A aposta numa linha defensiva de três que colocou a equipa ainda mais a sentir-se um corpo estranho em Anfield como se não percebesse ao certo o que estava ali a fazer. A lesão madrugadora de Paul Pogba, mais um problema físico a pesar nas opções. A incapacidade de fazer um remate ao longo de 60 minutos e a total impotência de chegar sequer aos 30% de posse de bola durante todo o encontro. As expressões faciais de total resignação que se iam multiplicando entre os jogadores. Um par de entradas duras sem bola no final que mais não eram do que a exteriorização de um sentimento de revolta por tudo o que acontecia.

A partida do Manchester United ficou marcada pela arrepiante homenagem a Cristiano Ronaldo com uma ovação de pé e os cânticos do You’ll Never Walk Alone destinados ao português mas esse foi o único minuto que teve história no clássico. E essa falta de história em tudo o resto mais não foi do que um espelho do que é o Manchester United nos dias que correm: uma equipa sem ideias, sem um esquema definido, sem rasgo, sem capacidade, sem um sinal de retoma. Uns dias antes o 60.º hat-trick do capitão da Seleção tinha conseguido disfarçar essas fragilidades frente ao último classificado Norwich, diante do Liverpool e sem o número 7 não houve sequer vestígio de uma qualquer boia de salvação. E seguia-se o Arsenal.

Com mais um jogo já realizado, o Manchester United partia para esta jornada a três pontos dos londrinos e do Tottenham, não tendo por isso margem de erro sob pena de abdicar de vez do objetivo de chegar ainda ao quarto lugar da Premier League e garantir vaga na próxima edição da Liga dos Campeões. Nem mesmo a apresentação oficial de Erik ten Hag como treinador para a próxima temporada teve o condão de apagar o atual momento, com várias antigas glórias a deixarem críticas duras de alto a baixo, dos donos do clube a grande parte dos jogadores, passando pelo treinador e por toda a estrutura do futebol. Como em tudo no futebol, e sobretudo jogando no Emirates, só existia uma forma de dar a volta: ganhar.

“Penso que não vale a pena especular sobre as possibilidades que temos ou não de terminar o Campeonato no quarto lugar, acho que não faz sentido sentir falar nisso depois de uma exibição como aquela que nós tivemos com o Liverpool. A única coisa que temos de garantir é que conseguimos jogar bem melhor, essa é a única forma de lidar com isso. Precisamos ter a melhor equipa possível em campo e depois jogar de uma forma diferente, com mais convicção, mais confiança e mais agressividade. Se jogarmos contra o Liverpool, sobretudo na primeira parte, será muito complicado retirar alguma coisa do jogo com o Arsenal mas ainda temos tempo de mudar, caso tenhamos outro desempenho”, alertara Ralf Rangnick.

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Nem tudo foi cumprido, sobretudo a nível defensivo com mais uma exibição de autêntica desinspiração com demasiados erros que valeram mais uma derrota e a mais do que provável ausência na próxima edição da Liga dos Campeões. No entanto, aquilo que também ficou foi mais uma demonstração de força de Cristiano Ronaldo no regresso aos relvados e logo como titular até nos lances em que não marcou.

Com Varane de regresso às opções e à titularidade, Rangnick deixou Maguire no banco (capitão que teve uma ameaça de bomba esta semana em sua casa depois do jogo com o Liverpool) mas nem por isso a defesa do Manchester United melhorou muito e bastaram apenas três minutos para o Arsenal aproveitar todas essas fragilidades: Saka conseguiu ganhar um ressalto na área após cortes falhados de Varane e Alex Telles, rematou para defesa de David de Gea mas Nuno Tavares, ao segundo poste, fez sozinho o 1-0 na recarga. Os red devils ainda tentaram reagir, com um lance em que Elanga apareceu isolado depois de uma assistência de Ronaldo e um cabeceamento ao lado de McTominay, mas eram os londrinos que iam controlando as operações criando sempre perigo quando chegavam ao último terço contrário.

Diogo Dalot, com um remate à trave, teve aquela que era até então a melhor oportunidade dos visitantes mas seriam mesmo os gunners a aumentar a vantagem já depois de mais uma chance falhada por Nketiah, num lance com alguma polémica à mistura em que o golo de Nketiah foi anulado pelo VAR por fora de jogo mas o mesmo VAR descortinou uma falta de Alex Telles sobre Saka, permitindo que o internacional inglês fizesse de grande penalidade o 2-0 (32′). O Manchester United estava encostado às cordas.

Como acontece na maioria das ocasiões, foi aí que apareceu mais uma vez Ronaldo. E apareceu para mais um feito histórico, como não poderia deixar de ser: na sequência de um cruzamento de Matic da esquerda, o português conseguiu desviar entre os centrais e fez o 100.º golo na Premier League, 16.º na atual edição do Campeonato. Apenas três jogadores do Manchester United tinham chegado a essa barreira (Wayne Rooney, Ryan Giggs e Paul Scholes) mas o número 7, de regresso a Old Trafford esta temporada, tornou-se o primeiro a conseguir chegar a essa fasquia na Liga inglesa, na Liga espanhola, na Liga dos Campeões e na Seleção. Ronaldo marcou, benzeu-se, apontou para o céu e seguiu para o meio-campo.

O Manchester United estava apenas a um golo de reentrar por completo na decisão do jogo apesar de mais uma grande iniciativa de Nuno Tavares que só falhou na finalização mas o lateral estaria no melhor e no pior (ao contrário de Cédric, mais seguro a defender à direita): no seguimento de um canto e de um desvio de cabeça de Matic, o antigo jogador do Benfica cortou a bola com o braço, o árbitro deu penálti, Ronaldo deu a bola para Bruno Fernandes assumir a marcação mas o médio acertou no poste (57′). O empate não chegou aí, não chegou pouco depois num golo anulado a Ronaldo (60′), também não chegou a seguir com Ramsdale a desviar para o poste um remate de Dalot após assistência de Ronaldo (63′) e foi mesmo o Arsenal a aumentar a vantagem com um remate fantástico de fora da área de Xhaka após uma perda de bola de Bruno Fernandes na zona perto da área que deu a possibilidade para a “bomba” do suíço (70′).