André Leon Talley, jornalista de moda influente, antigo editor da Vogue e braço direito de Anna Wintour, diretora editorial global da revista, morreu na terça-feira, aos 73 anos. A notícia, avançada pelo TMZ, foi posteriormente confirmada pelo agente literário do também estilista, David Vigliano. Talley tinha 73 anos.
“É com grande tristeza que anunciamos o falecimento de André Leon Talley a 18 de janeiro de 2022 em Nova Iorque”, refere uma publicação feita esta quarta-feira na página oficial do Instagram de Talley. “Talley foi o maior do que a vida diretor criativo de longa data da Vogue durante a sua ascensão a bíblia da moda mundial. Nas últimas cinco décadas como ícone internacional, foi confidente de Yves Saint Laurent, Karl Lagerfeld, Paloma Picasso, Diane von Furstenberg, Bethann Hardison e Manolo Blahnik e tinha uma propensão para descobrir, nutrir e celebrar jovens designers.”
Nascido em 1948 em Washington, André Leon Talley cresceu em Durham, na Carolina do Norte, na era Jim Crow (nome de uma personagem que ridicularizava os negros e que era usada para designar o conjunto de leis que, após o fim da escravatura, impuseram a segregação racial, sobretudo no sul dos Estados Unidos da América, até meados dos anos 60). Foi criado pela avó, empregada de limpeza na Duke University, em Durham, e licenciou-se em Literatura Francesa, na Brown University, em Providence.
Defensor de longa data da indústria da moda, uma paixão que começou ainda durante a juventude, quando começava visitar a biblioteca local para ler cópias da revista Vogue, que personalizava um mundo onde “coisas más nunca acontecem”, contou no seu livro de memórias, The Chiffon Trenches, publicado em 2020. “Adorava a minha casa e a minha família. Ia à escola e à igreja e fazia tudo o que me dizia e não falava muito. Mas sabia que a vida era mais do que isso, Queria conhecer a Diana Vreeland, Andy Warhol, Naomi Sims, Pat Cleveland, Edie Sedgwick e Loulou de la Falaise. E fiz isso. E nunca mais olhei para trás”, contou à Vogue em 2018, quando estreou o documentário sobre a sua vida, “The Gospel According to André”.
[Trailer do documentário “The Gospel According to André”:]
O primeiro homem negro a assumir uma posição de destaque na indústria, foi também o primeiro a ocupar o cargo de editor na Vogue, trabalhando durante anos em parceria direta com Anna Wintour, outra lenda da indústria. Talley deixou definitivamente a revista, onde trabalhou de forma descontinuada desde 1983, em 2013, para se dedicar a outros projetos. Desde 2014 que era diretor artístico da Zappos Couture. Fazia também parte do conselho de administração do Savannah College of Art e Design, na Georgia, desde 2000. Em 2020, foi nomeado Cavaleiro das Artes e das Letras pelo governo francês e, no ano seguinte, foi galardoado com o prémio literário da Carolina do Norte.
Um “visionário”, “um gigante da moda” e uma inspiração para uma geração de jovens negros
Foram muitos os amigos, conhecidos e admiradores de Talley que recorreram às redes sociais para lamentarem a morte do “faraó fabuloso”, como foi apelidado por um colaborador da Vogue. A estilista belga Diane von Furstenberg, amiga pessoal, escreveu: “Morreu um gigante da moda. Descansa em paz, querido André Leon Talley”, pode ler-se numa publicação feita no Instagram, com várias fotografias dos dois amigos.
A make-up artist Charlotte Tilbury mostrou-se triste por saber da morte do “criativo visionário”. “O André era uma inspiração, um génio, uma alegria e uma pessoa magnética para conhecer e trabalhar. Ele abriu o caminho para infinito talento criativo e para uma geração de inovadores no mundo da moda. Vai fazer muita falta”, escreveu no Twitter.
Karen Attiah, colunista no The Washington Post, admitiu no Twitter que a história de Talley a inspira e a assombra, “ainda mais depois de ter passado tempo com ele há alguns anos”, quando, em 2018, o entrevistou na sua casa, em Nova Iorque. Uma conversa que abordou a passagem do estilista pela Vogue e a questão da diversidade. “A bênção de ser maior do que a vida e a maldição de ser desumanizado pelas instituições brancas que se recusaram a abraçá-lo plenamente.”
O dramaturgo Jeremy O. Harris lembrou o percurso de Talley, “um pequeno rapaz negro que chegou às estrelas a partir do sul”. “Éramos do mesmo lugar, na Carolina do Norte, antes de inventares uma personagem que integrou o que vias nas revistas de moda com o mundo das mulheres que nos rodeavam nas igrejas suadas do sul e nos vibrantes Dixie Boulevards. Obrigada por mostrares isso ao mundo”, escreveu Harris, admitindo que o estilista era uma inspiração.
“Havia poucas pessoas entre as estrelas que podia admirar que se pareciam comigo, mas que eram mais fabulosos, à exceção de ti, André. Para uma geração de rapazes, André Leon Talley era um farol de graça e inspiração.”
We were from the same place, North Carolina, before fabulating a self that integrated what you saw in fashion magazines with the world of the women who surrounded us in sweaty Southern churches and upon vibrant Dixie Boulevards. Thank you for showing the world that. pic.twitter.com/BOOUkHvBEF
— Jeremy O. Harris (@jeremyoharris) January 19, 2022
Anna Wintour: um amigo “magnífico, erudito e maldosamente divertido”, cuja perda é “imensurável”
Anna Wintour reagiu à morte do jornalista e estilista em declarações à Vogue, descrevendo Talley como “uma figura que quebrou barreiras sem nunca esquecer onde começou” e como um amigo “magnífico, erudito e maldosamente divertido”, cuja perda é “imensurável”.
“A perda do André é sentida por tantos de nós: os designers que ele apoiou entusiasticamente em cada estação e que o adoravam por isso; as gerações que ele inspirou a trabalharem na indústria, que vieram nele uma figura que quebrou barreiras sem nunca esquecer onde começou; aqueles que conheciam a moda e a Vogue simplesmente por causa dele; e, sem esquecer, a multitude de colegas que foram consistentemente balizados por cada nova descoberta do André ao longo dos anos, que ele discutia em voz alta e de forma audível — ninguém conseguia deixar as pessoas mais entusiasmadas por um detalhe insignificante de moda do que ele. Até a corrente colorida de faxes e emails que ele enviava era um evento altamente antecipado, alguma coisa pela qual ansiávamos”, disse Wintour.
Lembrando que o jornalista era mais do que um colega, era também um amigo, a diretora editorial global da Vogue descreveu a perda de André Leon Talley como “imensurável”. “Ele era magnífico, erudito e maldosamente divertido — mercurial, também. Como todos os relacionamentos de longa data, houve momentos que foram complicados, mas tudo o que quero lembrar hoje, tudo o que me importa, é o homem brilhante e compassivo que era um amigo generoso e carinhoso, para mim e para a minha família durante muitos, muitos anos. Vamos ter muitas saudades dele.”