Foi em Paris e não em São Petersburgo, como estava decidido há dois anos. Não teve clubes-estado na final, como acontecera nos últimos dois anos (PSG e Manchester City). Pela forma como começou a temporada, poucos seriam capazes de apostar no Liverpool a chegar ao jogo decisivo da Champions. Pela maneira como montou o seu plantel perante alguns dos adversários diretos, ainda menos iriam dizer que o Real Madrid iria atingir o último encontro. Entre o deve e o haver, duas das três equipas com mais títulos europeus iam tentar alargar o vasto rol de conquistas históricas no epílogo de épocas diferentes mas conseguidas.

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De um lado, o Liverpool. O “milagre” na Premier League acabou por não acontecer na última jornada com mais uma reviravolta também com o seu quê de milagrosa do Manchester City na receção ao Aston Villa mas a conquista da Taça da Liga e da Taça de Inglaterra deram um outro colorido a uma temporada onde os ingleses conseguiram talvez ser globalmente melhores do que tinham feito no ano em que quebraram o jejum de títulos internacionais (2018) e de Campeonatos (2019). Agora, surgia o último passo para a glória. De um clube, de um plantel, de um treinador, de uma ideia de jogo a que a equipa foi sempre fiel até nas alturas em que os resultados não apareciam com lesões à mistura e um calendário sobrecarregado.

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“Quem é favorito? Não é fácil responder a essa pergunta mas vocês já viram as reviravoltas do Real Madrid, uma equipa que nunca perde uma final. Então, diria que eles são ligeiramente favoritos, pela sua maior experiência nestes jogos decisivos. Se estivermos ao nosso melhor nível, somos uma equipa muito difícil de bater. É preciso aprender-se a ganhar, ninguém te ensina. Eu aprendi da forma mais dura perdendo muitas finais na minha vida, mas, felizmente, as últimas temo-las ganhado. Mas, esta equipa aprendeu, tem feito um trabalho incrível desde há alguns anos”, destacara Jürgen Klopp antes do jogo.

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Do outro lado, o Real Madrid. O campeão espanhol, que se passeou na La Liga aproveitando também a falência de Barcelona e Atl. Madrid esta temporada, teve na Champions constantes desafios no Santiago Bernabéu depois de jogos mais ou menos conseguidos fora. Foi mau com o PSG, foi muito bom com o Chelsea, foi bom no Manchester City. Em casa, foi sempre excelente, até mesmo quando esteve atrás da eliminatória diante dos blues mas conseguiu ainda empurrar tudo para o prolongamento. Há sempre uma pitada mais ou menos acentuada de fortuna nestas situações limite, nomeadamente aqueles dois golos em 90 segundos frente aos citizens, mas quando chegava a altura das decisões, estavam presentes.

“Tivemos tempo para preparar bem esta final. Vamos dar o melhor mas não estou convencido de que seja suficiente para ganhar porque no futebol há coisas que não controlas. Merecemos chegar à final pela nossa qualidade mas não chega no futebol de hoje. Ao talento é preciso juntar o compromisso. A história do Real Madrid empurrou-nos nas dificuldades e, para ganhar esta final, teremos de o merecer. Esperemos que a equipa mostre as mesmas coisas que mostrou ao longo da temporada, na qual teve um compromisso coletivo excecional e as suas individualidades fizeram a diferença nos momentos importantes. Tenho boa memória de todas as minhas finais e é um pouco estranho pensar que aquela em que a minha equipa [o AC Milan] jogou melhor, frente ao Liverpool, em 2005, perdeu. Não vou dizer aos jogadores para jogarem mal, mas, numa final, tudo pode acontecer e há que estar preparado para isso”, salientara Carlo Ancelotti.

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No final, acabou por tocar ao mesmo do costume, aquele que tem o dobro da Liga dos Campeões do que o segundo mais titulado (AC Milan, sete). O Liverpool fez por merecer outra sorte, Salah dificilmente podia ter tentado mais o golo, mas este foi mais um jogo que mostrou que muitas vezes não é para quem quer mas sim para quem pode. Courtois fez o jogo de uma vida, o meio-campo subiu a pique no segundo tempo, Vinícius precisou apenas de uma oportunidade para marcar, Ancelotti voltou a saber ler da melhor forma as virtudes e fraquezas da sua equipa. Ser Real Madrid é ser um ganhador por natureza.

