Cem personalidades apelaram esta terça-feira num abaixo-assinado a “uma maioria plural de esquerda” nas próximas eleições legislativas, defendendo que “só essa pluralidade pode construir o diálogo” e que, sem ela, “a esquerda derrota-se”.

Numa carta esta terça-feira publicada no jornal Público, cem personalidades — onde consta a assinatura do arquiteto Álvaro Siza Vieira, do escritor Mário de Carvalho ou da jornalista Pilar del Río — apelam à promoção de “uma maioria plural de esquerda”.

Seja qual for o futuro, só essa pluralidade pode construir o diálogo, a alternativa, a resistência. Sem ela, a esquerda derrota-se. Com pluralidade, a agenda de esquerda para um desenvolvimento mais justo e sustentável de Portugal sairá reforçada, lê-se no abaixo-assinado.

Em declarações à agência Lusa, o professor de economia política no ISCTE Ricardo Paes Mamede, um dos subscritores do documento, afirmou que, da parte das 100 personalidades, “existe a convicção de que este tipo de entendimentos é possível, que é necessário” e que a governação “tende a sair favorecida se houver, de facto, uma pluralidade de representações políticas no parlamento”.

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Paes Mamede realçou que o abaixo-assinado “não fala numa repetição da geringonça, fala na necessidade de haver um fortalecimento das formações de esquerda no parlamento, e que seja plural esse fortalecimento, não beneficie mais uma ou outra formação”.

“A nossa convicção é de que não será mais difícil hoje encontrar soluções de governação à esquerda do que foi há seis anos. Há seis anos, ninguém acreditava que aquilo que ficou conhecido como geringonça pudesse acontecer, e aconteceu”, indicou, relembrando que, na altura, “estava ainda muito presente o [chumbo] do PEC IV e todas as divergências históricas que houve entre as formações em causa”.

Apesar disso, Paes Mamede reconheceu que “essas soluções serão mais ou menos difíceis de estabelecer em função da representação dos vários partidos”, tendo os subscritores a convicção de que o “reforço de uma maioria parlamentar em que há uma forte presença dos vários partidos e não apenas de um ou outro torna mais fácil, e não mais difícil, que se obtenha compromissos”.

No documento, os 100 subscritores, entendem que “os progressos políticos verificados desde 2015, mesmo quando insuficientes, não teriam sido possíveis sem o empenho do BE, do PCP e do PEV, no quadro de uma maioria parlamentar de esquerda com o PS”.

Sem prejuízo do balanço diferenciado que fazemos das razões que levaram à interrupção da legislatura, sabemos que a concretização de uma agenda socioeconómica mais ambiciosa é uma tarefa que o PS, sozinho, não poderá cumprir, indicam.

Questionado sobre a frase, Ricardo Paes Mamede considerou que, quanto mais fortes forem “os partidos que estão no espetro da esquerda” e “em particular aqueles que estão à esquerda do PS”, “maior é a probabilidade das soluções governativas” serem mais próximas do que os signatários defendem, designadamente a “promoção da justiça social”, “dos direitos laborais, dos serviços públicos“.

“O PS, agindo sozinho, tenderá a não agir da mesma forma [do que] se agir num parlamento em que estas forças têm mais força política, creio que isso é mais ou menos incontestável”, frisou.

No abaixo-assinado, os cem subscritores salientam ainda que “o próximo governo será formado pela conjugação da vontade das diversas forças parlamentares, independentemente de qual venha a ser o partido mais votado” e alertam que a “reedição, formal ou informal, do bloco central só pode ser evitada se as esquerdas parlamentares saírem reforçadas”.

Entre os subscritores estão nomes como os jornalistas Constança Cunha e Sá, Daniel Oliveira e Carlos Vargas, a socióloga e ex-secretária de Estado Ana Benavente, a poetisa Ana Luísa Amaral, o compositor António Pinho Vargas, o escritor José Luís Peixoto, os músicos Mário Laginha e Vitorino, os sociólogos Boaventura Sousa Santos, Manuel Lisboa e Ana Drago (ex-BE), a editora Bárbara Bulhosa ou o arqueólogo Cláudio Torres.