Preços a aumentar, salários que não acompanham, leis laborais do tempo da troika que não mudam. Para o PCP, está assegurado o cocktail para que o desenvolvimento da “luta” e da contestação social, “independentemente” da vontade do partido, “inevitavelmente” se imponha nas ruas: neste contexto, “os trabalhadores não vão ficar encostados à parede”. Palavra de Jerónimo.

Foram estas algumas das principais conclusões da reunião do Comité Central do PCP, que se estendeu pelos últimos dois dias e que acabou com os comunistas a dispararem repetidamente contra o mesmo alvo: o Governo. Na sede do PCP, esta terça-feira, em Jerónimo de Sousa falou dos resultados da reunião e considerou mesmo os protestos na rua um “corolário lógico” da “falta de resposta do Governo” a problemas como o aumento da inflação e os baixos salários.

A par disso, farpas duras a António Costa, dias depois de o primeiro-ministro ter pedido às empresas um “esforço coletivo” para um aumento de 20% nos salários médios: “Isto não dá a cara com a careta. Como é que vai fazer? Propõe 20% e depois a Função Pública tem um aumento de 0,9%? Há aqui uma contradição insanável”.

Apontando para essa “erosão real” tanto dos salários como das pensões, o PCP indica um caminho: “Os valores de Abril, bem expressos na ação e luta dos trabalhadores e das populações”, os “direitos dos trabalhadores” previstos na Constituição — que acusa o Governo de não estar a cumprir, nomeadamente quando mantém a caducidade da contratação coletiva na lei laboral; e “a ação das organizações e dos movimentos de massas”.

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Neste ponto, apesar da forte ligação do PCP aos sindicatos e particularmente à CGTP — e numa altura em que vários socialistas duvidam de que o PCP esteja com força e capacidade para mobilizar seriamente os protestos nas ruas — Jerónimo insistiu uma e outra vez: a “luta” não se faz por vontade do PCP, mas por vontade dos trabalhadores; mesmo assim, e sendo que “ninguém é bruxo e adivinha o desenvolvimento dos processos de luta que inevitavelmente vão existir”, a conclusão é clara: “Podemos fazer proclamações, mas vai ser a realidade a impor-se. Estão criadas condições para o desenvolvimento da luta”.

Sanções são “escandaloso roubo” e têm de acabar

Ainda no ataque ao Governo, Jerónimo fez outra exigência, quando criticava o aumento dos preços dos combustíveis: “O Governo tem de acabar com o apoio às sanções e exigir que elas acabam. As sanções decididas pelos Estados Unidos e seguidas pelo Governo português são cada vez mais sanções contra as condições de vida do povo português”.

Por isso, questionado sobre se o PCP está a sair em defesa da Rússia, sancionada pela invasão da Ucrânia por Estados Unidos e União Europeia — sanções que Portugal apoia –, Jerónimo defendeu que o PCP não quer apenas o fim das sanções contra o regime de Vladimir Putin — é mesmo o fim de “todas as sanções”, um “escandaloso roubo”.

E quanto à Rússia, insistiu: “Não percebo como se pode defender os interesses da Rússia quando estamos a falar da defesa dos interesses dos trabalhadores e do povo português. Não estamos a pensar na Rússia”.

A nível partidário, num Comité Central que é o primeiro a realizar-se depois do que aconteceu imediatamente no rescaldo das eleições legislativas, há duas novidades a registar: a primeira é a entrada de Paula Santos na Comissão Política do órgão, por ser a nova líder parlamentar (uma decisão que Jerónimo considera “acertada”); a segunda é a marcação de uma conferência nacional do PCP, em que o objetivo é fazer um “debate profundo” sobre os problemas do país mas também “reforçar o partido”, para 12 e 13 de novembro.