O procurador alemão Hans Christian Wolters, que lidera a investigação ao desaparecimento de Madeleine McCann em 2007, diz que as autoridades alemãs têm a certeza de que Christian Brueckner — o homem alemão que nos últimos dias foi constituído arguido no caso com 15 anos — é o assassino da criança inglesa. “Temos a certeza de que ele matou Madeleine McCann“, disse Wolters numa entrevista à CMTV emitida esta terça-feira. “Nós temos a certeza de que ele é o assassino de Madeleine McCann.”

Wolters salientou que “a investigação ainda está em curso”, mas que as autoridades alemãs encontram novas provas sobre o caso que incriminam Brueckner. “Acho que encontrámos alguns factos novos, algumas provas novas, não provas forenses, mas provas“, disse, embora sem especificar detalhes sobre a investigação criminal e sobre as novas provas alegadamente encontradas (que poderão ser, diz a CMTV, fibras da roupa de Maddie encontradas na carrinha de Brueckner). Perante as perguntas da jornalista, o procurador optou por não confirmar nem negar quaisquer informações, embora tenha acrescentado que as autoridades ainda estão “à procura da pessoa” que telefonou a Brueckner depois do desaparecimento de Maddie — e que poderá ser uma figura-chave do caso.

Recentemente, Brueckner disse que tem um álibi para a noite de 3 de maio de 2007 que o iliba do desaparecimento da criança. Contudo, Wolters nega e diz que o suspeito “não tem um álibi” que lhe retire a responsabilidade sobre o crime. O procurador alemão atirou também contra as autoridades portuguesas e, sobretudo, contra o ex-inspetor Gonçalo Amaral, o primeiro líder da investigação, afastado em 2007, por não terem logo considerado as suspeitas contra Brueckner: “Penso que o facto de Christian Brueckner agora ser um suspeito em Portugal mostra a todos que não estávamos no caminho errado. Penso que os McCann não são suspeitos na investigação portuguesa. Gonçalo Amaral estava errado quando lhes atribuiu a autoria do crime.”

Gonçalo Amaral diz que Brueckner é “bode expiatório”

Também esta terça-feira, dia em que se assinalam 15 anos desde o desaparecimento da criança, o antigo inspetor da Polícia Judiciária Gonçalo Amaral, que em 2007 liderou a investigação ao desaparecimento de Madeleine McCann antes de ser afastado do inquérito, considera que o foco das autoridades portuguesas, inglesas e alemãs no suspeito alemão Christian Brueckner é “um produto da ficção policial para limpar a imagem dos pais da menina desaparecida e um bode expiatório a quem se imputam as responsabilidades de outras“.

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Numa entrevista ao jornal espanhol El País, Amaral diz ainda que a constituição de Christian Brueckner como arguido no mês passado “parece uma simples engenharia processual para evitar a prescrição do caso” — que acontece justamente esta semana, quando se passam exatamente 15 anos desde que Maddie foi dada como desaparecida num complexo turístico na Praia da Luz, no Algarve, onde passava férias com os pais e os irmãos.

“Vai ser sempre a nossa filha”. Pais assinalam 15 anos do desaparecimento de Maddie McCann

“O facto de se ter pedido a ação [de constituição de Brueckner como arguido] às autoridades alemãs sem ter interrogado formalmente Brueckner denota que não existe nada em concreto. As autoridades portuguesas não conseguiram encontrar indícios que o impliquem no crime da menina, porque o desaparecimento em si não constitui um delito“, afirmou ainda Amaral.

Gonçalo Amaral, antigo inspetor da PJ, liderou a investigação ao desaparecimento de Maddie até outubro de 2007, altura em que foi afastado do inquérito. O antigo investigador, que apontava os pais de Maddie, Gerry e Kate McCann, como suspeitos no caso, tem defendido que foi afastado do caso devido ao rumo que a investigação estava a levar — e nunca poupou nas críticas às autoridades britânicas, que se juntaram à investigação logo nos primeiros meses.

Maddie: Christian Brueckner constituído arguido

Depois de afastado da investigação, Gonçalo Amaral continuou a falar sobre o caso e a defender a tese de que os pais de Maddie poderiam estar por trás do desaparecimento. Em 2008, publicou o livro Maddie: A Verdade da Mentira (Guerra & Paz), que lhe valeu uma longa disputa em tribunal com os pais da criança. Em 2015, Amaral foi condenado a indemnizar o casal McCann, numa decisão judicial que envolveu também a retirada do livro das livrarias. No ano seguinte, o Tribunal da Relação revogou a sentença e, depois de um recurso dos pais, o Supremo Tribunal manteve a decisão de absolver Amaral de qualquer condenação. Descontentes com a decisão final da justiça portuguesa, os McCann recorreram para o Tribunal Europeu dos Direitos do Homem.

Após anos de estagnação, a investigação ao desaparecimento de Maddie conheceu novos desenvolvimentos em junho de 2020, quando um esforço conjunto das polícias de Inglaterra, Alemanha e Portugal anunciaram uma nova linha de investigação e um novo suspeito: Christian Brueckner, um alemão que já havia sido condenado por crimes sexuais, que vivera no Algarve e que tinha estado na Aldeia da Luz em maio de 2007, na altura do desaparecimento de Maddie. Brueckner foi constituído arguido no final de abril deste ano.

No entanto, para Gonçalo Amaral, tudo não passa de um engodo montado pela polícia para limpar a imagem do casal McCann. Na entrevista ao El País, o ex-inspetor diz sentir “tristeza e revolta, porque depois destes anos não se averiguou o que ocorreu nem se identificou nem julgou os responsáveis, e porque a principal preocupação dos investigadores policiais e da maioria dos jornalistas é limpar a imagem dos pais”.

Em outubro de 2021, o ex-inspetor publicou um novo livro, Maddie: Basta de Mentiras! (Contraponto), no qual procura desmontar a investigação alemã sobre Christian Brueckner. “A minha conclusão é que Brueckner é um bode expiatório. Ele está preso pela violação de uma cidadã norte-americana ocorrida em 2005 na Praia da Luz. O exame ginecológico realizado no hospital, conforme o protocolo para casos de violação, conclui que não aconteceu. A pergunta é como pôde ser julgado e condenado por esse delito se o exame da vítima conclui que não aconteceu”, diz Amaral. “O processo português foi traduzido para alemão, exceto o exame ginecológico, escrito à mão pela médica, porque o tradutor disse que era ilegível.

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“Havia um desejo tão grande por parte dos investigadores alemães de deter Christian Brueckner que o principal elemento do processo não foi tido em conta. Na Alemanha está preso um indivíduo por um delito inexistente, é um vale-tudo, uma tristeza“, afirmou ainda o ex-inspetor ao El País.

Gonçalo Amaral confirmou, todavia, que Brueckner constava de uma lista de suspeitos de pedofilia analisada pela polícia portuguesa em 2007 depois do desaparecimento. “Foi investigado como outras dezenas, não se descobriu nada“, disse o ex-polícia, acrescentando que o principal erro das autoridades portuguesas no caso “foi aceitar que a polícia britânica viesse a Portugal para investigar connosco”.