Num instante, tudo muda. A Volta a Itália tem sido mais um exemplo disso mesmo, até quando a mudança não traz propriamente grande impacto na classificação. Foi assim, mais uma vez, que se escreveu a décima etapa entre Pescara e Jesi, uma tirada que muitos apontavam para uma chegada ao sprint com um pelotão compacto ou para um triunfo de uma fuga de elementos em pior posição na geral mas que se tornou em mais um teste para os principais candidatos na subida a poucos quilómetros da meta que acabou por fazer outro corte no grupo obrigando os principais candidatos a uma atenção extra até nas bonificações. Mas a história dessa chegada, que se tornou um momento único no ciclismo, ainda estava por escrever.

O dia que devia ser tranquilo andou a puxar pelos candidatos: Girmay ganha etapa e faz história, Almeida consegue novo top 10

Biniam Girmay tornou-se o primeiro africano negro a ganhar uma etapa numa grande volta, confirmando a ascensão a pique que tem conseguido no ciclismo mesmo depois de ter ficado sem equipa em 2021 devido ao impacto económico da pandemia. E não foi uma vitória qualquer, ou não estivesse ao seu lado na luta pela etapa um senhor chamado Mathieu van der Poel. Até o neerlandês, percebendo que o seu esforço ia ser inglório, travou o sprint quase que dando sinal ao corredor da Eritreia de que o triunfo, justo, era seu. Assim foi. E o elemento mais em foco da Intermarché recolheu finalmente os louros que tinha tentado noutras etapas deste Giro, quando foi batido na altura por van der Poel, Cavendish e Arnaud Démare.

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Girmay desiste do Giro devido a hemorragia no olho provocada por acidente com rolha

Girmay, de apenas 22 anos, vivia o seu dia de sonho mas que se viria a tornar um pesadelo. No pódio após a prova, para uma cerimónia protocolar também ela histórica, uma distração do corredor africano fez com que fosse atingido pela rolha da garrafa de champanhe no olho, tendo mesmo de ser assistido pelas equipas médicas no local antes de seguir para o hospital. Foi apenas um susto, ficou melhor mas esse gesto acabaria por ter repercussões bem maiores, com a equipa e depois o próprio a anunciarem a desistência do Giro de 2022 por não quererem arriscar face à hemorragia no olho provocada pela rolha da garrafa.

Todos, incluindo adversários, lamentaram a saída precoce ainda para mais após um dia histórico e o Giro perdia mais um elemento para estar em foco nas chegadas ao sprint até final da Volta à Itália. Mas até em pormenores irrelevantes como aquele que acabou por lesionar Girmay se percebeu que qualquer erro pode condicionar toda uma estratégia de qualquer corredor. Por isso, a 11.ª etapa, mais uma com mais de 200 quilómetros (203km) entre Santarcangelo di Romagna e Reggio Emilia, teve cuidados especiais por parte de todos, incluindo João Almeida, segundo classificado que foi destaque esta quarta-feira no jornal espanhol Marca, que caracterizava o português da UAE Emirates como o “favorito silencioso”.

“Vi que me colocam como um dos favoritos desde início mas não me vejo no top top porque para isso era preciso ter mais quilómetros de contrarrelógio. Tenho que falar com a organização para que ponham mais um bocado de contrarrelógio, assim tenho mais hipóteses…”, tinha ironizado ainda na Hungria. “Vai ser muito difícil ganhar porque há muitos rivais duros aqui, como o Landa ou o Carapaz, que partiu como o principal candidato. Um pódio seria uma vitória, vestir a rosa em Verona seria demasiado. O último dia vai ter um contrarrelógio muito curto, não acredito que se marquem muitas diferenças. Estou em boa forma mas a preparação está programada para estar bem na terceira semana, que é quando a montanha vai apertar mais”, destacou João Almeida, numa ideia que já antes tinha explicado. E numa etapa relativamente calma, a questão dos pormenores voltou a fazer a diferença com a Ineos em destaque.

Numa tirada a rolar sempre a direito e com um percurso plano, havendo apenas esse desafio das duas curvas antes da chegada com uma reta de 350 metros, Filippo Tagliani e Luca Rastelli foram os primeiros fugitivos do dia e chegaram a ter cinco minutos de avanço, sendo que todos estavam sobretudo atentos ao primeiro sprint intermédio para os pontos com Mark Cavendish a bater Nizzolo e Arnaud Démare. Depois, apareceu a Ineos: preparando já o ponto intermédio seguinte que teria bonificações de segundos, em San Giovanni in Persiceto, a equipa britânica aumentou o ritmo, partiu o pelotão e trabalhou com sucesso para Richard Carapaz ir buscar três segundos, seguido do companheiro Narváez e de Loic Vliegen.

Começava uma segunda etapa dentro da etapa, desta vez com Dries De Bondt a tentar ser feliz com uma fuga que chegou a ter mais de um minuto, que foi sendo reduzida com o belga a olhar várias vezes para trás mas de quando em vez a aumentar ligeiramente o seu avanço até ser neutralizado a menos de dois quilómetros da meta, com uma chegada ao sprint onde o mais forte foi Alberto Dainese (DSM), que aproveitou a luta entre Démare e Gaviria, com vantagem para o colombiano da UAE Emirates, para se lançar no lado contrário e reivindicar o triunfo na 11.ª etapa, onde Caleb Ewan voltou a não aparecer na melhor posição e acabou em quinto, seguido de Cavendish. Consonni acabou ainda em terceiro na etapa.

Com esta chegada e depois das bonificações intermédias, Juan Pedro López manteve a camisola rosa com 12 segundos avanço agora de Richard Carapaz e Almeida, com o português da UAE Emirates agora em terceiro com o mesmo tempo do chefe de fila da Ineos. Seguem-se Romain Bardet (14”), Jai Hindley (20”), Guillaume Martin (28”), Mikel Landa (29”), Pozzovivo (54”), Buchmann (1.09) e Pello Bilbao (1.23).