A primeira-ministra da Estónia, Kaja Kallas, publicou esta quinta-feira um artigo de opinião no jornal norte-americano The New York Times apelando aos países membros da NATO que reforcem o seu compromisso financeiro com a política de defesa, única forma de derrotar a Rússia de Putin na atual guerra na Ucrânia, mas também de impedir que Moscovo ameace ainda mais o território europeu.
“Na NATO, o nosso foco deve ser simples: Putin não pode ganhar esta guerra. Não pode sequer pensar que ganhou, senão o seu apetite vai aumentar. Temos de demonstrar a vontade e empenhar recursos para defender o território da NATO“, escreveu Kallas, que desde 2021 lidera o governo da Estónia, antiga república soviética que hoje pertence à União Europeia e à NATO.
No dia em que os líderes da NATO se reúnem em Bruxelas para uma cimeira com o objetivo de discutir a situação na Ucrânia, Kaja Kallas lança quatro apelos diretos aos chefes de Estado e de Governo dos países da aliança: ajudar a Ucrânia de todos os modos possíveis; mostrar ao agressor que a NATO está pronta para se defender e, se necessário, para lutar; paralisar a máquina de guerra do Kremlin; e ajudar os ucranianos que fogem da guerra.
A governante estónia compara a atual agressão russa aos tempos soviéticos, que a sua família conheceu bem. “Para qualquer pessoa que viveu sob ocupação soviética, os relatos da Ucrânia repetem cenas que pensámos nunca mais ver. O bombardeamento de civis e a destruição arbitrária de edifícios relembram a carnificina desencadeada no continente europeu por Hitler e Estaline. Em Mariupol, uma cidade portuária sujeita a um cerco brutal e horroroso, os residentes estão alegadamente a ser deportados para lugares longínquos da Rússia, onde um futuro incerto os aguarda”, escreve Kallas.
“A minha família sabe o que isso é. A minha mãe era apenas uma bebé de seis meses quando, em 1949, os soviéticos a deportaram, juntamente com a mãe dela e a avó, para a Sibéria“, lembra a primeira-ministra da Estónia, referindo-se às deportações em massa organizadas pela União Soviética para se livrar daqueles que eram classificados como “inimigos do povo“, por não apoiarem a visão do regime. “Hoje, o Kremlin está a reavivar técnicas de pura barbaridade. Aqueles que escaparam de Mariupol descrevem-na como o inferno na terra.”
“Para colocar um fim a estes horrores, os observadores mais otimistas têm posto a sua esperança num acordo de paz. Mas a paz não vai acontecer amanhã. Temos de enfrentar o facto de que a ideia do Kremlin sobre a segurança europeia e global está em total desacordo com a ideia do mundo livre. E Vladimir Putin está disposto a matar e a reprimir em massa em nome disso”, escreve a governante.
Para combater Moscovo, Kaja Kallas defende que é necessário ajudar a Ucrânia de todos os modos, incluindo através de um reforço dos seus meios militares. “A ajuda militar defensiva tem de ser a nossa principal prioridade, e temos de nos comprometer a longo prazo”, pede a líder estónia.
Mas o grande apelo de Kallas vai no sentido do reforço militar da própria NATO. “Às vezes, a melhor maneira de alcançar a paz é estando disposto a usar a força militar”, escreve a governante estónia. “Para o fazer, temos de reforçar a nossa defesa coletiva, especialmente no flanco leste que faz fronteira com a Rússia. É por isso que, na Estónia, estamos a aumentar o nosso investimento em defesa. Este ano, vamos gastar 2,3% do PIB; nos próximos anos, vai subir para 2,5%. Todos os países da NATO, independentemente da sua localização, deveriam fazer o mesmo: 2% do PIB tem de se tornar num requisito mínimo absoluto.”
Os países da NATO têm o compromisso de gastar, pelo menos, 2% do seu PIB em defesa, para garantir as capacidades militares da aliança. Porém, nem todos os países cumprem o requisito. Os Estados Unidos são o país que mais gasta em defesa (perto de 4%), mas muitos países não chegam sequer ao mínimo — é o caso de Portugal, que está abaixo dos 1,6%.
Kaja Kallas defende ainda um reforço da presença militar nas regiões que fazem fronteira com a Rússia. “Temos de ir mais longe. A presença avançada tem de se tornar numa defesa avançada em terra, ar e mar. Isto significaria mais tropas prontas para o combate permanentemente posicionadas nos estados Bálticos, apoiados por artilharia de longo alcance, defesa aérea e outras capacidades. Significaria mais combatentes da NATO nos nossos céus, prontos a passar de um policiamento aéreo em tempo de paz para uma defesa aérea em tempo de guerra.”
A primeira-ministra da Estónia considera, ainda, que a NATO deve “paralisar a máquina de guerra do Kremlin”.
“Temos de fazê-lo não apenas para acabar com o derramamento de sangue e a ocupação da Ucrânia, mas também para desarmar a Rússia economicamente, para impedir Putin de expandir ainda mais a guerra”, escreve Kallas. “No coração da máquina está o petróleo e o gás. As exportações do último ano representaram cerca de 40% do orçamento estatal russo, e este ano provavelmente vão tornar-se na maior fonte. O nosso foco deve ser secar estas fontes de receita.“