Investimento na justiça administrativa, reabilitação de tribunais, reforço de meios humanos e técnicos, combate à corrupção e progressão nas carreiras dos funcionários judiciais são prioridades apontadas pelos profissionais do setor para o Orçamento do Estado 2022.
O presidente da Associação Sindical dos Juízes Portugueses (ASJP), Manuel Soares, disse à Lusa que “se a opinião da ASJP contar para alguma coisa, as prioridades 1, 2 e 3, em que o Estado deve investir dinheiro, chama-se justiça administrativa e fiscal”.
A ASJP espera que o OE2022 permita também assegurar “uma lei orgânica para o Conselho Superior dos Tribunais Administrativos e Fiscais, mais juízes, estruturas para acabar com as pendências acumuladas e instalações condignas”.
A ASJP aponta ainda como “matérias essenciais” a revisão do Estatuto dos oficiais de justiça e a redução dos custos do acesso à justiça.
Se o governo fizer isto, já terá feito mais que muitos governos que o antecederam”, disse Manuel Soares.
A propósito do OE2022, o Sindicato dos Magistrados do Ministério Público (SMMP) lembrou que o Ministério da Justiça apresentou em 2020 a sua estratégia anticorrupção (atualmente em discussão no parlamento), mas destacou que “não existe qualquer estratégia que consiga ser implementada sem um significativo reforço de meios humanos e materiais”.
Para o SMMP, “a necessidade de colmatar o défice de recursos humanos através do recrutamento de magistrados do MP, oficiais de justiça para os vários departamentos do MP e a abertura de cursos para a Polícia Judiciária (PJ)” são aspetos fulcrais a serem garantidos pelo Orçamento do Estado.
Por outro lado, diz o SMMP, domínios “muito exigentes e específicos”, como a contratação pública, as parcerias público-privadas, a fraude na obtenção de subsídios e a evasão fiscal, impõem “um reforço das unidades de perícia financeira” da PJ e do Núcleo de Assessoria Técnica (NAT) da Procuradoria-Geral da República (PGR).
Existe assim, nota o SMMP, a necessidade de investir em soluções informáticas, com capacidades analíticas e de tratamento da informação, que “facilitem a compreensão e apreensão do conteúdo dos processos-crime”.
“A PGR tem em desenvolvimento um programa para tramitação do inquérito, recolha, análise, tratamento e apresentação da prova no processo penal, com potencialidades para ser de enorme ajuda na melhoria da eficácia de resposta do MP na área criminal e que está em sério risco de nunca ser produzida por falta de dinheiro”, adverte o SMMP.
O sindicato refere ainda que as condições de trabalho em grande parte dos serviços do MP “são péssimas”, alertando que “não existem salas para inquirição de testemunhas, não existem equipamentos de videoconferência próprios e exclusivos do MP, faltam impressoras de elevado rendimento para permitir a digitalização dos inquéritos, os espaços atribuídos a esta magistratura são exíguos e muitos magistrados têm que partilhar gabinete”.
O SMMP sublinha que “chegou o momento de verificar se a aposta no combate à corrupção constitui um propósito sério e firme do Governo ou se a mesma se vai quedar por um conjunto de intenções”.
O OE2022, adiantou o SMMP, terá que “espelhar, quer o plano estratégico para a corrupção, quer a aposta na melhoria da eficácia do sistema de justiça, um necessário reforço significativo dos meios técnicos e humanos”.
O bastonário da Ordem dos Advogados (OA), Luís Menezes Leitão, disse à Lusa que a OA gostaria que houvesse o “reforço do orçamento do Ministério da Justiça”.
O bastonário frisou que “a remuneração dos advogados que trabalham no acesso ao direito não é atualizada há muitos anos e em 2020 teve apenas uma atualização de oito cêntimos, violando a lei, que determina a sua atualização anual de acordo com a inflação”.
Da mesma forma, adiantou Menezes Leitão, deveriam ser reduzidas as custas judiciais, que “impossibilitam as pessoas da classe média de ter acesso à justiça”.
O bastonário da OA defendeu que é preciso “reabilitar muitos tribunais, uma vez que muitos estão em estado de degradação absoluta, como é exemplo dramático o Tribunal de Família e Menores de Aveiro”.
António Marçal, presidente do Sindicato dos Funcionários Judiciais (SFJ), referiu que para o OE2022 os oficiais de justiça “esperam que os bloqueios à normal progressão da carreira sejam efetivamente eliminados, de forma a permitir que se realizem os concursos de acesso às categorias de escrivão de direito e de técnico de justiça principal, bem como a regularização da situação dos secretários de justiça, num procedimento que teve já decisão do Tribunal Constitucional”.
De acordo com António Marçal, o SFJ espera que haja a abertura de procedimento de ingresso para “colmatar as carências enormes que existem nos tribunais e serviços do Ministério Público (MP)”, estimando o SFJ que a necessidade, de momento, seja de mil funcionários.
O presidente do SFJ alertou, contudo, que esta situação tende a agravar-se por força da idade dos atuais funcionários — 60% com mais de 50 anos –, notando que até 2028 irão aposentar-se por limite de idade cerca de 2.800 oficiais de justiça, pelo que importava constituir uma bolsa de recrutamento.
“Também será conveniente que sejam previstos investimentos na modernização e requalificação de edifícios, muitos dos quais não têm condições de funcionamento, com muitos a precisarem de intervenções nas coberturas e porque ainda existem muitos que não garantem as acessibilidades necessárias”, indicou António Marçal.
“Igualmente urge um planeamento para requalificar o parque informático dos tribunais e das secretarias, até porque o concurso feito está a causar muitos problemas porque os equipamentos não servem para o fim para o qual foram adquiridos, conforme nos é reportado de vários tribunais”, considerou ainda o presidente do SFJ.