O movimento cívico Cidadãos da Praia da Granja, que tem contestado a obra que a Infraestruturas de Portugal (IP) está a realizar na Linha do Norte, em Vila Nova de Gaia, denunciou este sábado o abate de “árvores históricas”.

Numa carta aberta dirigida ao Instituto da Conservação da Natureza e das Florestas (ICNF), o grupo fala em “abate de árvores centenárias” e relaciona a operação, na sexta-feira, na Avenida Sacadura Cabral, na localidade da Granja, concelho de Vila Nova de Gaia, com as obras que a IP está a levar a cabo no troço ferroviário da Linha do Norte.

“Fomos surpreendidos com um abate de árvores históricas, um abate que não compreendemos e só pode estar relacionado com a obra da IP. É mais uma evidência de que não vão parar apesar da população se manifestar contra e da obra constituir um total desrespeito pela identidade da zona”, disse à agência Lusa o porta-voz do movimento, Vasco Sousa.

Já na carta dirigida ao ICNF e partilhada com a Lusa, o grupo fala em “sentimento de impotência perante a força de quem pode decidir” e pede ao instituto que trave a “desconsideração a uma das zonas balneares mais bonitas do país”.

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“Iremos passar de geração em geração as histórias que marcam a Granja. O dia em que fomos abatidos, árvores e pessoas, não será esquecido”, acrescentam.

Sobre a obra da IP, uma empreitada que já motivou queixas junto do Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto, bem como ao Ministério Público e ao Provedor da Justiça Europeu, com o argumento de mau uso de fundos comunitários, o movimento critica o “progresso em betão” que coincide com a “regressão em humanidade”.

Em causa está o projeto que a IP tem vindo a implementar ao longo do troço ferroviário da Linha do Norte entre Espinho (distrito de Aveiro) e Vila Nova de Gaia (distrito do Porto), o qual inclui a colocação de separações acústicas, reformulação de apeadeiros e construção de passagens pedonais superiores para substituir as atuais.

Movimentos cívicos de várias localidades de Vila Nova de Gaia, nomeadamente da Granja, Aguda e Miramar, têm vindo a contestar a empreitada através de queixas a instituições, petições públicas, pedidos de esclarecimento e protestos, como o organizado a 30 de abril e juntou no local cerca de uma centena de pessoas.

O Cidadãos da Praia da Granja critica, entre outros elementos da empreitada, a passagem pedestre aérea que está projetada para a estação local, a qual, segundo o movimento, terá “quase 12 metros de altura, três torres de vigia e muros infindáveis de betão armado entre os três e seis metros”.

“Torres, muros, betão armado, conceitos que irão permear a separação entre duas Granjas, a de cima e a de baixo, qual retorno infeliz a um passado prévio ao 25 de Abril em que a estratificação social nos separava”, lê-se no texto enviado ao ICNF.

A 14 de abril, em resposta à agência Lusa, a IP afirmou que a construção de uma passagem inferior pedonal para substituir a superior que é contestada pelos moradores constitui “maior risco à segurança dos utentes”.

“A criação de uma passagem inferior pedonal não asseguraria condições de visibilidade do exterior para o interior da passagem, o que constitui um maior risco a segurança dos utentes, e, em caso de falha de fornecimento de energia ao sistema de bombagem, ficaria impedido o acesso dos passageiros à plataforma central e a evacuação dos mesmos em casos de emergência e socorro”, referiu a IP.

Na resposta, a IP admitia que se comprometeu, após a reclamação apresentada no ano passado por um grupo de cidadãos, a analisar a viabilidade de uma solução de desnivelamento inferior à linha férrea, no entanto concluiu que essa não é possível.

“[A passagem superior oferece] melhores condições de salubridade e segurança”, resumiu a empresa.

A Lusa contactou a Câmara de Gaia, que recordou que este processo inclui uma ação judicial, algo que “o município respeita”, mas “impede a continuação do debate público”.

Também a este propósito, em declarações à Lusa na segunda-feira, o arquiteto e professor universitário Correia Fernandes considerou que a obra “é uma agressão” e está “tecnicamente mal justificada”.

A 22 de abril, também a associação ambientalista Campo Aberto acusou a IP de atitude “pouco democrática”, manifestando-se “solidária” com os moradores que classificam algumas das estruturas projetadas de “mamarracho”, “escarro arquitetónico” ou “muros de Berlim”.