Obras de artistas como Cruzeiro Seixas, Marcelino Vespeira e Malangatana poderão ser vistas lado a lado com outras de Salvador Dalí, Marcel Duchamp e Pablo Picasso, a partir de quinta-feira, numa exposição sobre o surrealismo no museu Tate Modern, em Londres.
A exposição de mais de 150 trabalhos pretende mostrar a dimensão internacional do movimento surrealista para além de uma época ou lugar, abrangendo 80 anos e 50 países como Portugal, Argentina, Egito, México, República Checa, Coreia do Sul ou Japão.
Pondo em destaque o inconsciente e os sonhos em vez de imagens do que é conhecido ou do quotidiano, as obras surrealistas são vistas como poéticas e até humorísticas, como o Telefone Lagosta, de Salvador Dalí, ou o comboio de René Magritte a sair de uma lareira.
Desde que que surgiu em Paris por volta de 1924, a expressão foi também usada por artistas como uma arma na luta pela liberdade política, social e pessoal em épocas marcadas por regimes políticos opressivos e colonizadores.
Ao lado de um trabalho de Marcel Duchamp está a escultura de Artur Cruzeiro Seixas “O seu olhar já não se dirige para a terra, mas tem os pés assentes nela”.
Para Carine Harmand, curadora assistente de arte internacional do museu Tate Modern, a escultura de Cruzeiro Seixas “insere-se completamente na veia surrealista”, juntando de forma inesperada uma pata de búfalo, osso de tartaruga, com o poema de Antonin Artaud escrito em redor.
Os portugueses António Pedro, Fernando de Azevedo, José-Augusto França, Marcelino Vespeira estão representados num desenho coletivo realizado como “cadáver esquisito”, técnica em que cada um dos autores dava seguimento à contribuição do anterior.
Harmand recordou como o Grupo Surrealista de Lisboa, formado em 1947 por figuras como França, Mário Cesariny e Alexandre O’Neill, aderiu “às ideias surrealistas de explorar o inconsciente, libertar a criatividade, libertar a mente, mas também a ideia de que o surrealismo era sobre libertação política e social”.
“Para eles, o surrealismo era uma postura antifascista, era uma forma de desafiar o conservadorismo do regime de Salazar“, explicou.
O português Fernando Lemos, o moçambicano Malangatana Ngwenya e a brasileira Tarsila do Amaral são outros dos lusófonos presentes na exposição, que tem o mérito de mostrar obras raramente vistas, como fotografias de Cecilia Porras e Enrique Grau, que desafiavam as convenções sociais da Colômbia dos anos 1950, ou pinturas do artista espanhol exilado Eugenio Granell, alvo de censura e perseguição.
Pela primeira vez no Reino Unido está um desenho em modo de cadáver esquisito, “Long Distance”, iniciado pelo norte-americano Ted Joans e criado em conjunto com 132 colaboradores de todo o mundo, incluindo Mário Cesariny, Malangatana, Allen Ginsberg, William S. Burroughs e Octavio Paz.
Exposta em 2019, em Lisboa, a obra de 11 metros de comprimento levou quase 30 anos a completar, entre 1976 e 2005, unindo artistas de variados países.
Mostrada no ano passado no Metropolitan Museum of Art de Nova Iorque, a exposição, que inclui pintura, fotografia, escultura e vídeo, abre na quinta-feira ao público, no museu Tate Modern, onde permanece até 29 de agosto.