Quando na terça-feira, 31 de maio, o relógio apontou para a meia-noite, habitantes da cidade chinesa de Xangai encontraram-se finalmente, reunidos nas ruas a cantar, a brindar e a observar o fogo de artificio. Outros estavam à janela a ver a festa e a aplaudir. O dia amanheceria sem muitas das praças e zonas residenciais bloqueadas, com os meios de transporte novamente a circular e com pessoas a correr, a andar de bicicleta, a irem para os escritórios.
“Estivemos confinados durante demasiados dias. Precisamos de celebrar. Não apenas eu – todas as pessoas de Xangai”, disse um residente à BBC. “Estamos livres. Estou tão contente. Quero trabalhar. Quero trabalhar amanhã”, disse outro.
Na rede social Weibo foi criada a hashtag #ShanghaiIsBack (Xangai está de volta) que já foi utilizada 330 milhões de vezes. “É a primeira vez em dois meses que Xangai tem trânsito”, escreveu um utilizador da rede social, na legenda de um vídeo com carros na via pública.
Xangai vai aliviar medidas rigorosas de confinamento na quarta-feira
Dois meses depois de ter sido decretado mais um confinamento, que implicou o bloqueio da capital económica chinesa, o início de junho foi marcado pelo aliviar das restrições para combater os casos de Covid-19. Para muitos, implicou um severo confinamento que se estendeu ao longo de 76 dias.
“Este é o dia com o qual sonhamos há muito tempo”, disse aos jornalistas Tin Xin, porta-voz do governo de Xangai. “Toda a gente se sacrificou muito. Este dia dia custou a ganhar e temos de estimá-lo e protegê-lo, e dar as boas-vindas de volta a uma Xangai que nos é familiar e da qual sentíamos falta.”
As regras de Xangai
Mas o alívio das medidas não significa o regresso a uma situação de normalidade. É apenas parcial: mantendo a política chinesa de “zero covid”, só os residentes das zonas consideradas de baixo risco (sem casos registados) podem sair à rua — há, pelo menos, 640 mil habitantes da capital económica chinesa que continuam confinados em casa (190 mil em áreas confinadas e 450 mil nas áreas controladas, próximas de locais com infeções).
E mesmo os que podem circular seguem regras apertadas. Apenas testes PCR negativos, realizados nas 72 horas anteriores, permitem a entrada em bancos ou transportes públicos. Supermercados, centros comerciais e locais turísticos retomaram a sua atividade, mas apenas com 75% da sua lotação. Já os museus, bares, ginásios e cinemas permanecem fechados. Também os restaurantes estão impossibilitados de receber clientes, mantendo apenas o serviço de entrega ao domicilio. Quem quer viajar para fora da cidade, continua a enfrentar dificuldades no regresso, com obrigatoriedade de quarentena de sete a 14 dias. Pessoas infetadas e os contactos próximos são submetidos a quarentena — sendo, inclusivamente, a área da residência potencialmente bloqueada. O ensino presencial não foi retomado.
Apesar das limitações, há habitantes que estão surpreendidos com tudo o que, nesta fase, já lhes é permitido. “Acho que a maioria das pessoas não acreditava que ela [a cidade] se abriria na medida em que abriu”, disse um habitante ao Washington Post. “Há um clima de esperança.”
Inicialmente, o confinamento de Xangai, duraria, no máximo, quatro dias, segundo a informação avançada pelas autoridades naquela altura — em que se registavam 20 mil contágios diários, havendo esta quarta-feira, 1 de junho, apenas 15. Acabou por estender-se de abril a junho, com reclamações escritas nas redes sociais relativas à escassez de alimentos e recusa no tratamento de doentes não COVID-19.
Os habitantes mostram-se felizes, mas alguns dão pistas de ressentimento. “Estou feliz, mas me sinto-me estranho e agridoce, depois de tantas semanas trancado em casa”, diz ao jornal espanhol El Pais Ming Ge, 30 anos, funcionário de uma multinacional. “É como quando temos um parceiro com quem tudo está a correr bem ao longo de dois anos, mas que, de repente, muda radicalmente e, nos últimos meses, nos insulta e maltrata. Depois pede desculpa e que pede que esqueçamos o que aconteceu, garantindo que ele quer que tudo volte ao normal”.