — habituados e estranhamos quando é o contrário”, disse o treinador dos dragões na antevisão da receção ao Liverpool.

Ficha de jogo

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FC Porto-Liverpool, 1-5

Fase de grupos da Liga dos Campeões

Estádio do Dragão, no Porto

Árbitro: Sergei Karasev (Rússia)

FC Porto: Diogo Costa, Corona, Fábio Cardoso, Marcano, Zaidu (Wendell, 56′), Otávio (Fábio Vieira, 14′), Sérgio Oliveira (Pepê, 67′), Uribe (Vitinha, 56′), Luis Díaz, Taremi, Toni Martínez (Grujic, 45′)

Suplentes não utilizados: Marchesín, Nanu, Manafá, João Mário, Bruno Costa, Evanilson

Treinador: Sérgio Conceição

Liverpool: Alisson, James Milner (Joe Gomez, 66′), Matip, Van Dijk, Robertson, Fabinho, Curtis Jones, Henderson (Oxlade-Chamberlain, 73′), Mané (Minamino, 66′), Salah (Roberto Firmino, 66′), Diogo Jota (Origi, 88′)

Suplentes não utilizados: Adrián, Kelleher, Konaté, Naby Keita, Tsimikas, Nathaniel Phillips, Neco Williams

Treinador: Jürgen Klopp

Golos: Salah (18′ e 60′), Mané (45′), Taremi (75′), Roberto Firmino (77′ e 81′)

Ação disciplinar: nada a registar

Ora, contra os ingleses e em casa, o FC Porto precisava pelo menos de pontuar para continuar a ter o apuramento para os oitavos de final da Liga dos Campeões completamente em aberto. Depois do empate sem golos contra o Atl. Madrid no Wanda Metropolitano, os dragões recebiam um Liverpool que derrotou o AC Milan em San Siro na primeira jornada da fase de grupos, que está na liderança da Premier League mas que vinha de um cansativo e frustrante empate contra o Brentford.

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Sem Mbemba, que foi expulso contra o Atl. Madrid e estava castigado, Sérgio Conceição chegou a ter a boa notícia do regresso de Pepe: o central português estava no onze, fez os exercícios de aquecimento mas ressentiu-se da lesão que sofreu na capital espanhola e acabou por ser substituído por Fábio Cardoso, que fez a estreia absoluta pelos dragões. Em relação à vitória do fim de semana contra o Gil Vicente, o FC Porto trocava ainda Wendell, Vitinha e Fábio Vieira por Zaidu, Sérgio Oliveira e Toni Martínez. Do outro lado, Jürgen Klopp repetia a equipa que empatou com o Brentford, onde Diogo Jota era titular no ataque, e só era forçado a substituir Trent Alexander-Arnold por James Milner, já que o jovem lateral direito sofreu uma lesão no adutor e nem sequer viajou para Portugal.

Sem surpresas, os primeiros instantes trouxeram um Liverpool com vontade de implementar o futebol ofensivo que o caracteriza. No Dragão, a ideia era explorar o corredor esquerdo do ataque e partir daí para a zona central ou para o lado oposto, procurando a presença de Henderson à entrada da grande área ou a eficácia de Salah ao segundo poste. Ainda assim, e apesar de ter ficado notório logo nos primeiros minutos que Corona ia precisar de muita ajuda para parar Robertson, Mané e até Diogo Jota, o FC Porto ainda conseguiu ripostar e até fez o primeiro remate do jogo, com Luis Díaz a assinar a jogada do costume para atirar depois de puxar da esquerda para dentro, numa bola que morreu nas mãos de Alisson (7′).

Ainda antes de ficar fechado o primeiro quarto de hora, os dragões voltaram a sofrer uma contrariedade. Otávio, que estava a atuar na direita do meio-campo, sofreu uma lesão muscular e pediu para sair, sendo substituído por Fábio Vieira. Mesmo com essa alteração, o jogo continuou a ser disputado num ritmo algo lento e pouco intenso — algo que acabava por favorecer o Liverpool, porque o FC Porto parecia adormecido na partida e os reds eram exímios nas alterações de velocidade que surpreendiam a defesa adversária. O golo da equipa de Jürgen Klopp, embora tenha surgido na primeira verdadeira oportunidade dos ingleses, apareceu naturalmente: Curtis Jones desequilibrou na esquerda e atirou à baliza em jeito, Diogo Costa fez uma grande defesa para a frente e Zaidu comprometeu, acabando por permitir o desarme e o remate final de Salah (18′).

Mesmo a perder, a equipa de Sérgio Conceição não conseguiu reagir. O Liverpool defendia e atacava em bloco, com praticamente todos os setores a acompanharem as transições, algo que não só dificultava a vida dos jogadores do FC Porto na hora de parar as investidas adversárias como gorava quaisquer possibilidades de sucesso dos contra-ataques. Os dragões não tinham agressividade, não ganhavam duelos e não realizam ligações entre setores — Fábio Vieira caiu de pára-quedas no jogo, Taremi estava sempre demasiado sozinho no ataque, Toni Martínez teve poucas ou nenhumas intervenções e Luis Díaz, embora fosse o grande inconformado, raramente tinha espaço para desequilibrar.

