O antigo Presidente da República Ramalho Eanes admitiu esta sexta-feira que, na altura do 25 de abril de 1974, “esperava mais”, afirmando que não foi feito o suficiente para se “politizar a sociedade” e instituir uma “democracia dinâmica”.
“Há uma coisa indiscutível: o 25 de abril trouxe a liberdade, trouxe a democracia. Não escondo que, na altura, esperávamos mais, esperávamos uma democracia dinâmica, em que o povo resolvesse participar, em que o povo sentisse que ele é efetivamente o dono da liberdade e o dono do país”, afirmou Ramalho Eanes.
O Presidente da República entre 1976 e 1986 falava aos jornalistas à entrada para a sessão evocativa dos 30 anos da morte de Salgueiro Maia, que decorre esta sexta-feira no Largo do Carmo, em Lisboa, e a que assistem capitães de Abril como Vasco Lourenço ou Carlos Matos Gomes, mas também o ministro da Cultura, Pedro Adão e Silva.
No entender de Ramalho Eanes, “os governos são apenas um instrumento, um instrumento historicamente determinado, não mais que isso“, devendo o povo “colaborar com esse instrumento, exigir esse instrumento e, quando fosse necessário, contestá-lo”. “Isso, infelizmente, não aconteceu”, afirmou.
Ramalho Eanes, o primeiro Presidente da República a ser eleito democraticamente, afirmou fazer essa constatação “com um grande à vontade”, por também ter “culpa nesta situação“.
“Não fizemos aquilo que é indispensável num povo que está amorfo, que nunca teve democracia, que vem de um regime autoritário salazarista. Nós devíamos ter, de alguma maneira, politizado a sociedade, devíamos ter feito com que realmente esse comportamento fosse sentido, fosse interiorizado e fosse praticado, porque só ele é que permite que a democracia se aprofunde permanente“, indicou.
Eanes frisou que a “democracia não é uma conquista, a democracia é um desafio e, ou se luta para vencer esse desafio, ou a democracia começa a desiludir, começa a fragilizar-se, o que naturalmente é complicado e perigoso”.
Abordando a figura de Salgueiro Maia, Eanes considerou que o oficial de Cavalaria “representa, simbolicamente, todos os capitães: participou, arriscou-se, não pediu nada, não recebeu nada”.
“Acho que há aqui o ideal de pureza que é aquele que corresponde àquilo que era o grande propósito inicial de Abril (…), que era devolver ao povo aquilo que lhe pertencia geneticamente, que era a liberdade e o povo utilizar a liberdade como quisesse“, frisou.
Eanes sublinhou que Salgueiro Maia é um “símbolo, sempre vivo, dos ideais genéticos da Revolução”.
Neste domingo, assinalam-se os 30 anos da morte do capitão Salgueiro Maia, falecido a 3 de abril de 1992.