Mais cautelas seria complicado nos minutos iniciais, com ambas as equipas a estarem mais preocupadas na ocupação de espaços sem bola do que propriamente faziam quando entravam no outro meio-campo. Havia alguns movimentos comuns aos dois conjuntos, nomeadamente as variações rápidas do centro de jogo para encontrar jogadores como Luis Díaz ou Vinícius em situações de 1×1, mas apesar do domínio territorial do Liverpool a bola nem às duas áreas chegavam. No meio deste cenário, os ingleses conseguiram ler melhor o que se passava, viram Kroos demasiado encostado a Casemiro, tiraram referências aos centrais com Mané a andar mais longe da área e começaram a crescer. Primeiro em posse, depois em oportunidades.

Na primeira vez em que Alexander-Arnold conseguiu subir pelo lado direito e encontrar espaço para fazer o cruzamento, Salah apareceu ao primeiro poste a desviar para grande defesa de Courtois (16′). A jogada seguiu, a bola veio parar a Thiago Alcântara mas o remate do médio saiu muito à figura do guarda-redes belga (17′). E pouco depois ainda houve outra tentativa mas de meia distância de Salah, para uma nova defesa do gigante número 1 dos merengues (18′). Parecia que nada passava mesmo por ali e, quando a sua intervenção não chegava, havia sempre a ajuda do poste, como aconteceu após tiro de Sadio Mané que ganhou espaço saindo da zona dos centrais contrários (20′). No meio de tudo isto, o Real Madrid ainda não tinha sequer tocado a bola na área do Liverpool. E demoraria a conseguir fazê-lo, com Benzema “de fora”.

Antes, Salah ainda teve mais um remate para defesa de Courtois após cruzamento de Alexander-Arnold (34′), mostrando a diferença que era ter Valverde ou Vinícius Júnior a fechar sem bola, e Henderson teve um remate muito forte de fora da área mas ao lado (40′). Só mesmo na primeira vez em que Benzema tocou na bola com qualidade apareceu o Real Madrid, numa jogada que até acabou por dar golo do avançado francês após passe de Valverde mas em situação irregular de fora de jogo confirmada pelo VAR (43′). O Liverpool teve dez remates contra apenas um dos espanhóis, mandou mais na bola, fez o triplo dos ataques mas não desfazia o nulo graças a um superlativo Courtois. E com esse aviso sério: bastou uma distração para o Real Madrid mostrar que precisa de pouco ou nada para ficar na frente dos jogos…

O encontro recomeçou com características semelhantes mas com um Real Madrid com mais personalidade do que no primeiro tempo. Mais confiante com a bola, mais capaz no plano defensivo, mais expedito nas tentativas de saída até porque os médios faziam mais metros na condução. Ainda assim, o jogo continuava sem balizas. E quando apareceu uma oportunidade, naquele que foi o primeiro remate dos espanhóis não invalidado do encontro, houve mesmo golo: Modric conseguiu sair bem, Valverde ligou a passada larga pela direita para ter espaço para o cruzamento e Vinícius Júnior, ao segundo poste, só teve de encostar nas costas de Alexander-Arnold para o golo inaugural sem que Alisson tivesse uma defesa (62′).

Em vantagem, o Real Madrid estava ainda mais na sua zona de conforto mas nem por isso o Liverpool teve a tendência de desistir ou de cair no jogo que era mais favorável para os espanhóis. Aliás, e olhando para todos os dados do encontro, merecia pelo menos um empate. No entanto, é complicado quando se joga contra uma parede na baliza, daquelas que leva com qualquer bola de qualquer ângulo e a mesma vai sempre para a frente ou para o lado. Salah, o maior prejudicado, que o diga: tentou aos 64′ após jogada coletiva, Courtois fez a defesa; tentou aos 69′ depois de uma iniciativa individual, Courtois fez a defesa; tentou aos 80′ num remate que ainda desviou em Diogo Jota, Courtois fez a defesa; tentou aos 82′ numa transição rápida em que ganhou em velocidade, Courtois fez a defesa. Por ali só passava uma coisa: a taça.