Em sentido oposto, o Liverpool foi procurando o segundo golo sem precisar de acelerar muito. Henderson rematou contra Marcano depois de um cruzamento atrasado de Salah (23′), Diogo Jota viu Diogo Costa roubar-lhe o golo com uma grande defesa (26′) e o jovem guarda-redes do FC Porto ainda parou um livre do mesmo Henderson (33′). Já perto do intervalo, os dragões acabaram por conseguir construir a melhor jogada da primeira parte: Taremi recebeu de Uribe no meio e abriu em Corona na direita, com o mexicano a tirar um cruzamento que foi desviado ao primeiro poste e sobrou para o segundo; aí, Luis Díaz recebeu e atirou rasteiro mas a bola saiu fraca e para as mãos de Alisson (38′). A falta de eficácia do colombiano, que deixou o Dragão à beira de um ataque de nervos, tornou-se ainda mais gritante escassos instantes depois.

Naquele que foi praticamente o último lance do primeiro tempo, Fabinho abriu no corredor direito a partir da faixa central e descobriu James Milner. Sem a aproximação necessária de Zaidu, o lateral cruzou tenso, a bola atravessou toda a área sem ser intercetada, Diogo Costa hesitou na abordagem e Corona não acompanhou Mané e o avançado apareceu sozinho, ao segundo poste, a encostar para a baliza deserta (45′). Mesmo à beira do intervalo e logo depois de ter tido uma ocasião para empatar, o FC Porto sofria um balde de água fria e acabava por colher as consequências da própria exibição: os dragões tinham de mostrar muito mais dinâmica, de demonstrar relações entre os setores e de aproveitar o espaço nos contra-ataques se ainda quisessem lutar pelo resultado na segunda parte.

No arranque da segunda parte, Sérgio Conceição tirou Toni Martínez e abdicou de jogar com dois elementos na frente para lançar Grujic e dar solidez ao meio-campo e à saída de bola. Ainda assim, e como se notou desde logo num lance em que Diogo Costa voltou a ser preponderante para evitar o golo de Diogo Jota (52′), o FC Porto tinha nos corredores o seu grande problema — tanto defensiva como ofensivamente. A defender, os dragões não conseguiam realizar as dobras e as compensações necessárias e davam demasiado espaço a Mané e Salah; a atacar, como Corona e Zaidu estavam tão preocupados com as tarefas defensivas, nenhum dos laterais avançava pela ala e os contra-ataques eram lançados sempre de forma algo desequilibrada e sem apoios.

Sérgio Conceição tentou mudar alguma coisa ainda antes da hora de jogo, ao trocar Zaidu e Uribe por Wendell e Vitinha, mas as escassas melhorias que o FC Porto verificou com a dupla alteração nem sequer tiveram tempo para assentar. Sérgio Oliveira perdeu a bola na zona do meio-campo, Curtis Jones conduziu descaído na esquerda e atraiu toda a defesa adversária para esse lado, descobrindo depois Salah completamente sozinho no poste oposto. O egípcio recebeu sem oposição e atirou à saída de Diogo Costa, bisando na partida e aumentando a vantagem do Liverpool (60′).

O FC Porto ainda procurou reagir, até aproveitando uma natural quebra de ritmo por parte dos ingleses, e Vitinha ainda ficou perto de reduzir com um remate que Alisson encaixou (63′). Logo depois e com uma vantagem mais do que confortável, Klopp tirou Salah, Mané e Milner e lançou Firmino, Minamino e Joe Gomez, com Sérgio Conceição a responder ao trocar Sérgio Oliveira por Pepê. A ligeira melhoria dos dragões, embora algo consentida pelo Liverpool, abriu a porta ao golo do FC Porto: numa jogada de insistência, Fábio Vieira desequilibrou na direita e cruzou para o primeiro poste, onde Taremi fugiu à marcação de Gomez e cabeceou para dentro da baliza (75′).

Os dragões adquiriram algum entusiasmo com a redução da desvantagem, não só por terem encurtado o resultado mas também pela esperança de ainda retirarem algo do jogo numa fase em que os principais protagonistas do Liverpool já não estavam em campo, mas essa fase durou muito pouco. Num lance em que Diogo Costa voltou a ter uma abordagem quase inexplicável, Roberto Firmino antecipou-se a Marcano e aproveitou o adiamento do guarda-redes para atirar de muito longe para a baliza deserta (77′). Pouco depois, o avançado brasileiro aproveitou um ressalto depois de um remate de Curtis Jones e finalizou na cara de Diogo Costa, bisando na partida e engordando a goleada no Dragão (81′).

Depois de 2017/18, em que o Liverpool venceu no Dragão por 0-5, e também depois de 2018/19, em que o Liverpool voltou a vencer no Dragão por 1-4, o Liverpool regressou ao Dragão para vencer por 1-5. O provérbio diz que não há duas sem três mas Sérgio Conceição não se lembrou disso: apesar de ter tido as contrariedades das lesões de Pepe e Otávio e dos erros pouco habituais de Diogo Costa, o treinador dos dragões voltou a apostar em Zaidu de forma algo inexplicável, principalmente depois da resposta que Wendell deu no Campeonato, e abordou a partida com dois avançados e demasiado otimismo. No fim, saiu derrotado e está no último lugar do grupo da Liga dos Campeões.