Está dado o pontapé de saída para o (previsivelmente longo) processo de adesão da Ucrânia à União Europeia. Após uma longa reunião em Versalhes, França, o Conselho Europeu comunicou que já pediu à Comissão Europeia que se pronuncie sobre o pedido oficialmente apresentado por Volodymyr Zelensky, já durante a guerra entre a Rússia e a Ucrânia, para que o país venha a ser um Estado-membro da UE.

A decisão de enviar o pedido de Zelensky para a Comissão Europeia foi tomada ao fim de várias horas de debate acalorado sobre o assunto entre os chefes de Estado e de Governo, que dentro do bloco europeu não estão exatamente de acordo quanto aos moldes da adesão da Ucrânia. Se é verdade que há uma unanimidade na vontade de ajudar Kiev, é igualmente verdade que há países que consideram que a situação específica da Ucrânia justifica um processo de adesão acelerada (como pediu Zelensky) — enquanto outros defendem que a Ucrânia tem de cumprir o processo integral de adesão à UE, que implica o cumprimento prévio de um conjunto de requisitos.

Zelensky assina pedido formal de adesão à União Europeia e pede rapidez. E agora?

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Na sequência da reunião de Versalhes, o Conselho Europeu publicou esta madrugada uma dura nota de condenação da guerra iniciada pela Rússia contra a Ucrânia, na qual apelou à responsabilização do regime de Moscovo pelos “crimes” cometidos em solo ucraniano, garantiu o acolhimento dos refugiados oriundos da Ucrânia e assegurou que os ucranianos pertencem à “família europeia”, motivo pelo qual não serão deixados sozinhos.

Quanto ao desejo da Ucrânia de aderir à União Europeia, formalizado pelo Presidente Volodymyr Zelensky já durante a guerra, o Conselho Europeu reconhece que o país está a exercer o direito de “escolher o seu próprio destino” e pede à Comissão Europeia que se pronuncie sobre o pedido ucraniano. Entretanto, “e sem demoras, vamos reforçar os nossos laços e aprofundar a nossa parceria para apoiar a Ucrânia a percorrer o seu caminho Europeu”, garante o Conselho Europeu. “A Ucrânia pertence à nossa família europeia.”

O pedido à Comissão Europeia representa o primeiro passo num caminho longo — e a formulação do comunicado indica que a UE não tem intenção de o encurtar. A previsão de reforçar laços e parcerias políticas antes da adesão mostra que os países europeus pretendem que a Ucrânia chegue ao momento da adesão à UE bem preparada para que isso aconteça.

Dentro do Conselho Europeu, contudo, esta visão não é unânime, o que explica em parte a duração e intensidade dos debates em Versalhes.

De um lado, os países tradicionais da Europa Ocidental, liderados pelos Países Baixos, opõem-se a um processo acelerado.

“Creio que todos reconhecemos a situação de enorme dificuldade em que a Ucrânia se encontra. Toda a gente está verdadeiramente chocada”, disse o primeiro-ministro holandês, Mark Rutte, à saída do encontro na madrugada de sexta-feira, citado pelo Politico. Contudo, Rutte salientou que a UE já está a lidar com o processo de candidatura ucraniano com uma velocidade sem precedentes — e que acelerar ainda mais o processo levaria a que fossem saltadas etapas relevantes. A avaliação da Comissão Europeia “vai demorar — meses, talvez anos — antes de se chegar a algum lado”. Só depois dessa avaliação é que a Ucrânia poderá receber o estatuto de país candidato e começar as negociações formais com vista à adesão.

Só o processo de transposição da lei comunitária para a lei nacional pode chegar a um trabalho na ordem das 88 mil páginas, lembra o Politico. Para os holandeses, a adesão à UE é um processo moroso, com etapas complexas, que demorará anos e ajudará a Ucrânia no longo prazo. Por isso, defende Rutte, a prioridade deve ser a ajuda imediata que a UE pode dar à Ucrânia — e não a adesão acelerada à UE.

“Este é um processo que demora anos”, dissera Rutte antes da reunião de Versalhes. “Temos de nos focar no que podemos a curto prazo.”

“Todos os países da parte ocidental da Europa com que falo dizem que não devemos tentar ter um comboio de alta velocidade, um procedimento mais rápido ou um processo de adesão acelerado. Mas a questão de ser a favor ou contra a adesão da Ucrânia não é uma questão para já”, disse ainda o governante holandês.

