Chegou esta quarta-feira ao fim, após dez meses de sesões, aquele que é considerado o “processo do século” em França. As atenções do mega julgamento realizado no Palácio de Justiça de Paris, propositadamente remodelado para a ocasião, estavam todas viradas para Salah Abdeslam, o único terrorista ainda vivo que participou nos ataques de dia 13 de novembro de 2015, nos quais morreram 130 pessoas e mais de 350 ficaram feridas.
O réu, que logo no primeiro dia de julgamento disse ser “tratado como um cão” atrás das grades, foi condenado a prisão perpétua sem possibilidade de redução de pena, tal como pedia o Ministério Público de França. É considerada a pena mais dura no sistema judicial francês, sendo que só foi aplicada quatro vezes desde a sua criação em 1994.
“Eu não matei ninguém e não feri ninguém”. Estas foram algumas das últimas palavras do belga de origem marroquina, que se referem ao facto de, à última da hora, ter desistido da ideia do ataque bombista suicida e abandonado o seu cinto de explosivos. “Eu reconheci que não sou perfeito, cometi erros é verdade, mas não sou um assassino. Se me condenarem por homicídio, estão a cometer uma injustiça“, assumiu nas alegações finais.
O tribunal não conseguiu precisar, com certeza, qual teria sido o alvo atribuído a Abdeslam a 13 de novembro — se um bar, como o próprio confessou, ou o metro. Só que a instituição aceitou o colete explosivo que ele trazia consigo como prova da sua intenção de levar a cabo o ato já planeado.
As sentenças dos restantes 19 acusados de organizar ou financiar os ataques terroristas (incluindo os seis julgados à revelia, sendo que cinco deles pensa-se mesmo que tenham sido mortos na fronteira sírio-iraquiana quando fugiram para a Síria) que ocorreram em vários locais de Paris e arredores – entre eles a sala de espetáculos Bataclan, onde atuavam os Eagles of Death Metal, o Estádio de França, onde se realizava uma partida de futebol entre as seleções francesa e alemã, e esplanadas da capital francesa — também foram conhecidas ao fim do dia desta quarta-feira. De acordo com o Le Figaro, estas foram as decisões do tribunal:
As 130 vítimas dos atentados Paris já estão todas identificadas. Estas são as suas histórias
- Mohamed Abrini: prisão perpétua, obrigado a cumprir no mínimo 22 anos de pena, e proibição de entrar em território francês.
- Sofien Ayari e Osama Krayem: 30 anos de prisão, dos quais é obrigado a cumprir dois terços.
- Mohammed Amri: oito anos de prisão, dos quais é obrigado a cumprir dois terços.
- Hamza Attou: quatro anos de prisão, dois dos quais suspensos. Não irá para a cadeia.
- Ali Oulkadi: cinco anos de prisão, três dos quais suspensos. Não irá para a cadeia.
- Mohamed Bakkali: 30 anos de prisão, dos quais é obrigado a cumprir dois terços.
- Farid Kharkhach: dois anos de prisão. De ressalvar que Farid já passou seis anos em prisão preventiva, o que pode significar que já cumpriu a pena.
O tribunal não encontrou evidências de que Farid estivesse ciente dos projetos terroristas quando forneceu falsos bilhetes de identidade à célula.
- Yassine Atar: oito anos de prisão, dos quais é obrigado a cumprir dois terços.
- Ali El Haddad Asufi: dez anos de prisão, dos quais é obrigado a cumprir dois terços.
- Abdellah Chouaa: quatro anos de prisão, três dos quais suspensos. Não irá para a cadeia.
- Muhammad Usman: 18 anos de prisão, dos quais é obrigado a cumprir dois terços.
- Ahmed Dahmani: trinta anos de prisão, dos quais é obrigado a cumprir dois terços.
Os réus que se julga estarem mortos:
Osama Atar: prisão perpétua sem possibilidade de redução de pena.
Fabien e Jean-Michel Clain: prisão perpétua sem possibilidade de redução de pena.
Ahmad Alkhald e Obeida Aref Dibo: prisão perpétua sem possibilidade de redução de pena.
O júri especial, constituído apenas por magistrados visto tratar-se de um caso de terrorismo, esteve isolado durante dois dias e meio numa caserna militar secreta (da localização, sabe-se somente que estava circunscrita à região de Paris). O objetivo era deliberar e redigir o veredicto sem qualquer influência exterior e lá comeram e dormiram. O documento final tinha mais de 120 páginas, porém o juiz-presidente Jean-Louis Périès leu apenas um resumo.
Agora, o Ministério Público assim como os condenados têm um prazo de dez dias para recorrer das sentenças.