Por outro lado, países do leste do bloco europeu, incluindo a Estónia e a Polónia, têm liderado os esforços de argumentação em defesa de um processo especial para a adesão rápida da Ucrânia à UE.

Líderes europeus condenam Rússia

“Há duas semanas, a Rússia trouxe a guerra de novo à Europa”, começa por afirmar o comunicado conjunto dos chefes de Estado e Governo dos 27 membros da UE, após uma reunião em Versalhes, França, dedicada à concertação de posições sobre a guerra na Ucrânia. “A agressão militar não provocada e injustificada da Rússia contra a Ucrânia é uma violação grosseira do direito internacional e dos princípios da Carta da ONU, e mina a segurança e a estabilidade da Europa e do mundo.”

A invasão, continua a nota, “está a infligir um sofrimento inenarrável sobre a população ucraniana”.

“A Rússia, e a sua cúmplice Bielorrússia, têm responsabilidade total sobre esta guerra de agressão e vão ser responsabilizadas pelos seus crimes, incluindo por visarem indiscriminadamente civis e o objetos civis. Neste aspecto, saudamos a decisão do procurador do Tribunal Penal Internacional de abrir uma investigação”, dizem os líderes europeus, referindo-se à possibilidade de os líderes políticos e militares russos virem a ser condenados por crimes de guerra.

Os líderes europeus pedem ainda que seja garantida a segurança das centrais nucleares ucranianas, que têm sido um alvo primordial das forças russas, e apelam a que a Rússia permita a assistência da Agência Internacional de Energia Atómica.

“Exigimos que a Rússia cesse a sua ação militar e retire todas as forças e equipamento militar de todo o território da Ucrânia imediata e incondicionalmente, e que respeite completamente a integridade territorial, a soberania e a independência da Ucrânia dentro das suas fronteiras internacionalmente reconhecidas”, apelam os líderes europeus.

Na nota, os chefes de Estado e de Governo da UE deixam uma saudação ao “povo da Ucrânia pela sua coragem na defesa do seu país” e pelos “valores partilhados da liberdade e democracia”. E garantem: “Não os vamos deixar sozinhos.”

A UE promete continuar a enviar “apoio político, financeiro, material e humanitário” para a Ucrânia — e compromete-se a ajudar na “reconstrução de uma Ucrânia democrática quando o massacre russo terminar”.

Quanto à pressão económica sobre Rússia e Bielorrússia, os países da UE estão “determinados” a aumentá-la: “Adotámos sanções significativas e estamos preparados para agora rapidamente com mais sanções.”

“A Ucrânia pertence à nossa família europeia”

O comunicado dos líderes europeus centra-se também na crise humanitária e de refugiados que está a ser originada pela guerra lançada pela Rússia contra a Ucrânia.

“Inúmeras pessoas estão a fugir da guerra na Ucrânia. Oferecemos proteção temporária a todos os refugiados de guerra da Ucrânia. Saudamos os países europeus, especialmente nas fronteiras com a Ucrânia, por mostrarem uma solidariedade imensa ao acolherem os refugiados de guerra ucranianos”, diz a nota publicada esta madrugada.

“A UE e os seus Estados-membros vão continuar a mostrar solidariedade e a fornecer apoio humanitário, médico e financeiro a todos os refugiados e aos países que os acolhem”, dizem os líderes europeus, apelando à disponibilização de fundos “sem demoras” através do recurso aos mecanismos mais flexíveis de mobilização de fundos europeus.

Além disso, o Conselho Europeu exige à Rússia que cumpra “as suas obrigações à luz do direito internacional”, assegurando os corredores humanitários que permitem a chegada da ajuda às vítimas e a saída em segurança dos civis que querem abandonar o território em conflito.

“Noite histórica”

O Presidente da República da Lituânia, Gitanas Nausėda, classificou a reunião do Conselho Europeu que terminou esta madrugada como uma “noite histórica” em que o processo de adesão da Ucrânia à União Europeia começou a avançar formalmente.

“Noite histórica em Versalhes”, escreveu no Twitter. “Após cinco horas de discussões acaloradas, os líderes da UE disseram ‘sim’ à eurointegração da Ucrânia. O processo começou. Agora, cabe-nos a nós e aos ucranianos alcançá-la rapidamente. A heróica nação ucraniana merece saber que é bem-vinda na UE.”